Título: Corte no orçamento federal ameaça programas de estímulo à inovação
Autor: Ricardo Balthazar
Fonte: Valor Econômico, 02/05/2005, Brasil, p. A2

O governo federal promoveu há um mês cortes que reduziram substancialmente o orçamento disponível neste ano para programas de estímulo à inovação tecnológica no setor privado. A indefinição provocada pelos cortes ameaça paralisar os projetos de várias empresas que haviam se candidatado aos benefícios oferecidos por esses programas. Os programas atingidos são administrados pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), braço financeiro do Ministério da Ciência e Tecnologia. Nos últimos anos, a Finep emprestou a dezenas de empresas milhões de reais com juros subsidiados para financiar projetos de pesquisa e desenvolvimento de produtos. Um dos programas que mais sofreram com os cortes foi o de equalização de juros, que permite à Finep reduzir as taxas dos seus empréstimos a metade do que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) costuma cobrar em operações normais. Esse programa perdeu 42% das verbas previstas no orçamento para este ano. Outro programa prejudicado é o de incentivo a empresas de base tecnológica, que teve 92% do orçamento cortado. Nos últimos anos, a Finep usou o dinheiro desse programa para injetar recursos em fundos de capital de risco que apostam em pequenas empresas emergentes. Quatro fundos receberam R$ 7,6 milhões da Finep nos últimos dois anos. O orçamento desses programas foi cortado por um decreto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no fim de março. Eles são alimentados por fundos de apoio à pesquisa formados com contribuições arrecadadas das empresas. Legalmente, esse dinheiro não pode ter outra finalidade, mas a maior parte tem sido bloqueada por Brasília todos os anos por medida de economia. Embora existam fundos específicos para esses programas, na confecção do orçamento o Ministério do Planejamento definiu outra fonte de recursos para eles e condicionou-os à aprovação de um projeto de lei que muda a distribuição dos royalties que o governo arrecada sobre a exploração de petróleo. Como esse projeto ainda não foi aprovado pelo Congresso, foi preciso editar o decreto que promoveu os cortes. A maior parte do dinheiro do Ministério da Ciência e Tecnologia que evaporou em março foi recomposta por uma medida provisória editada há duas semanas. Ela garantiu recursos para bolsas de pesquisadores financiados pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e projetos de outros ministérios atingidos pelo decreto de março. Mas o dinheiro dos programas de estímulo à inovação não reapareceu. Segundo o secretário-executivo do ministério, Luis Manuel Fernandes, isso será feito por meio de um projeto de lei que será enviado ao Congresso. "A perda desses recursos será revertida", disse. Ele não soube explicar por que só o dinheiro das bolsas do CNPq foi recuperado por medida provisória e disse que não há data prevista para apresentação do projeto de lei destinado a recuperar os demais recursos. Essa indefinição pode prejudicar muito a execução dos programas de incentivo à inovação na Finep. Segundo um funcionário que acompanha o assunto de perto, os cortes impedem a aprovação de novos empréstimos da Finep neste ano e afetam a capacidade da agência de honrar compromissos com os fundos de capital de risco que apóia. A Finep participa de 11 fundos e assumiu o compromisso de aplicar neles R$ 63 milhões, além do investimento feito no ano passado. O presidente da Finep, Sergio Machado Rezende, recusou-se a avaliar o impacto que os cortes terão se não forem revertidos rapidamente. "O ministério assegurou que não haverá cortes e estamos trabalhando dentro do programado", disse Rezende. No início deste ano, havia na carteira da Finep 40 novas operações prontas para ser contratadas, no valor total de R$ 342 milhões. A Finep é a única agência do governo federal com instrumentos desenhados para estimular a inovação tecnológica nas empresas e gente especializada na análise de projetos nesse campo. Ela teve muito prejuízo com operações descuidadas que fez na década de 90, mas passou a buscar recentemente projetos de grandes empresas para reduzir os riscos financeiros de sua carteira. Companhias que investem muito em inovação, como a Embraer, a Braskem e a Oxiteno, tomaram dinheiro na Finep nos últimos dois anos. Elas foram atraídas especialmente pelo mecanismo de equalização de juros que diminui os custos dos empréstimos da Finep. Se os cortes no orçamento não forem revertidos, dificilmente a agência voltará a ter crédito em condições atraentes para empresas como essas.