Título: Montadoras esperam desaquecimento
Autor: Marli Olmos
Fonte: Valor Econômico, 02/05/2005, RUMOS DA ECONOMIA, p. F36

Os dirigentes da indústria automobilística já percebem sinais de que o ritmo de atividade do setor, que começou a crescer nos últimos seis meses de 2004, tende a diminuir a partir do próximo semestre. Por conta, sobretudo, da valorização do real, a indústria e seus fornecedores de peças se preparam para reduzir volumes. Analistas concordam que "a luz amarela acendeu". "De um lado, o setor sofreu o impacto do aumento de matérias-primas, como o aço, e de outro, o câmbio despencou", assinala o presidente da Fiat Automóveis, Cledorvino Belini. A Fiat já reduziu de 120 mil para 90 mil a 100 mil a expectativa de volume de exportação de automóveis em 2005. "Estamos, ainda, preocupados com a proposta de reforma fiscal, que prevê a criação de um fundo para devolução de ICMS a ser cobrado na exportação e que poderá inviabilizar de vez as vendas externas", acrescenta Belini. Com base nas informações dos clientes dos fabricantes de autopeças, o presidente do Sindicato Nacional da Indústria de Componentes Automotivos (Sindipeças), Paulo Butori, também percebe sinais de que o ritmo das entregas pode cair no segundo semestre. "Até o fim de junho, está tudo bem", afirma Butori. Segundo o dirigente, a expectativa de queda a partir de então pode fazer com que o prognóstico dos dirigentes do setor, de chegar a mais um recorde de produção, de 2,3 milhões de veículos em 2005, não se confirme. "A exportação pode arrefecer", afirma. Com isso, diminui também a expectativa de investimentos no setor. Em meio a gargalos em áreas como fundição e forjaria, a indústria de autopeças começou a desengavetar neste ano investimentos em ampliação fabril. Cálculos do Sindipeças no primeiro trimestre indicavam que os investimentos do setor, que somaram US$ 600 milhões em 2004, poderiam alcançar entre US$ 960 milhões e US$ 1 bilhão em 2005. "Mas muita gente que estava em cima do muro já desistiu de investir por conta do cenário sombrio e também porque a rentabilidade já caiu", afirma Butori. Os dirigentes da indústria automotiva dizem que mesmo as exportações para a Europa estão prejudicadas pelo câmbio, porque a maior parte das empresas trabalhava com cotações de euro mais altas, acima dos valores estimados para o dólar, também mais elevados. O presidente da General Motors, Ray Young, também já disse que a empresa tende a reduzir os volumes de vendas para o exterior se o câmbio não mudar num prazo de três meses. No mercado doméstico, a situação, por enquanto, é mais tranqüila. Porém, a alta dos juros pode comprometer o quadro, não pelo efeito da taxa básica no valor do financiamento dos automóveis, mas pelo impacto que essa alta tem na confiança do consumidor. "Apesar de o mercado de veículos não trabalhar com os juros altos do resto do varejo, a conjuntura dessa alta abala a confiança do consumidor", destaca Belini, da Fiat. "Quase todo consumidor que ingressa pela primeira vez no mercado de veículos novos o faz por meio de financiamento", lembra analista Richard Jean Marie Dubois, da consultoria Trevisan. Para o economista, a confiança tem um grande efeito no mercado de automóveis. "Se alguém da família perde o emprego, o carro é a primeira compra adiada", destaca. Ele avalia o aumento das vendas internas de 10,5% em 2004 - 1,578 milhão de veículos - como resultado de demanda contida nos anos anteriores, em que as condições econômicas estavam piores. Para este ano, os dirigentes do setor mantêm a previsão de crescimento de 5%. "Não estamos ainda vendo sinais de que as vendas vão cair, mas as nuvens no horizonte estão carregadíssimas", destaca Dubois.