Título: José Serra está de novo na estrada
Autor: César Felício
Fonte: Valor Econômico, 04/05/2005, Política, p. A8

O prefeito de São Paulo, José Serra, reestreou publicamente como presidenciável no sábado, em Gravatá, cidade de médio porte do agreste pernambucano. Oficialmente, tratava-se de um encontro de prefeitos e políticos do PSDB, promovido pelo Instituto Teotônio Vilella, para discutirem a gestão pública. Na prática, tornou-se mais um ato para 2006, da mesma forma como o será a solenidade promovida pelo partido hoje em Brasília para comemorar o quinto aniversário da Lei de Responsabilidade Fiscal e como foi ontem a participação do governador paulista Geraldo Alckmin em um fórum de debates em Porto Alegre. Em Gravatá, Serra foi citado por vários presentes como pré-candidato, ao lado de Alckmin, do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e do governador mineiro Aécio Neves. É a mesma quadra que deverá compor a mesa do evento de hoje. O senador Tasso Jereissati foi pouco lembrado. Serra lamentou a herança que recebeu da gestão petista, mas deu tons nacionais ao seu discurso, criticando a carga tributária e a política de juros altos. Ao ser perguntado sobre uma possível candidatura, não afirmou que é candidato apenas a fazer um bom governo no restante de seu mandato, o clichê usado como resposta-padrão por governantes na mesma situação. Esta foi a sua frase, transcrita pelo jornal "Folha de Pernambuco" em sua edição de segunda: "Fico honrado com o fato de ser lembrado. O partido tem excelentes nomes e não teremos dificuldades em escolher o nosso candidato, no momento oportuno". Um dos maiores aliados de Serra no PSDB, o deputado Eduardo Paes (RJ), apresentou uma proposta acabando com a necessidade de desincompatibilização para prefeitos ou governadores que desejarem disputar a Presidência, mas não há qualquer razão para supor que a iniciativa irá prosperar no Legislativo. Caso empolgue-se e empolgue o partido, Serra terá mesmo que renunciar com um ano e três meses de governo, entregando a prefeitura para o pefelista Gilberto Kassab, exatamente como prometeu não fazer durante a campanha eleitoral. Para observadores políticos de fora de São Paulo, o desgaste inevitável que Serra sofreria em seu reduto político não é um obstáculo intransponível, apesar de São Paulo representar cerca de 22% do eleitorado. Os outros 78% distribuídos no resto do país ficariam indiferentes ao fato. É difícil medir o tamanho do estrago de um gesto que seria inédito: nunca na história do país um prefeito de capital tornou-se candidato a presidente. Nos demais casos, em que se tenta saltar do governo municipal para o estadual ou do estadual para Brasília, a operação de renunciar a um mandato executivo para entrar em uma disputa maior foi bem sucedida. Dos 26 prefeitos e governadores que se atreveram a fazê-lo desde 1986, quinze conseguiram se eleger. Mas nos grandes centros a tradição é de fracassos retumbantes, quase todos com conseqüências sinistras para os protagonistas: Waldir Pires em 1989, Pimenta da Veiga em 1990, Tarso Genro e Jorge Roberto Silveira em 2002.

Se concorrer, prefeito será caso inédito na história

O caso de Waldir Pires, ministro da Controladoria Geral, é o mais emblemático. Ganhou o governo baiano em 1986 derrotando pela primeira vez a máquina de Antonio Carlos Magalhães. Para conseguir a vitória, teve que se compor com um político muito à sua direita, o vice Nilo Coelho. Passados dois anos, largou tudo para ser candidato a vice-presidente na chapa de Ulysses Guimarães. Por causa disso, o anticarlismo se desestruturou na Bahia e jamais voltou a vencer uma eleição para o governo do Estado. Em São Paulo, o último exemplo de político que abandonou um mandato no Executivo para concorrer a outro cargo majoritário ocorreu quando Serra tinha doze anos: em 1954, Jânio Quadros e seu vice Porfírio da Paz renunciaram à Prefeitura de São Paulo para tornarem-se governador e vice. Novas eleições tiveram que ser realizadas na capital do Estado, mas isto não afetou a vitória de Jânio na eleição estadual e sua trajetória ascendente até a última renúncia, bem mais marcante, seis anos depois. Ponto fundamental para motivar o prefeito poderá ser a permanência ou não da regra que proíbe a verticalização das coligações. Caso o PT tenha sucesso em sua estratégia de obstruir a emenda constitucional que acaba com a regra, o PSDB paulista colhe dividendos. As chances de partidos como o PMDB e o PP, movidos pelas situações regionais, aliarem-se ao PT para reeleger Lula baixam a quase zero. A tendência destas forças será pela candidatura própria ou por não ter candidato. É um dado que favorece a eleição presidencial em dois turnos e torna menor o risco da aventura presidencial, seja por quem abriria mão de coordenar a própria sucessão, como Alckmin, seja por quem renunciaria a um mandato quase inteiro, como o prefeito.