Título: Aversão a risco deprime mercados
Autor: Luiz Sérgio Guimarães
Fonte: Valor Econômico, 29/04/2005, Finanças, p. C2

A ata dúbia da última reunião do Copom do Banco Central foi sobrepujada em relevância por movimento de fuga do grande capital em direção a ativos mais seguros. Os EUA cresceram no primeiro trimestre do ano 3,1%, o menor ritmo em dois anos, quando se esperava alta de 3,5%. Associado ao repique inflacionário recente, o dado recoloca o temor de um quadro de estagflação na maior economia do mundo. Nesses momentos, o capital opta por mais segurança em detrimento da rentabilidade. Os investidores vendem ativos de risco e se refugiam nos títulos do Tesouro americano. O resultado é queda geral, tanto das ações e dos bônus emergentes quanto dos juros dos treasuries. Com a ampliação da procura, os T-Notes de 10 anos caíram de 4,2250% para 4,1460%. O "flight to quality" atingiu em cheio os papéis brasileiros, os de maior liquidez. Os fundos venderam Global 40 (recuo de 0,93%) e C-Bond (-0,37%) e o risco-país subiu 3,59%, para 462 pontos-base, neutralizando os rumores segundo os quais a República iria reabrir a emissão em euros. Trata-se do bônus emitido no final de fevereiro com vencimento em 2015, por meio do qual captou-se ? 500 milhões.

Os investidores externos intensificaram a fuga da Bovespa. O índice, a 24.439 pontos, o menor nível desde 1º de fevereiro, caiu 3,18%, uma desvalorização bem mais acentuada do que a sofrida pelos bolsas de Wall Street. O Dow Jones cedeu 1,26% e o Nasdaq, 1,35%.

Ata ambígua provoca alta dos juros futuros

O crescimento da aversão ao risco sabotou a estratégia dos "vendidos" no mercado de dólar futuro da BM&F. Estavam ensaiando operações destinadas a empurrar a moeda americana no segmento à vista para aquém dos R$ 2,50. Mas a saída de capital externo da Bolsa e a alta do risco-país inverteram a mão do câmbio. O dólar fechou em forte alta de 1,47%, cotado a R$ 2,5530. As notas da reunião do dia 20 do Copom, a que, surpreendendo o mercado, não encerrou o ciclo de altas da Selic e elevou a taxa de 19,25% para 19,50%, configuraram uma "ata hedge": titubeantes e contraditórios, os seus 62 parágrafos são capazes de justificar tecnicamente tanto uma manutenção do juro quanto uma alta de 0,50 ponto no dia 18 de maio, data da próxima reunião. O mercado futuro de juros da BM&F esperava um tom mais firme em favor da estabilidade. Como os indícios são de que o BC só sustentará a taxa em 19,50% se houver conjugação improvável de dados - cenário externo mais propício à apreciação cambial, queda da inflação corrente e das expectativas de IPCA futuro -, o pregão tratou de se proteger. E a alta dos contratos foi generalizada. O contrato mais curto, para a virada de maio, subiu de 19,40% para 19,42%, embutindo mais uma alta de 0,25 ponto da Selic. Para a virada do semestre, a projeção avançou de 19,58% para 19,62%. E, para a passagem de ano, de 19,49% para 19,55%. Para os analistas, o tom vacilante da ata reflete o fato de que a política monetária do BC está em uma sinuca: a economia está se desaquecendo e a inflação em rota ascendente. O que o BC fará? Só para que não se diga que não fez nada, subirá o juro em 0,25 ponto. E empurrará o problema para frente. Mas decisões tomadas agora afetam politicamente 2006, ano para o qual se espera juros compatíveis com o crescimento.