Título: Consumidor mais sofisticado muda o mapa dos negócios
Autor: The Economist
Fonte: Valor Econômico, 02/05/2005, Empresas &, p. B8

O Super Bowl, a final do campeonato de futebol americano nos Estados Unidos, é uma excelente desculpa para uma festa, especialmente para o setor publicitário. Ele mostra que as pessoas ainda apreciam anúncios criativos e entretidos. Ele também suscita uma questão desconfortável: será que realmente consegue vender mais garrafas de cerveja, carros ou pílulas para disfunção erétil? Apesar de os telespectadores tenderem a se lembrar de um comercial particularmente bom, muitos não conseguem se lembrar do produto apresentado. E na maioria das vezes eles tentam evitar o bombardeio crescente dos comerciais. Atrair a sua atenção está se tornando cada vez mais difícil, pois as audiências vão se fragmentando à medida que as pessoas optam pelo uso de diferentes tipos de mídia, como televisão a cabo e internet. A escolha de produtos e serviços disponíveis está se multiplicando, porém, ao mesmo tempo, os consumidores estão ficando mais céticos a respeito das alegações apresentadas para os produtos. No mercado atual, os consumidores têm o poder de selecionar e escolher como nunca. Esse novo poder do consumidor está transformando a forma de comprar das pessoas. A capacidade de obter informação sobre qualquer coisa que desejarmos, quando quisermos, outorgou aos compradores uma força sem precedentes. Em mercados com preços altamente transparentes, eles são reis.

A implicação para o mundo dos negócios é enorme: ameaçadora para alguns, bem-vinda para outros. Por exemplo, o enorme aumento na escolha tem o efeito de valorizar, não depreciar, certas marcas. E, enquanto desmoronam as antigas unidades de negócios, uma marca forte em um setor pode oferecer a credibilidade para penetrar em outro. Dessa forma, a Apple usou o seu iPod para subtrair negócios em tocadores de música portáteis da Sony; a Starbucks pretende fazer muito barulho na indústria de música, ao instalar gravadores de CD em seus cafés; e a Dell está se afastando de computadores para ingressar em produtos eletrônicos de consumo. "Estou constantemente admirado com o nível de confiança e de sofisticação do consumidor médio", diz Mike George, principal executivo de marketing da Dell e gerente geral do seu setor de consumidores nos Estados Unidos. A Dell disparou ao topo do setor de computadores pessoais ao eliminar os varejistas e começando a vender diretamente aos consumidores. Se a Dell altera o preço em seu website, os padrões de compra dos seus clientes mudam literalmente em um minuto. "Isso demonstra que as pessoas estão bem atualizadas e informadas", diz George. Mesmo o ato de comprar um carro, por muito tempo considerado como a pior experiência de varejo que as pessoas podem ter, está em transformação. Mais de 80% dos clientes da Ford nos EUA já pesquisaram sua compra futura na internet antes de se dirigirem a um showroom, e a maioria aparece com uma planilha de especificações mostrando o carro exato que querem do inventário do revendedor, juntamente com o preço que estão dispostos a pagar. Igualmente, mais de 75% dos compradores de telefones celulares na América fazem a sua pesquisa na web, mesmo que apenas 5% compre on line, diz John Frelinghuysen, da consultoria de negócios Booz Allen Hamilton. Os consumidores ainda querem ir a uma loja para entregar o seu dinheiro e receber o seu telefone, porém, antes, eles querem ver exatamente o que o pacote de serviços cobre e ler o que os outros usuários dizem sobre a sua escolha. Com o crescente fortalecimento do poder dos consumidores, como podem as empresas de marketing, publicidade e de comunicação, que as empresas usam para promover os seus produtos, esperar que as suas mensagens cheguem ao alvo? E o que isso significa para as empresas de mídia que dependem de receita publicitária, os canais tradicionais para atingir esse público cada vez mais arisco? A "desintermediação" - o processo de eliminação de intermediários - parece estar no ar. As três grandes redes de TV aberta nos Estados Unidos se garantiram dos dois lados ao comprarem canais a cabo. O setor publicitário está se reorganizando, buscando segurança no tamanho. Muitas agências agora estão reunidas em quatro grupos globais: Omnicom e Interpublic, dos EUA, Publicis, da França, e WPP, do Reino Unido. De certa forma, elas estão recriando as grandes gigantes de publicidade verticalmente integradas do passado, porém com empresas administradas separadamente, para oferecer a gama de serviços especializados de marketing que julgam interessar aos seus clientes no futuro. Assim sendo, o que nos reserva o futuro? "Pela primeira vez, o consumidor é o chefe, o que é assustador, de forma fascinante, pois tudo o que costumávamos fazer, tudo o que sabíamos, não funcionará mais", diz Kevin Roberts, executivo-chefe da Saatchi & Saatchi, que integra a Publicis. Shelly Lazarus, chefe da Ogilvy & Mather, que integra a PPP, é mais otimista. "O setor publicitário está vibrante como sempre. Tudo se resume à forma de se definir o segmento, que atualmente está muito mais abrangente, com novas formas de se chegar até as pessoas", explica Lazarus. "No passado, costumávamos martelar a mensagem criativa no mercado e procurávamos atingir uma freqüência", diz Howard Draft, um veterano especialista em marketing direto e executivo-chefe da sua agência homônima em Nova York, que integra a Interpublic. "Basicamente, aquilo está morto. Hoje temos um cliente informado que está assumindo o controle sobre a forma como se inteira e ouve falar sobre produtos". Empresas com um dos maiores orçamentos publicitários do mundo estão começando a prospectar novas maneiras de atrair a atenção dos consumidores. Jim Stengel, diretor de marketing global da Procter & Gamble, é um dos mais ferrenhos críticos do setor publicitário, conferindo-lhe uma nota negativa por sua incompetência em englobar novos canais de comunicação. E Larry Light, que na condição de principal executivo de marketing do McDonald´s tem se dedicado a promover uma reforma, diz, sem rodeios: "Os dias de marketing em massa terminaram". O varejo em massa, no entanto, parece vigoroso como sempre. Os supermercados estão absorvendo uma proporção crescente dos gastos dos consumidores - e em muitos itens que vão além de mercearia. Uma fração crescente dos negócios da Wal-Mart, a maior rede de supermercados do mundo, se origina a partir de pessoas que procuram informação on line e que depois visitam a loja para concretizar a compra. "Eu acho que isso nos beneficia porque nós somos campeões em preços baixos", diz o principal executivo da Wal Mart, Lee Scott. Essa nova maneira de comprar, observa, "dá poder aos consumidores e a nós". Os consumidores, é claro, não se importam nem um pouco com as maquinações de marketing. Eles estão deliciados por terem mais opções, o que lhes facilita virar as costas a uma empresa de que não gostam e comprar noutro lugar. Para algumas pessoas, esta é uma doce vingança. "Os consumidores ficaram exaustos e cínicos", diz Rob Markey, sócio da consultoria Bain & Company. "Há uma pilha de promessas não cumpridas amontoadas no chão".