Título: Semear para o futuro
Autor: Adriana Aguilar
Fonte: Valor Econômico, 27/04/2005, PREVIDÊNCIA PRIVADA, p. F1;2;3;4;5

O mercado de previdência privada está mobilizando uma força-tarefa para ensinar as pessoas físicas sobre os dois regimes tributários previstos nos planos de complemento à aposentadoria. As seguradoras ampliaram o número de atendentes na área, reforçaram o seu treinamento e criaram call centers para esclarecer as possíveis dúvidas que devem surgir. Também estão desenvolvendo simuladores de planos que comparam as aplicações nos dois regimes tributários. Além de tudo isso, no mês que vem, começam a enviar cartilhas aos clientes com explicações detalhadas sobre as alterações. A nova legislação fiscal na área de previdência, publicada em janeiro, determina que até 1º de julho todos os participantes dos planos escolham um dos dois regimes tributários - o de alíquota progressiva ou o de regressiva - para os planos. No mercado, sete milhões de planos deverão seguir um dos dois regimes para o recolhimento de Imposto de Renda (IR). Feita a escolha, não há mais como voltar atrás. A opção é definitiva. Na prática, as seguradoras terão apenas dois meses, maio e junho, para fazer esse trabalho de divulgação. "A responsabilidade das seguradoras na instrução dos dois regimes tributários às pessoas físicas é enorme e o tempo é curto. O cliente tem de ter informação, tem de pensar direito sobre os rendimentos futuros e, então, decidir o melhor sistema tributário para ele. Como a decisão é definitiva, não pode haver arrependimentos", afirma a superintendente executiva de previdência da Santander Seguradora, Marlene Rainer. A Lei 11.053 que instituiu a nova tributação para os planos de previdência entrou em vigor no início de janeiro. Mas as seguradoras só iniciaram a preparação das cartilhas e simuladores no fim de março, quando a Receita publicou a instrução normativa 524 que regulamenta a fórmula de cálculo para a incidência das alíquotas de IR no regime de tributação regressiva. O vice-presidente da Sul América Seguros, Renato Russo, afirma que até as vésperas do feriado da Páscoa cristã não era possível explicar aos clientes qual seria o melhor regime tributário. "Ficamos com três meses a menos para divulgar a nova legislação fiscal aos clientes", afirma. Agora, o mercado corre contra o tempo para passar o maior número possível de informações aos clientes. "Este será nosso maior desafio", diz o vice-presidente da área de vida e previdência do Unibanco AIG, Antonio Eduardo Trindade. Segundo o presidente da Associação Nacional da Previdência Privada (Anapp) e diretor da Itaú Vida e Previdência, Osvaldo do Nascimento, na terceira semana de abril, a Anapp enviou comunicados à Superintendência de Seguros Privados (Susep), à Secretaria de Previdência Complementar (SPC) e à Secretaria da Receita Federal, pedindo prorrogação do prazo até o fim de dezembro. Como a data de 1º de julho foi estabelecida por lei, apenas outra lei poderia alterá-la. Nascimento afirma que, para agilizar o pleito do mercado, foi inserida na Medida Provisória (MP) 2333, em tramitação no Congresso, uma emenda que pede a postergação da data para dezembro. A preocupação do mercado não se resume à responsabilidade de instrução dos regimes tributários aplicados aos planos. Marlene Rainer, do Santander, explica que as regras de cálculos divulgadas na instrução 524, no dia 23 de março, ainda estão sendo informatizadas nas seguradoras. Segundo a advogada tributarista especializada em previdência, Patrícia Bressan Linhares, do escritório Mattos Filho, desde a publicação da instrução, ela tem recebido consultas diárias das entidades de previdência. "Elas têm dúvidas sobre a maneira de operacionalizar as regras", afirma. A maior parte das pessoas físicas também não procurou as seguradoras para saber o que vai mudar. Na maior empresa do segmento de previdência complementar, a Bradesco Vida e Previdência, menos de 10% dos 1,6 milhão de participantes, entre empresas e pessoas físicas, procuraram informações sobre os regimes tributários para os planos, diz o diretor-presidente da empresa, Marco Antonio Rossi, o vice-presidente da Anapp. O atraso ocorrido na divulgação das regras e, como conseqüência, nas informações sobre as mudanças aos clientes, provocou uma retração na captação dos planos de previdência nos primeiros meses do ano. Os números da Anapp mostram que a captação em fevereiro foi de R$ 2,6 bilhões, volume 14,61% inferior ao registrado no mesmo período de 2004. É importante lembrar que no ano passado a captação consistente dos fundos de previdência superou o volume recebido por qualquer outra categoria de fundo disponível no mercado. Segundo dados da Anapp, os depósitos no sistema de previdência privada totalizaram R$ 18,8 bilhões em 2004, recorde histórico de captação desde que o indicador começou a ser produzido em 1994. O resultado consolida um crescimento de 26,31% nas receitas dos planos em relação a 2003, quando o sistema captou R$ 14,8 bilhões. A retração ocorrida na captação dos fundos de previdência no primeiro trimestre é vista com naturalidade por alguns profissionais da área, desde que levadas em conta todas as mudanças fiscais ocorridas nos planos de previdência. "A pessoa física preferiu aguardar as definições sobre a nova tributação", explica o diretor da ABN Amro Real Previdência, Edson Franco. Com as regras divulgadas, os representantes do mercado são unânimes em dizer que a captação será retomada nos próximos meses. No novo modelo de tributação regressiva ou regime de alíquotas decrescentes, as alíquotas variam de 35% a 10% sobre o resgate ou benefício, em função do período de acumulação. Por exemplo, se a pessoa optar pelo regime regressivo e resgatar o dinheiro acumulado em até dois anos, ela pagará 35% de alíquota de IR - uma espécie de multa. Por outro lado, quem acumular dinheiro por mais de 10 anos nos planos de previdência, terá direito à reduzida alíquota de 10% (ver tabela na página F2). É um prêmio dado pelo governo para incentivar a poupança de longo prazo. O vice-presidente da área de vida e previdência do Unibanco AIG explica que, se a pessoa quiser deixar o dinheiro aplicado por um período curto, é melhor procurar outro tipo de produto, como um fundo de investimento. "Se a intenção é poupar por um longo prazo, acima de quatro anos, a idéia do plano de previdência é interessante", afirma. Principalmente, quando levado em conta que os fundos de previdência não têm tributação semestral ou "come-cotas", como os fundos de investimentos. A primeira escolha que o segurado costuma fazer é o modelo de plano: VGBL (Vida Gerador de Benefício Livre) ou PGBL (Plano Gerador de Benefício Livre). O PGBL foi criado para quem declara o IR pelo formulário completo e quer contribuir com até 12% da renda bruta para deduzir o valor do IR a pagar. Para as pessoas que ficam dentro da faixa de isenção do recolhimento do IR ou que fazem a declaração pelo formulário simplificado, o modelo do VGBL é o mais indicado. Feita a escolha do modelo, é hora de pensar no regime de tributação: alíquotas progressivas ou regressivas. Tanto o VGBL como o PGBL permitem ambos os regimes. Essa opção exige maior atenção. A maioria dos segurados ainda não tem familiaridade com as faixas de tributação do regime de alíquotas progressivas e as deduções previstas. Por isso, as equipes de vendas da maior parte das instituições estão sendo treinadas para atuarem como consultores e entenderem o perfil de cada cliente. Trata-se da venda consultiva. A escolha não se limita apenas à declaração de imposto de renda completo (PGBL) ou declaração simplificada (VGBL), como ocorria até dezembro passado. Na análise do perfil do cliente, uma série de variáveis como: idade, período de acumulação, número total das fontes de renda que a pessoa terá no futuro (quando se aposentar), despesas que poderão ser deduzidas na declaração de IR, entre outros itens, são avaliadas. "Valerá a pena adotar o regime regressivo quanto mais longo for o prazo de acumulação e maior a renda acumulada", afirma Franco, da ABN Amro Real Previdência. O sistema de alíquotas progressivas - único regime existente até dezembro - continua como antes. A única mudança trazida para esse sistema na nova legislação tributária dos planos de previdência é a retenção de 15% do IR na fonte na hora do resgate parcial ou total. O imposto retido antecipadamente poderá ser compensado na declaração de ajuste anual. Com a antecipação do IR, o governo quer evitar artifícios que permitam a isenção do imposto nos resgates. Os benefícios não terão retenção de 15% do IR na fonte. No sistema progressivo, os resgates ou benefícios mensais até R$ 1.164,00 dos planos de previdência ficam isentos do recolhimento do IR. Nos saques de R$ 1.164,01 até R$ 2.326,00, por mês, há incidência da alíquota de 15% de IR e uma parcela a deduzir de R$ 174,60. A maior alíquota no regime progressivo é de 27,5%. Ela incide sobre os ganhos mensais acima de R$ 2.326,00. Nessa faixa, há uma parcela de dedução de R$ 465,35.