Título: Nortel tenta deixar crise para trás
Autor: Talita Moreira
Fonte: Valor Econômico, 11/10/2004, Empresas & Tecnologias, p. B-1

Companhia refaz balanços e implanta sistema SAP para melhorar controles internos

A canadense Nortel Networks, fabricante de equipamentos para telecomunicações e internet, espera completar em dezembro uma ampla reestruturação interna, cujo objetivo é deixar para trás quatro anos de crise e práticas contábeis duvidosas. Até lá, estará feita a implantação do sistema SAP para reorganizar os controles internos e pavimentar a adequação à Sarbanes-Oxley, lei corporativa americana (a Nortel tem ações listadas nos EUA). No fim deste mês, a Nortel apresentará nova revisão das demonstrações financeiras de 2001 a 2003 - depois de ter refeito os balanços no ano passado. A companhia também criou o cargo de diretor de ética, que trabalhará junto com o presidente-executivo e com o presidente do conselho de administração. Somente na instalação do SAP foi investido algo entre US$ 50 milhões e US$ 100 milhões. O valor exato não foi divulgado. É parte da conta que a Nortel tem a pagar para restaurar a credibilidade perdida quando vieram à tona evidências sobre sua gestão e contabilidade problemáticas. "A transição estará concluída no fim deste ano e estamos fazendo o necessário para que esses problemas não voltem a acontecer", disse ao Valor o presidente mundial da Nortel, Bill Owens, durante entrevista na fábrica de Campinas. Foi a primeira visita do executivo ao Brasil desde que assumiu o cargo. Owens, americano que já era conselheiro da Nortel, chegou à presidência em abril com a missão de apagar o incêndio. Substituiu Frank Dunn, demitido com mais dois executivos por conta de falhas nos balanços. Naquela altura, veio a público que a Securities and Exchange Commission (órgão regulador do mercado americano) havia aberto uma investigação formal sobre os balanços que a Nortel já revisara. A empresa é alvo de ações na Justiça movidas por investidores que se sentiram lesados pelo fato de os balanços de 2000 e 2001 terem superestimado as receitas. No Canadá, há processos contra a Nortel e a Deloitte, que auditou as demonstrações financeiras. Na primeira revisão dos balanços, a Nortel eliminou US$ 952 milhões em provisões que havia feito. Agora, já alertou que o lucro do primeiro semestre de 2003 cairá à metade e parte dele será contabilizada em períodos anteriores. A crise do setor de telecomunicações, no início da década, atingiu a Nortel em cheio e levou a companhia a fazer uma bilionária baixa contábil de seus ativos. Desde então, terceirizou boa parte da produção (manteve apenas os itens de maior valor agregado) e reduziu o número de funcionários de 94 mil para 35 mil. Até o fim do ano, mais 3,2 mil serão cortados. Owens aposta suas fichas em produtos baseados em protocolo de internet (IP) - como voz e vídeo - para reerguer a companhia. O mundo IP representa cerca de 10% das vendas, mas deverá chegar a mais da metade em alguns anos, disse Owens, que fez carreira no Exército dos EUA - onde trabalhou com o vice-presidente americano, Dick Cheney. O Brasil deverá ter mais espaço nessa nova fase. A Nortel estuda ampliar a área de pesquisas e a linha de produção em Campinas, tornando-a centro de exportação para a América Latina. A fábrica poderá ser um pólo para equipamentos de redes de telefonia móvel no padrão GSM. Hoje, a empresa só produz no país sistemas na tecnologia rival, o CDMA. "Minha visita é prova de que o mercado brasileiro ganhará importância para a Nortel", disse Owens. Ele não revelou o valor do investimento necessário. O grupo gasta em pesquisas 20% de sua receita anual, de US$ 10 bilhões. Segundo Owens, a vantagem do país são custos de mão-de-obra menores que nos EUA e Canadá. "Estamos todos competindo contra os chineses, que têm custos trabalhistas baixíssimos. O Brasil não tem custos tão reduzidos, mas tem mão-de-obra de classe mundial." A Nortel não divulga o faturamento da subsidiária brasileira.