Título: De volta aos 20 mil?
Autor: Felipe Frisch e Flavia Lima
Fonte: Valor Econômico, 04/05/2005, EU &, p. D1

A queda de 13,6% do Índice Bovespa nos últimos dois meses tem deixado analistas e especialmente investidores apreensivos sobre o destino do mercado de ações. Após encerrar o dia ontem a 24.715 pontos, há quem já se pergunte se o destino do índice é a volta aos 20.000 pontos, registrados em meados do ano passado. Nos dois primeiros pregões de maio, a queda já é de 0,51%. O que parece estar dando mesmo o tom da queda da bolsa são os dados da economia americana. Mas sair agora da bolsa, para quem se manteve no barco até agora, pode significar realizar vultosos prejuízos, alerta Walter Mendes, superintendente de renda variável do Itaú. Apesar do predominante movimento de saída, ele e outros analistas ainda estão otimistas com a bolsa até o fim do ano e acreditam que o Ibovespa pode ultrapassar 30.000 pontos. Um estudo da consultoria Economática realizado a pedido do Valor mostra que 40 ações das 55 que compõem a carteira teórica atual do Ibovespa - já incluindo Unibanco Unit e Gerdau Metalúrgica PN - estão em queda no ano. Destas, 30 estão perdendo mais que o Ibovespa, em queda de 5,70% até a segunda-feira. Em 12 meses, no entanto, o índice acumula alta de 26%. Entre os destaques de alta, mesmo em períodos turbulentos, estão as ações do setor bancário, além de empresas elétricas que podem ser beneficiadas pelos próximos leilões de energia. Mendes, do Itaú, acredita que o Ibovespa esteja entre 30.000 e 33.000 pontos em dezembro. Para ele, prova de que a volatilidade não se justifica é que só está presente na bolsa e não no mercado de juros ou de dólar, que só cai. Ele destaca como potenciais ganhadores os setores de petroquímica, mineração e mesmo a siderurgia, especialmente com o início da safra de resultados do primeiro trimestre. "Na petroquímica, a Copesul veio muito bem, mesmo com o mercado pessimista, e a siderurgia está vindo alinhada com as expectativas", diz. Segundo ele, para justificar as recentes quedas nas ações das mineradoras, seria preciso estar num período de recessão internacional muito forte, que derrubaria a demanda no ano que vem, uma vez que os preços acordados com as siderúrgicas são válidos por 12 meses. No ano, as ações PNA da Vale caem 6,83% e as da sua controlada Caemi, 12,82%. A aposta setorial é semelhante à de Jorge Simino, sócio da MS Consult, que ainda vê chances de ganhos no setor de papel e celulose. "A taxa de câmbio baixa incomoda um pouco, mas é um mercado que está em tendência de recuperação lá fora", avalia. "E eu não consigo imaginar o dólar a R$ 2,30", diz o consultor. Ele projeta o Ibovespa em 32.000 pontos no fim do ano, mas avalia que a volatilidade ainda deve prevalecer nos próximos quatro meses, por conta da apreensão com relação aos juros americanos e brasileiros. "Abril foi ruim para as bolsas lá fora também." A aposta de queda dos juros no segundo semestre é o principal gatilho a impulsionar a bolsa, diz o diretor de Renda Variável da Unibanco Asset Management, Pedro Bastos, que trabalha com a Selic fechando o ano a 17,25%. Um pouco menos otimista, o superintendente de gestão da Santander Banespa Asset Management, Marcio Appel, acredita que os juros básicos devem sofrer mais duas altas de 0,25 ponto percentual, para 20%, nas próximas reuniões do Comitê de Política Monetária (Copom), com estabilidade no segundo semestre. Esse aperto, no entanto, viria como resposta a uma inflação de demanda, o que seria positivo para as empresas. "Até o fim do ano, a bolsa deve remunerar mais do que os juros, compensando o risco", diz Appel, que também considera 32.000 pontos em dezembro. Na SulAmérica Investimentos, as expectativas de alta para o Ibovespa foram reduzidas de 31.500 para 29.500 pontos, o que representa um potencial de ganhos menor, ao redor de 20%. Uma projeção maior para o risco-país e o conseqüente aumento da taxa de desconto usada para calcular o preço justo das ações explicam o desempenho, diz o estrategista-chefe Paulo de Sá Pereira. A recuperação esperada poderia ser ameaçado por turbulências nos mercados internacionais, com destaque para o de crédito americano. Appel diz que uma piora no risco dos títulos corporativos americanos afetaria os títulos globais, em especial de emergentes. Nesse ambiente de maior aversão ao risco, haveria uma provável queda das bolsas, sem chances de volta dos investidores estrangeiros. No ano, o saldo de estrangeiros na Bovespa está em R$ 953 milhões até 28 de abril, depois de atingir R$ 4,2 bilhões em fevereiro. O rebaixamento dos créditos americanos, diz, só não atingiria quem estivesse acima desse mercado, o que não é o caso do Brasil. Considerando esse quadro pouco provável, porém, Appel, do Santander, acredita que merecem a atenção dos investidores as ações da Telemar e da Vale do Rio Doce, cujos preços estariam subestimados. No caso da Vale, por exemplo, embora a valorização do real tenha impacto sobre a receita em dólares, Appel lembra que o reajuste do preço do minério cobre com folga os possíveis estragos. Além das mineradoras, Bastos, da UAM, cita o setor de bancos e o de varejo entre aqueles com maior potencial. Segundo ele, a demanda cativa da Ásia pela produção das mineradoras nos próximos três anos sustenta as projeções. Já o varejo deve ser beneficiado pela recuperação da renda. Com relação às exportadoras, ele reconhece que a valorização do real pode interferir de modo negativo no resultado das empresas, mas ressalta que a produtividade também merece atenção. Neste sentido, diz, a Vale seria a grande aposta de recuperação porque se beneficia dos contratos de longo prazo. Em 2005, até 2 de maio, as ações ON da Vale perderam 8,52%. Pereira, da SulAmérica, destaca ainda os setores de petróleo e algumas siderúrgicas, como Usiminas. "É o momento perfeito para se aproveitar da irracionalidade do mercado e se posicionar em ações com bons fundamentos", diz. Bastos, da UAM, é outro que recomenda aos investidores que estão em bolsa que fiquem. "A venda não é de maneira nenhuma indicada, basta lembrar que o Brasil está a caminho do 'investment grade' no médio prazo." Para aqueles que estão pensando em apostar suas fichas na bolsa, os gestores são mais comedidos. "Para aqueles que estão pensando em entrar, isso só vale quando a percepção de início de queda dos juros for mais clara", diz Pereira. Os investidores pessoa física podem ter maior dificuldade em saber o momento certo de entrar no mercado acionário. Para esses, diz Appel, do Santander, a entrada é válida se o horizonte de investimento for de cinco a dez anos. "Do contrário, o melhor mesmo é um multimercado, que coloca nas mãos do gestor as decisões de aplicar".