Título: Desafio é reduzir dívida pública atrelada à Selic
Autor: Arnaldo Galvão
Fonte: Valor Econômico, 22/04/2005, Finanças, p. C1

A trajetória da Dívida Pública Mobiliária Federal interna (DPMFi) continua favorável, embora não tanto quanto no ano passado. O desafio para o governo ainda é o de reduzir a parcela dos títulos atrelados à taxa Selic. Essa é a opinião predominante dos analistas ouvidos pelo Valor. Na quarta-feira, foi divulgada a nota conjunta do Banco Central e da Secretaria do Tesouro Nacional sobre o comportamento da DPMFi em março. A dívida aumentou R$ 63,4 bilhões no primeiro trimestre. Em dezembro, era de R$ 810,2 bilhões e chegou a R$ 873,6 bilhões em março. O salto foi de 7,8%. E a participação dos títulos remunerados pela taxa Selic aumentou de 56,6% (fevereiro) para 57% (março), considerando as operações de swap cambial. Para o economista e ex-presidente do Banco Central (1995-1997) Gustavo Loyola, o aumento dos juros tem impacto negativo, mas o governo vem melhorando a composição da dívida. Ele diz que o crescimento do estoque no primeiro trimestre não preocupa. "Temos de olhar para o médio prazo e a trajetória continua favorável, embora não tanto quanto em 2004", justifica. Loyola também diz que a parcela da dívida de curto prazo tem de ser diminuída, mas isso não pode ser feito rapidamente. Ele admite que, nesse aspecto, o governo vem cumprindo suas metas de alongamento. Na opinião do economista e professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) em São Paulo Alkimar Moura, o processo de alongamento da dívida está no sentido correto, mas é "inevitavelmente lento". Isso porque choques externos perturbam esse planejamento. O exemplo mais recente, a partir de maio de 2004, foi o aumento das taxas de juros nos Estados Unidos. "A decisão do Fed provocou, inicialmente, uma venda de papéis de países emergentes e essa aversão ao risco também teve impacto na dívida interna", explicou. O economista da consultoria Tendências Guilherme Loureiro vê a composição e o prazo da dívida interna em "movimento positivo". Ele destaca que o aumento do prazo médio das emissões sinaliza o alongamento pretendido no futuro. Afirma que melhor ainda seria reduzir a participação dos títulos atrelados à Selic. Mas reconhece que isso somente será possível com a redução da expectativa de inflação. De acordo com os dados de março, a participação dos títulos pré-fixados no total da DPMFi aumentou de 20,4% para 21,5%. Os papéis remunerados por índices de preços representaram 14% da dívida no mês. Em fevereiro, essa parcela era de 14,3%. O prazo médio do estoque da dívida recuou de 28,1 meses para 27,8 meses. E a estrutura de vencimentos mostra que diminuiu a parcela da dívida de curto prazo, de 90,7% para 84,4%. A parte que vence em 12 meses reduziu-se de 43,2% para 43%. As emissões de títulos superaram em R$ 14,5 bilhões os resgates em março. As emissões totais foram de R$ 37,88 bilhões. Para o coordenador-adjunto das Operações da Dívida Pública do Tesouro, Ronnie Tavares, a meta do Plano Anual de Financiamento (PAF) da dívida, quanto à participação de títulos pré-fixados, será cumprida "com folga". Ela prevê, para 2005, a faixa entre 20% e 30%. E a exposição cambial também "deixou de ser assunto relevante" para o Tesouro. A parcela corrigida pelo dólar, considerando apenas os títulos públicos e sem as operações de swap, reduziu-se de 6,02% (fevereiro) para 4,94% em março. Segundo o Tesouro e o BC, a dívida externa não é problema para o país. Mas eles reconheceram que o momento não é bom para captações. Dois fantasmas vêm rondando o mercado. O primeiro foi, no início de 2005, a ansiedade com a possibilidade de aumento dos juros nos EUA. O segundo, mais recente, é a tensão gerada com os resultados das grandes montadoras globais, especialmente a General Motors. Isso afetou o mercado de crédito americano. Para os títulos brasileiros, o impacto ocorre por meio da aversão ao risco e do aumento do spread nos EUA, o que muda a situação dos preços relativos. Por isso esse início do ano - época que costuma ser melhor para captações - não está bom. Prova disso foram as operações da Indonésia e do Uruguai. A Indonésia captou US$ 1 bilhão, mas a operação não pôde ser chamada de bem-sucedida. E o Uruguai teve de abortar uma captação de US$ 300 milhões, mesmo depois de aumentar o prêmio.