Título: Nova lei incentiva o microcrédito produtivo
Autor: Alex Ribeiro
Fonte: Valor Econômico, 25/04/2005, Finanças, p. C1
O Conselho Monetário Nacional (CMN) vai promover ajustes no programa do microcrédito produtivo para adequá-lo à nova lei sobre o assunto, aprovada pelo Congresso, que será sancionada hoje pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O limite dos empréstimos irá subir e será criado um balanço simplificado para as instituições de microfinanças. A lei é uma tentativa de fazer o programa do microcrédito financiar atividades que gerem renda. Lançado em 2003, o programa obriga os bancos a destinar 2% dos saldos em contas correntes para empréstimos de pequeno valor, com juros tabelados. O financiamento de atividades produtivas já estava previsto já na primeira versão do projeto, mas, salvo raras exceções, os bancos nunca se interessaram. Em fevereiro, a carteira de microcrédito dos bancos somava R$ 924 milhões, dos quais 85% se referiam a empréstimos pessoais, basicamente para consumo. Apenas R$ 134 milhões eram empregados em microcrédito produtivo - e quase metade desses recursos, R$ 63 milhões, são do Crediamigo, do Banco do Nordeste, considerado bem-sucedido antes do programa do microcrédito. Os estudos do governo chegaram à conclusão de que o desinteresse dos bancos se deve à falta de experiência na área, que leva a uma postura defensiva, para evitar a inadimplência. A prescrição foi incentivar os bancos a repassarem recursos não utilizados para as instituições que atuam no ramo, como sociedades de crédito ao microem- preendedor (SCMs), cooperativas e organizações da sociedade civil de interesse público (Oscips). Um convênio que será assinado hoje, em cerimônia no Palácio do Planalto, entre o Banco Popular do Brasil (BPB) e a Viva Cred, ligada à Oscip Viva Rio, será pioneira nesse novo modelo. O BPB, que tem expertise apenas em crédito pessoal, vai repassar R$ 300 mil (captados sob a forma de depósitos à vista) para o Viva Cred. O dinheiro financiará atividades produtivas nas favelas da Rocinha e Vidigal, no Rio. O convênio incorpora, pela primeira vez, inovações da legislação recente. Uma delas é a permissão para que as instituições de microfinanças atuem como correspondentes bancários. Assim, os recursos emprestados pela Viva Cred serão liberados diretamente em contas bancárias abertas no BPB. "Estamos trazendo um pouco da tecnologia bancária para o mundo das instituições de microfinanças, que sempre trabalharam com custos operacionais mais elevados", afirma o secretário-executivo do grupo de trabalho interministerial de microfi- nanças, Gilson Bittencourt. Outros ajustes estão sendo preparados para atrair também os bancos privados a programas parecidos. O primeiro passo foi em agosto de 2004, quando o CMN aprovou uma resolução que permite juros mais altos (4% ao mês) para o microcrédito orientado produtivo. Foi a forma encontrada para contornar as resistências das instituições de microfinanças, que, devido aos juros relativamente baixos que estavam autorizadas a cobrar, não se interessaram em procurar os bancos para captar recursos oriundos da parcela de 2% dos saldos em contas correntes. A operação do microcrédito produtivo é mais cara porque é feita por agentes que visitam os empreendedores e acompanham a evolução dos negócios. Outro ponto a ser discutido, que deverá ser submetido em maio ao CMN, é o teto para os empréstimos, fixado em R$ 1 mil, valor considerado insuficiente. Muitas instituições de microcrédito trabalham numa faixa de negócios entre R$ 1 mil e R$ 3 mil. A lei sancionada hoje dá ao CMN o poder para mudar esse valor, e a proposta é que suba a R$ 5 mil. O passo seguinte é convencer os bancos privados a repassarem dinheiro às instituições. O diagnóstico do governo apontou um problema clássico: os bancos sabem pouco sobre a solidez das Oscips, SCMs e cooperativas. A lei sancionada hoje resolve parte do problema, abrindo caminho para a criação de fundos de avais para garantir os empréstimos. Em maio, o Banco Central irá colher sugestões da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) para elaboração de uma espécie de balanço simplificado para as instituições de microfinanças. A idéia é criar padrões contábeis para que os bancos possam medir os riscos. O CMN também deve regulamentar algumas novidades criadas pela lei, como a possibilidade de compra das carteiras das instituições de microfinanças pelos bancos. Haverá ainda uma regra para que os bancos de fomento regionais possam operar como intermediário dos recursos dos depósitos à vista, captando dos bancos de um lado e, de outro, repassando às instituições. No mês que vem, o Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo do Trabalhador (Codefat) deve aprovar o uso de R$ 200 milhões do FAT para o microcrédito. Essa fonte está sendo viabilizada, a partir de hoje, com a sanção da lei, que dispensa a exigência de garantias reais nos empréstimos com recursos públicos.