Título: BB e Caixa podem valer US$ 50 bi
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 13/10/2004, Finanças, p. C-1

Bancos Funding barato, fatia de mercado e carteira de clientes sustentam avaliação alta

O governo deveria privatizar os bancos federais. A proposta polêmica é de um dos mais importantes analistas de bancos do mercado, Pedro Guimarães. Com a experiência de quem participou de seis privatizações do setor financeiro e foi um dos principais cérebros por trás da compra do Banespa pelo espanhol Santander, Guimarães, agora no ING, calcula que o governo arrecadaria pouco mais de US$ 30 bilhões apenas com a venda do Banco do Brasil (BB) e mais de US$ 22 bilhões com a da Caixa Econômica Federal (CEF), totalizando perto de US$ 50 bilhões. Consultado a respeito da avaliação do ING, o Banco do Brasil não se pronunciou. Sobre uma eventual abertura do capital ou venda da Caixa Econômica Federal, o vice-presidente, Fernando Nogueira da Costa, afirmou que o banco simplesmente não discute o assunto. Considerando os bancos federais e estaduais em operação, o analista estima em cerca de US$ 60 bilhões a franquia do governo na área financeira, que lhe garantem o domínio de aproximadamente metade dos depósitos do sistema financeiro e consumiram o equivalente a um terço do Produto Interno Bruto (PIB em variados planos de capitalização.

"Tudo é uma questão de custo de oportunidade. Com os recursos arrecadados, o governo poderia reduzir a dívida pública ou investir em projetos sociais. Ganharia mais do que em dividendos", calcula Guimarães. O analista acredita que há compradores dispostos a pagar preços nesse patamar. "Se o Citigroup pagou US$ 12,5 bilhões para comprar o mexicano Banamex, certamente pagaria mais pelo BB, que é quatro vezes maior em participação de mercado", exemplificou. Vários outros negócios no mercado mexicano também foram bilionários. No início deste ano, o espanhol BBVA pagou US$ 4,1 bilhões por pouco mais da metade do capital do Bancomer, no qual já havia investido US$ 1,4 bilhão. Além disso, o Santander e o Bank of America já pagaram mais de US$ 6 bilhões pelo Serfin. Nas duas últimas semanas, Guimarães visitou clientes do ING na Europa e Estados Unidos, apresentando seus estudos. Ele avaliou o preço dos bancos públicos brasileiros levando em conta quanto o Santander pagou por 1% de fatia do mercado de depósitos do Banespa - US$ 1,37 bilhão. Quando foi leiloado, o Banespa tinha 3,5% dos depósitos do mercado e acabou sendo arrematado por US$ 4,8 bilhões, a preços atualizados. O analista considera os depósitos o melhor indicador do peso de um banco no mercado porque eles sinalizam o fôlego para os negócios. Com a queda dos juros, os bancos terão que emprestar porque não poderão mais garantir o lucro apenas com a carteira de títulos públicos. "Os bancos só não emprestam mais porque o retorno dos títulos públicos cobre os custos fixos." Para ele, a expectativa de que a Selic suba até 17% ao ano no final de dezembro tendência de alta. O aumento de um ponto na Selic "é irrelevante" na tendência geral. "Com a economia reaquecida, a inflação e as despesas sob controle, a população vai procurar financiamento e o governo vai perder importância. É muito claro que os bancos têm que dar crédito", explicou. Guimarães detalhou as vantagens comparativas do BB em amplo relatório que acaba de elaborar. Para ele, os investidores subestimam o valor do BB, que tem 21,9% do mercado de depósitos, incluindo um bom volume de depósito judicial - que custa o mesmo que a poupança, TR mais 6,17% -, uma carteira de 20 milhões de clientes entre os quais 5,5 milhões de estáveis funcionários públicos. Para ele, explorar a base de clientes oferece um ganho potencial de US$ 20 bilhões. O analista calcula também que um eventual comprador economizaria US$ 10 bilhões em despesas de pessoal, com demissões e contratação de funcionários com salários mais baixos. O BB tem cerca de R$ 19 bilhões em depósitos judiciais; a Caixa Federal, R$ 12,4 bilhões e a Nossa Caixa, controlada pelo governo paulista, R$ 8,5 bilhões. Outra vantagem do BB é a solidez dos ativos, após as capitalizações feitas pelo Tesouro. As vantagens atribuídas por Guimarães à Caixa Econômica Federal são semelhantes: fatia de mercado elevada, 16,4% dos depósitos do sistema financeiro, e custo baixo de funding, com muitos depósitos de poupança, judiciais, além do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). A Caixa também passou por várias operações de capitalização, sendo a mais recente a de 2001, quando recebeu US$ 32 bilhões, calculou o analista, compreendendo US$ 4 bilhões em capitalização e US$ 28 bilhões em transferência de risco. "A CEF tem uma franquia comparável à do Banco do Brasil, Bradesco e Itaú. Mas a escala e o custo baixo do funding são neutralizados por ineficiências", disse Guimarães. O analista lembrou que, ao avaliar a eficiência dos bancos pela relação entre tarifas e despesas de pessoal, o risco é não saber que alguns tipos de despesas estão contabilizados em outras contas. Despesas com planos previdenciários, por exemplo, muitas vezes são contabilizadas em outras despesas operacionais; e a terceirização, em outras despesas administrativas.