Título: Investimento em construção
Autor: Flavia Lima
Fonte: Valor Econômico, 02/05/2005, EU &, p. D1

Os fundos imobiliários se preparam para disputar o investidor em busca de diversificação quando o cenário for de juros mais baixos. Mas, antes disso, algumas carteiras têm dado provas de que podem ser competitivas mesmo em situações pouco favoráveis. O Shopping Pátio Higienópolis é uma das "meninas-dos-olhos" do setor. O fundo, que detém 25% do empreendimento, rendeu 6,20% nos três primeiros meses de 2005. Em igual período, o CDI subiu 4,18%. Em janeiro deste ano, a aplicação registrou o melhor desempenho desde que foi lançado - no início de 2000 - com ganhos de 2,60%. No ano passado, o rendimento de 18,27% do Pátio Higienópolis só ficou atrás de outro destaque do setor, o fundo Hospital da Criança. Com rentabilidade de 18,68%, a carteira ficou mais de dois pontos percentuais acima dos 16,16% do CDI. As performances acima da taxa de juros são privilégio de um número pequeno de carteiras em um universo de 62 fundos. E se a competição injusta com os juros altos pode ser apontada como o principal entrave ao crescimento, o sucesso desses fundos depende ainda de outros fatores, como um mercado secundário mais robusto e leis atualizadas. O setor completa 11 anos com patrimônio de R$ 2,4 bilhões. Pouco, especialmente se comparado a outros instrumentos de base imobiliária. A primeira emissão de Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs) - um título com lastro em créditos com origem em contratos de compra e venda de imóveis ou locação - foi feita em 1999 e juntou cerca de R$ 13 milhões. Hoje os CRIs têm R$ 1,7 bilhão em papéis emitidos. A liquidez ainda é um problema para os fundos imobiliários. Mas os avanços são grandes - os principais fundos voltados para o varejo são negociados em mercado organizado, via bolsa de valores ou Sociedade Operadora do Mercado de Ativos, a Soma. As exceções são o Água Branca e o Torre Almirante. Esse último ainda está em fase de distribuição de cotas, mas já é certo que deve estrear na bolsa assim que concluído o processo. Para alguns analistas, porém, a ida à bolsa não é suficiente. Régis Dall'Agnese, responsável pela área de estruturação de fundos imobiliários da Rio Bravo, reconhece que existem alguns fundos listados na bolsa e que isso tem facilitado a compra e venda dos papéis, em especial das carteiras mais populares. "Mas é o nível de pulverização que facilita a negociação no mercado secundário." A entrada dos grandes bancos no negócio inaugurou a fase de fundos pulverizados e deve se revelar um componente ainda mais importante para o crescimento do setor quando os juros assim permitirem. Mas por enquanto, diz Regis, o mercado secundário é movido por grandes grupos de investidores querendo vender grandes volumes. Além do cuidado com a liquidez, a garantia de rentabilidade que alguns fundos oferecem por um período determinado é outro ponto que merece atenção. O Água Branca pode ser tomado como exemplo. Até maio do ano passado, o fundo contava com rendimento garantido de 1,25%. Terminado esse período, no entanto, o fundo registra rendimento próximo de zero. Formado por um condomínio comercial na região que leva o mesmo nome em São Paulo, o fundo enfrenta dificuldades para alugar os espaços. Segundo fontes do mercado, o preço do aluguel sobrevalorizado elevou a vacância dos prédios para 80%. O setor espera ainda que as mudanças regulatórias exigidas há pelo menos quatro anos sejam finalmente atendidas. Entre as principais demandas estão a possibilidade de criação de fundos de fundos e da figura do "market maker" (formador de mercado). Isso permitiria que o administrador pudesse recomprar cotas, aumentando a liquidez do mercado e incentivando transações. Para Sérgio Belleza, responsável pela área de fundos imobiliários da Coinvalores, há "desinteresse" da autoridade regulatória. "Uma das poucas alterações feitas favorece os bancos comerciais, permitindo que eles também possam administrar fundos imobiliários", reclama Belleza, em referência ao dispositivo incluído em instrução da CVM, divulgada há duas semanas. A isenção de impostos nos rendimentos periódicos, já conferida aos CRIs de pessoas físicas, é outra exigência dos gestores de fundos imobiliários. Além disso, o setor quer que o ganho de capital na venda das cotas dos fundos no mercado secundário pague o mesmo imposto das ações, de 15%, ante os atuais 20%. Mesmo em meio a essas pendências, o setor não está parado, diz o gerente nacional da área de investidores institucionais da Caixa Econômica Federal (CEF), Roberto Carlos Madoglio. Tanto a Caixa quanto o Banco do Brasil (BB) entraram no negócio e hoje usam suas poderosas redes de agências para distribuir cotas de fundos imobiliários. A Caixa está atualmente vendendo seu segundo fundo, o Torre Almirante, com patrimônio de R$ 104,7 milhões. Segundo fonte ligada ao negócio que preferiu não ser identificada, a venda só não foi concluída por causa da concorrência dos juros altos. O BB iniciou neste mês a distribuição secundária do BB Progressivo, com patrimônio de R$ 130 milhões. A carteira, formada por dois prédios do banco vendidos ao fundo, é administrada pela Caixa. Há vários projetos para o médio prazo, quando as taxas de juros estiverem mais competitivas, entre 15% e 16% ao ano, segundo projeções do setor. "Acima disso, a competição é injusta", diz Fábio Nogueira, da Ourinvest, que já estruturou R$ 1,2 bilhão em fundos. A Rio Bravo, que hoje administra 21 fundos imobiliários em um total de R$ 880 milhões, é outra que tem projetos para 2005. Um deles, diz Dall'Agnese, deve ser uma carteira voltada ao varejo, com aplicação mínima de até R$ 20 mil, formada por imóveis comerciais. Madoglio, da Caixa, também afirma que o banco permanece de olho nas oportunidades. No geral, todos concordam que as apostas futuras devem se concentrar nos fundos voltados para shoppings, que são grandes geradores de receitas e, em especial, nas carteiras que englobam vários empreendimentos.