Título: Venezuela impõe teto para juros bancários
Autor: Rodrigo Uchôa
Fonte: Valor Econômico, 29/04/2005, Internacional, p. A11

O Banco Central da Venezuela (BCV) decretou ontem um conjunto de medidas de regulação do sistema financeiro, criando um teto de 28% anuais para os juros praticados pelos bancos - incluindo os dos cartões de crédito - e um piso de 6,5% para os juros pagos às poupanças. O BCV disse que a intervenção pretende "propiciar o crescimento econômico do país e o bem-estar social, preservar o valor da moeda, fortalecer o espírito de poupança da população, incentivar o funcionamento adequado do sistema financeiro nacional e combater a inflação". O pacote passa a vigorar no início da semana que vem. Chávez vinha reclamando muito nos últimos dias que os bancos estariam praticando juros extorsivos, prejudicando a retomada do crescimento. A economia da Venezuela sofreu severas contrações em 2002 e 2003, principalmente por causa das greves e crises políticas que tumultuaram o panorama do país e causaram uma enorme queda na produção de petróleo, principal fonte de divisas venezuelana - a Venezuela é o quinto maior exportador do produto no mundo. Em 2004, o país retomou o crescimento, alcançando 17,3%. Apesar das reclamações, dados da Associação Bancária da Venezuela mostram que a média dos seis maiores bancos do país ficaram em abril bem abaixo do teto estabelecido ontem: 15,8%. Por outro lado, a própria associação admite que instituições menores estariam mesmo usando taxas superiores a 40%. Ainda segundo a Associação Bancária da Venezuela, vários bancos pagam menos de 1% para a poupança, apesar de a taxa média estar em 5,19%. "O espírito, o propósito e a razão dessa estratégia são efetuar uma regulação mais direta das taxas do sistema financeiro, e não mais a regulação indireta usada nos anos recentes, além de procurar uma melhor estrutura para as ditas taxas", disse um comunicado do BCV. Para Marcelo Trindade Miterhof, economista do BNDES, as medidas são "autoritárias", mas ele diz que não vê chances de elas serem adotadas aqui: "No Brasil, a redução dos spreads (e dos juros) passa fundamentalmente pelo aumento do volume de crédito da economia, gerando ganhos de escala pela diluição dos custos administrativos. Mas para isso é necessário reduzir o compulsório e diminuir a taxa básica, fazendo com que a perda do ganho fácil com títulos públicos forçasse os bancos a buscar lucro com o crédito". "Além disso, seria importante reduzir a tributação sobre as operações financeiras, deslocando-as para os lucros. Como se vê, esse é um conjunto de mudanças não triviais. Nesse contexto, lá como cá, a dureza da realidade estimula a adoção de simplificações autoritárias e ineficazes. Por ora, não há chance de uma medida desse tipo emplacar por aqui, já que o governo se rendeu completamente aos interesses do rentismo", completa Miterhof. O economista venezuelano Pedro Luiz Matos também criticou o pacote: "Ao prender as mãos dos bancos, o governo pode estar estimulando o mercado paralelo de crédito, como a compra de créditos comerciais [factoring]". Além da área dos juros, o BCV adotou outras medidas, proibindo a tarifação pelos bancos sobre operações em poupança ou descontos de cheques. As instituições não poderão mais exigir a manutenção de depósitos para a concessão de crédito e fica proibido condicionar a liberação de créditos à aquisição de serviços ou produtos. Anteontem, Chávez já havia decidido aumentar o salário mínimo do país em 26%, o que significa que agora ele chegará a US$ 188. "Este é um governo dos trabalhadores que está reafirmando seu compromisso com as classe trabalhadoras", disse o presidente venezuelano. O aumento das receitas de exportação de petróleo vem dando margem para o governo aumentar muito os programas sociais e os projetos de criação de empregos. Chávez diz que pretende concorrer à reeleição em 2007.