Título: Presidente faz promessas para 2008
Autor: Cristiano Romero, Taciana Collet e Cristiane Agost
Fonte: Valor Econômico, 02/05/2005, Política, p. A8

A menos de um ano e meio das eleições de 2006, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva adotou um discurso austero, mais realista e de reiteração da política econômica e da confiança que deposita no ministro da Fazenda, Antonio Palocci. Ao contrário do período em que disputou a eleição presidencial, Lula agora faz poucas promessas, reconhece alguns erros que seu governo cometeu e prega a persistência da ortodoxia na área econômica. O novo discurso de Lula esteve presente em duas oportunidades nos últimos três dias: na sexta-feita, durante a primeira entrevista coletiva que concedeu em quase dois anos e meio de mandato e na noite de sábado, no pronunciamento que fez à nação para falar do reajuste do salário mínimo. Ontem, em discurso de improviso pronunciado por ocasião das festividades do 1º de Maio, em São Bernardo, ele manteve o tom, mas, em clima de campanha, fez promessas que vão além de seu mandato, que termina em 2006. "Não pretendo permitir, em função de um ano eleitoral que se aproxima, em função da leviandade dos discursos falsos de alguns, qualquer atitude que coloque em risco o que, a duras penas, construímos até agora. Não quero que o Brasil tenha mais aquele modelo econômico de ´pulo de galinha´", disse o presidente na entrevista. "Como não canso de repetir: não existe mágica. Garanto a vocês que qualquer brasileiro responsável, sério e verdadeiramente comprometido com o trabalhador brasileiro, no meu lugar, faria exatamente o que estou fazendo", afirmou no pronunciamento à nação. Lula se preparou cuidadosamente para a entrevista coletiva. Um ministro - Luiz Gushiken (Comunicação do Governo e Gestão Estratégica) - e três assessores orientaram o presidente um dia antes da entrevista. São eles: o porta-voz da presidência e idealizador da coletiva, André Singer; a subchefe da Casa Civil para Articulação e Monitoramento das Ações do Governo, Miriam Belchior; e o assessor econômico do presidente, José Graziano. O publicitário Duda Mendonça, que assessora Lula desde a campanha presidencial, também deu orientações - na quarta-feira, Duda viajou com Lula ao Pará. Outro que fez sugestões ao presidente foi o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, que se reúne diariamente com ele no Palácio do Planalto. O presidente planejou fazer um pronunciamento de improviso no início da entrevista. Acabou convencido por seus assessores de que o improviso poderia abrir flancos e prejudicar todo o trabalho de preparação. Lula só desistiu de discursar minutos antes do início do início da coletiva. O presidente reiterou, na entrevista, a austeridade que sua administração imprimiu, desde o início do mandato, às políticas monetária e fiscal. Defendeu o Banco Central, que, segundo dele, busca cumprir, com os juros altos, a meta de inflação estabelecida pelo governo. Os juros, deixou claro o presidente, vão cair quando houver condições efetivas para isso. "Precisamos trabalhar para criar condições para que essa taxa de juros baixe. Estamos caminhando, primeiro, para garantir a estabilização da economia", observou. Lula avisou que vai perseguir o centro da meta de inflação fixada para este ano, mas abriu a possibilidade de mudança da meta dos próximos anos. "Pelo menos para este ano a meta é 5,1%. Vamos perseguir essa meta", afirmou. "O que eu quero é não permitir que a inflação volte a ser o grande ladrão do salário do povo trabalhador deste país." Numa clara mensagem ao mercado, que tem estado nervoso, o presidente renovou publicamente sua confiança no trabalho do ministro Palocci à frente da economia. "Tenho pelo companheiro Palocci o mais profundo respeito, tenho uma ligação política, ideológica, uma relação de quase 30 anos, portanto, poderia dizer que eu e o Palocci somos unha e carne. Tenho total confiança nas coisas que o Palocci faz", disse. Na sexta-feira, pela primeira vez desde que tomou posse, Lula admitiu que seu governo cometeu erros nesses 28 meses de gestão. A pedido de um jornalista, citou três: o fato de o governo não ter trabalhado mais para eleger seu candidato à presidência da Câmara dos Deputados; a não-realização de obras para recuperação das rodovias; e o peso excessivo que recaiu sobre a política monetária no combate à inflação. O presidente sinalizou que o governo adotará outros "instrumentos" para aliviar o trabalho do Banco Central na política de redução da inflação. Não disse quais, citou as dificuldades em fazê-lo, mas assegurou que não haverá pacotes nem "pirotecnia". Nesse momento, sem citá-los nominalmente, criticou medidas anti-inflacionárias adotadas por dois de seus antecessores - José Sarney, seu aliado hoje, e Fernando Collor de Mello. "Não seremos pegos de surpresa, nunca mais, com um plano econômico que anuncia o céu em um dia e, no dia seguinte, você cai em um buraco", garantiu. "Possivelmente, se tivesse 30 anos, adoraria uma pirotecnia, mas aos 59 anos, de barba e cabelo branco, prefiro fazer as coisas com o melhor senso possível. A busca incessante para consolidar essa economia faz parte do meu cotidiano e do cotidiano do Palocci e, portanto, as pessoas têm a minha total confiança." Ao mesmo tempo em que pregou a continuação da atual política econômica, Lula não se comprometeu com novas reformas. Sobre o crescente déficit da previdência social, sinalizou apenas um "choque de gestão". Questionado sobre a formalização da independência do Banco Central, medida que Palocci defende com ênfase, mas que seu partido, o PT, rejeita com veemência, o presidente deixou claro que ela não é prioritária. E sugeriu que a formalização pode mesmo não ser adotada. "Não faço disso uma peça de campanha, uma determinação de programa. Se chegar, no momento certo, a partir dos debates que estão se iniciando, de que isso é possível e que isso melhora, não vejo por que não fazer. Mas pode ser que cheguemos a uma posição diferenciada", despistou. "Na teoria, a prática é outra. Ninguém pode garantir que a autonomia, por si só, resolva o problema do Banco Central." Ontem, nas comemorações do Dia do Trabalho, em São Bernardo do Campo, Lula abandonou um pouco o tom moderado dos dois dias anteriores. Num discurso de improviso em que admitiu tacitamente sua reeleição em 2006, ele se comprometeu com a ampliação da rede elétrica até 2008, dois anos após o fim de seu mandato. "Essa é uma certeza, uma garantia." Mais tarde nas comemorações do 1º de Maio da CUT, na avenida Paulista, o ministro da Casa Civil, José Dirceu, esclareceu que a promessa feita pelo presidente é uma meta do Plano Plurianual (PPA). "É uma meta do Estado brasileiro e não tem nada a ver com este presidente ou aquele. Está no Plano Plurianual de governo, que vai até 2008", argumentou, ao responder a perguntas de jornalistas sobre as afirmações de Lula durante a Missa do Trabalhador. Dirceu lembrou que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso também deixou uma série de metas para 2005 no PPA elaborado em seu governo. (Com agências noticiosas)