Título: ONS indica que oferta de energia para 2008 é crítica
Autor: Chico Santos e Cláudia Schüffner
Fonte: Valor Econômico, 13/10/2004, Especial, p. A-10

Demanda cresceu 4,6% até setembro, mas está acelerando

É grande o risco de o Brasil viver um novo déficit de energia elétrica em 2008 caso a economia cresça acima de 3,5% ao ano até lá. O alerta foi dado pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) em sua segunda revisão quadrimestral do Planejamento Anual da Operação Energética para o período 2004-2008, divulgada na sexta-feira. No documento, o ONS alerta para os riscos de déficit de energia maior e mais profundo em 2008, "indicando insuficiência de oferta" em todas as regiões do país caso se realizem as premissas do cenário de mercado alto, ou seja, com grande consumo de energia. Mesmo no caso de crescimento moderado, o órgão alerta que "em 2008 observa-se elevação do risco de déficit em todos os subsistemas". O ONS fez projeções de mercado com base em um cenário de referência e outro de consumo mais elevado, chamado de cenário alto. No de referência foi adotado como premissa um crescimento médio de 4,1% do Produto Interno Bruto (PIB) entre 2005 e 2008 e de 3,6% em 2004, o que traria um aumento médio de 5,1% no consumo anual de energia elétrica. Para o de mercado alto, foi considerada a hipótese de o PIB ter crescimento médio de 4,9% entre 2005 e 2008, e de 4,9% este ano, o que puxaria o consumo de energia para 6,4% ao ano. As projeções médias do mercado para o crescimento do PIB em 2004 já apontam para 4,5%, número mais próximo do cenário alto. . Até setembro, o consumo de energia subiu 4,6% em relação ao mesmo período de 2003, mas há aceleração recente na demanda, em sintonia com o ritmo mais forte da atividade econômica. Em agosto e setembro, o consumo subiu 7,3% e 7,9%, respectivamente, em relação a iguais meses do ano passado, segundo o ONS.

Além de sinais atuais de que o crescimento da demanda por energia pode ser superior ao estimado, justamente em 2008 - ano mais crítico -, a previsão é de que entrem em operação projetos que vão aumentar em apenas 580 MW a capacidade de geração do país, muito menos que os 8.455 MW que entrarão em operação até dezembro de 2006. Ainda segundo o ONS, caso se concretizem as projeções de crescimento mais acelerado que compõem o cenário de mercado alto, "a partir de 2007 observa-se uma elevação nos riscos de déficit em todas as regiões" do Sistema Interligado Nacional (SIN). "Em 2008, observam-se riscos de déficit maiores com déficits mais profundos, indicando insuficiência de oferta", continua o relatório. Essas projeções, segundo o órgão, indicam "a necessidade de expansão adicional da oferta e ou antecipação da entrada em operação de novos projetos de geração". Tanto no cenário chamado de referência quanto no cenário de crescimento mais vigoroso, os subsistemas com maior risco são o Norte e o Nordeste. Entre a primeira e a segunda revisão quadrimestral do Planejamento da Operação Energética 2004, o ONS aumentou de 9,2% para 9,5% a probabilidade de ocorrer qualquer déficit de energia no subsistema Sudeste/Centro-Oeste em 2008. Nos demais subsistemas, o risco supera os dois dígitos. No Sul, a probabilidade de qualquer déficit de energia em 2008 é de 11,2%, enquanto no Norte é de 16,4% e no Nordeste a probabilidade de déficit saltou de 10,2% para 12,5% entre uma e outra revisão quadrimestral. Não por acaso, o ONS recomenda, para garantir o suprimento e a confiabilidade do fornecimento de energia para essas regiões, a complementação com geração local ou ampliação de linhas de transmissão. Além disso, sugere que seja monitorado o crescimento do mercado em 2008, especialmente no Norte, já que no cenário de maior atividade econômica a região poderá consumir cerca de 1.000 MW acima da projeção em caso de crescimento moderado. Uma rápida olhada no comportamento do mercado em setembro, quando foram batidos recordes nos dias 20, 21, 22 e 23, mostra que o consumo de energia está indo de vento em popa. Exemplo disso é que o pico de consumo do sistema interligado - que exclui a região Norte - atingiu 58.816 megawatts (MW) às 18h54 do dia 21 de setembro, segundo o ONS. A análise de especialistas que acompanham os dados históricos é de que o crescimento mensal registrado em agosto e setembro está sendo puxado, basicamente, pela indústria. Isso deve prosseguir até este mês, fechando o ciclo de produção para o final do ano. A partir de novembro o consumo industrial cai e, com o verão, o residencial cresce, impulsionado pelo uso dos aparelhos de ar condicionado. Os mesmos analistas avaliam que o crescimento é consistente, mas não chega a preocupar em relação ao que já se espera para o setor até o começo de 2007. Se foi acusado por alguns de ter contabilizado de forma otimista a oferta de geração térmica antes do racionamento, agora o ONS está sendo conservador ao projetar o aumento da oferta de energia. Nas previsões, ele retirou todos os grandes projetos de geração com restrição para entrada em operação. Também ficaram de fora as termoelétricas do Nordeste e onde não há disponibilidade de gás e outras com restrição, que somam 5.939 MW. No Nordeste a restrição para a chegada do gás faz com que essas usinas não consigam se adequar à portaria 40 da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), que exige lastro físico. Uma fonte do governo ouvida pelo Valor explicou que o relatório ainda não preocupa e que os dados apresentados já eram esperados, ressaltando o fato de o ONS ter sido conservador ao contabilizar a oferta de energia - foram retirados além das hidroelétricas sem licença ambiental os projetos do Proinfa, que somam 1.767 MW. Outro exemplo de projeto que não entrou na contabilização é a gigantesca hidrelétrica de Estreito, no Tocantins, prevista para iniciar a operação em 2009 e que, sozinha, vai agregar 1.087 MW ao Sistema Interligado Nacional (SIN). Outra das maiores usinas previstas para entrar em operação, não contabilizada, é Foz do Chapecó. Ambas têm pendências ambientais.