Título: Rodrigues defende a intensificação das negociações
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 02/05/2005, RUMOS DA ECONOMIA, p. F38

Duas lideranças do setor agropecuário, a pedido do Valor, encaminharam perguntas ao ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues. As principais preocupações de Pedro Camargo Neto, presidente da Associação Brasileira da Indústria Produtora e Exportadora de Carne Suína (Abipecs), e Antônio Ernesto de Salvo, presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), envolvem exportações e barreiras comerciais a produtos brasileiros. Veja abaixo as perguntas feitas ao ministro: Pedro de Camargo Neto: A Rússia é o principal destino das exportações de carne suína brasileira. Nas negociações de acessão deste país à Organização Mundial do Comércio (OMC), o Brasil está ficando em desvantagem ao serem oferecidas cotas especificas à União Européia, e o Brasil continuará disputando seu acesso nas quotas destinadas a "outros países". Como reverter este quadro que poderia prejudicar enormemente o setor no Brasil? Foto: Ruy Baron/Valor

Pedro de Camargo Neto Roberto Rodrigues: É um assunto delicadíssimo para nós. A Rússia negociou cotas de carnes com os Estados Unidos e a União Européia e nos excluiu das negociações. Isso nos deixou numa condição muito inferior. Ficamos numa posição aquém da nossa real capacidade de produção e fornecimento. A Rússia adotou um critério para calcular a cota usando justamente os anos em que tivemos uma participação pequena no mercado deles. Aumentamos muito o fornecimento nos últimos dois anos e o critério adotado foi prejudicial ao Brasil. Agora, eles escolheram isso e nos cabe negociar. Decidimos, na reunião da Câmara de Comércio Exterior (Camex) da semana passada, mandar uma missão conjunta do governo a Genebra para tentar a ampliação dessa cota insignificante. Pedro de Camargo Neto: O Japão é o maior mercado para carne suína do mundo. Como será aproveitada a viagem do presidente Lula para abertura deste mercado tão importante? Foto: Ruy Baron/Valor

Antônio Ernesto de Salvo Rodrigues: O assunto está na pauta. A ênfase da viagem do presidente Lula será no etanol, mas uma missão precursora avalia essas questões e verá no que é possível avançar. Estamos trabalhando para abrir o mercado japonês para todas as carnes, inclusive de suínos. Antônio Ernesto de Salvo: O senhor acredita que a paulatina queda das barreiras comerciais aos produtos brasileiros tende a aumentar de velocidade nos próximos anos ou, ao contrário, há que ter paciência porque é coisa de longo prazo? Rodrigues: O framework da OMC em 2004 desenha a queda de estímulos às exportações, de barreiras comerciais e a redução de mecanismos de apoio interno. Só que tudo no nível conceitual. Haverá uma reunião ministerial em Hong Kong, no fim deste ano, na qual espera-se um avanço substantivo em modalidades. Poderemos sair dos princípios para números concretos. Por isso, trabalhamos fortemente até a semana retrasada. A União Européia, que havia aceito os primeiros mecanismos de aproximação em modalidades, recuou no processo e pediu mais tempo para estudar. Isso não elimina a possibilidade de sucesso em Hong Kong, mas reduz o tempo de estudo para chegarmos até lá com uma condição adequada. Então, não sei qual será a capacidade da OMC de retomar esse assunto. O governo brasileiro continua otimista. Mas, por mais otimistas que sejamos, precisaremos cinco, seis ou até dez anos para aumentar concretamente o comércio. As negociações estabelecem reduções em prazos adequados, mas há um processo até que isso signifique aumento de mercado, por mais exitosas que sejam as negociações. As negociações na Alca e na UE-Mercosul, se forem efetivadas e positivas, são uma injeção na veia. É comércio imediato. Não podemos perder de vista que o grande cenário negocial é a OMC. Mas não podemos esperar resolver na OMC para depois avançar em outras negociações. Elas são igualmente relevantes. Também não podemos perder de vista as negociações bilaterais com outros países, como China, Rússia, África do Sul, México e Canadá, em que uma abertura de mercado pode significar uma grande conquista para nós. Antônio Ernesto de Salvo: O senhor acha que, para o setor primário, quando se deixa de considerar outros ganhos, houve benefícios no que diz respeito ao agronegócio brasileiro com a nossa integração com o Mercosul, especificamente, com a Argentina? Rodrigues: O Mercosul é uma necessidade política para os países do bloco. É um projeto ambicioso para chegarmos a um bloco sul-americano em três ou quatro anos. É uma referência política para o bloco, mas também para os países da América do Sul. É fundamental preservá-lo e garantir sua viabilização como um conjunto negociador na Alca, UE ou outras negociações. Até hoje, os resultados não foram satisfatórios. Seja porque sempre se estabeleceu um parâmetro de negociação com base na mínima demanda, seja porque têm havido momentos de desentrosamento dentro do bloco. Leia-se linha branca, eletroeletrônicos, setor automobilístico. Os resultados não têm sido os esperados. Mas é um processo que pode resultar em sucesso. Quando o setores privados se reúnem, negociam e encontram solução, é algo positivo. O bloco tem essa costura que transcende a negociação entre Mercosul com outros blocos e permite uma costura no seu interior, que pode ser alentadora no médio prazo.