Título: Fabricantes temem volta da reserva de mercado
Autor: Cristiano Romero e Juliano Basile
Fonte: Valor Econômico, 22/04/2005, Especial, p. A12

Se optar pela obrigatoriedade do software livre na administração pública, o governo vai comprar uma briga com as empresas que fabricam softwares proprietários e também com uma das entidades que representam, inclusive, os produtores de softwares de código aberto. A advertência é do presidente da Associação Brasileira das Empresas de Software (Abes), Jorge Sukarie. "Nossa posição é que não cabe ao governo determinar a obrigatoriedade do uso de softwares livres. Esse decreto, se confirmado, representará uma volta à reserva de mercado na informática", disse Sukarie. "Os órgãos públicos devem comprar aquilo que está mais em conta. Como cidadão, eu não gostaria de ver o governo comprando softwares mais caros por causa de uma reserva de mercado." Criada há 19 anos, a Abes tem cerca de 700 empresas associadas. Juntas, elas representam, segundo Sukarie, 85% do mercado brasileiro de software, com faturamento anual de US$ 3,2 bilhões (cerca de R$ 8,3 bilhões). Do total das empresas, 85% são nacionais. O restante são multinacionais que fabricam softwares no Brasil. Entre os associados da Abes estão grandes produtores de softwares proprietários, como a Microsoft, a Oracle e a Adobe, e de softwares livres, como a brasileira Conectiva e as americanas Sun Microsystems e IBM. "A Abes estimula o uso das duas plataformas. Elas convivem perfeitamente. Entendemos que o usuário é quem deve escolher", comentou Sukarie. O presidente da Abes disse não acreditar que a idéia da obrigatoriedade seja consensual dentro do governo. "Não é uma posição generalizada", assinalou. Na opinião dele, a discussão em torno da adoção do software livre no setor público tem sido "emotiva e pouco técnica". "Ruim é a obrigatoriedade, que baniria de um dos mercados consumidores os softwares comerciais. O mundo inteiro usa softwares proprietários", alegou Sukarie. O dirigente da Abes acredita que, se vingar a obrigatoriedade, deverá haver uma mobilização contra a decisão. Ele deixou claro, no entanto, que essa possibilidade ainda não foi discutida pelo conselho da entidade que preside. Sukarie lembrou que um programa bem-sucedido da informática nacional - que faz funcionar as urnas eletrônicas - foi desenvolvido pela filial da Microsoft no Brasil. "Não podemos aceitar a obrigatoriedade. Lutamos pela neutralidade", afirmou ele. Procurada pelo Valor, a Microsoft fez, de início, uma ressalva e informou que preferia não se manifestar sobre o assunto sem ter prévio conhecimento dos detalhes do decreto. A companhia aproveitou, no entanto, para protestar contra a possibilidade de o governo estabelecer a obrigatoriedade do uso de softwares livres nas repartições públicas. "A Microsoft gostaria de ressaltar que, como muitos outros líderes na indústria de tecnologia, defende a neutralidade de escolha e acredita que governos e usuários de tecnologia devem ser livres para usar qualquer software e outras tecnologias que melhor atendem às suas necessidades", declarou a multinacional, por meio de sua assessoria de imprensa. (CR e JB)