Título: Primeiro escalão investigado
Autor: Campos, Ana Maria
Fonte: Correio Braziliense, 08/03/2010, Política no DF, p. 32

Secretário de Desenvolvimento Econômico é alvo de interceptações telefônicas da Operação Tellus, do Ministério Público, que apura um suposto pagamento de propina por empresários beneficiados pelo Pró-DF

Amaral disse que nunca lidou diretamente com a questão da liberação dos benefícios do Pró-DF: ¿Também não fizemos indicações pontuais de áreas¿

Ao investigar indícios de irregularidades no Pró-DF, o programa do Governo do Distrito Federal de incentivos para instalação de empresas, a Polícia Civil e o Ministério Público esbarraram em integrantes do primeiro escalão da Secretaria de Desenvolvimento Econômico e Turismo, entre os quais o atual titular da pasta, Adriano Amaral, e o ex-assessor especial Fábio de Carvalho, presidente do Sindicato do Comércio Atacadista do DF (Sindiatacadista). Eles foram alvo de interceptações telefônicas da Operação Tellus, uma das investigações policiais que teriam sofrido abalos por causa de vazamentos de informações privilegiadas.

No curso da Operação Tellus(1), entre setembro e outubro do ano passado, houve mudanças no comando da Secretaria de Desenvolvimento Econômico e Turismo. Então secretário-adjunto da pasta, Adriano Amaral tornou-se o primeiro na estrutura administrativa da secretaria. O então vice-governador Paulo Octávio deixou o cargo de secretário que exercia desde o primeiro dia do governo e o senador Adelmir Santana (DEM-DF) chegou a ser convidado para substitui-lo. O senador não aceitou o convite e Amaral foi promovido a titular. Por causa dessa alteração, o inquérito quase sofreu um revés.

Policiais da Divisão Especial de Crimes contra a Administração Pública (Decap), encarregados do caso, defenderam a tese de que Amaral não poderia mais ser investigado porque ganhara foro especial no Tribunal de Justiça do Distrito Federal. Dessa forma, qualquer diligência teria de ser submetida ao crivo de um desembargador e da procuradoria-geral de Justiça do DF. Os promotores do Núcleo de Combate às Organizações Criminosas (NCOC) do Ministério Público do DF também perderiam a competência para coordenar as investigações. Eles, no entanto, defendiam que as escutas deveriam continuar porque foram autorizadas num momento anterior.

As investigações ainda não foram concluídas, mas não houve prorrogação das escutas telefônicas porque o Ministério Público considerou que, com vazamento de informações da Operação Tellus, não havia mais motivo para dar prosseguimento no monitoramento. Na mesma ocasião da investigação, Fábio de Carvalho deixou o cargo de assessor especial do então vice-governador Paulo Octávio. Ele vinha colaborando com a gestão desde a campanha. Em sua casa, no Lago Sul, houve reuniões de empresários durante a corrida eleitoral de 2006, da qual participaram o hoje governador afastado e preso, José Roberto Arruda, e Paulo Octávio. Com a eleição, Carvalho se afastou de seus negócios e assumiu o cargo na secretaria. Com a saída do governo em outubro do ano passado, o empresário reassumiu a presidência do Sindiatacadista.

A interferência de integrantes do primeiro escalão do Executivo em inquéritos policiais está sob investigação no Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), conforme mostrou ontem reportagem do Correio. Segundo entrevista do ex-diretor do Departamento de Atividades Especiais (Depate) Celso Ferro, a Polícia Civil tem o hábito de informar ao governador do DF a abertura de investigações sensíveis, envolvendo autoridades públicas e políticas. Celso Ferro ocupou o cargo estratégico na Polícia Civil durante todo o governo anterior, de Joaquim Roriz, hoje no PSC, até março do ano passado. Ferro, no entanto, sustenta que policiais civis não se submetem a interferências políticas.

De saída O secretário de Desenvolvimento Econômico, Adriano Amaral, disse ontem ao Correio que nunca teve conhecimento de que foi alvo de interceptações telefônicas. Ele afirma que não lidava diretamente com a liberação de incentivos para o Pró-DF e acredita que na gestão atual houve, na verdade, uma moralização do programa. ¿Encontramos muitas distorções, como, por exemplo, acabar com a liberação de terrenos no Plano Piloto, onde pode haver mais valorização imobiliária. Também concentramos o programa em áreas de desenvolvimento econômico. Na verdade, moralizamos o Pró-DF¿, explicou. ¿O grande grosso das negociatas ocorria no Plano Piloto¿, afirmou. ¿Também não fizemos indicações pontuais de áreas, grande potencial para distorções¿, acrescentou.

Com um vasto currículo na área de economia e administração pública, Adriano Amaral foi convidado por Paulo Octávio para participar do governo de transição, logo depois da vitória eleitoral de 2006. Ele ajudou a elaborar a reestruturação administrativa do governo, com a redução do número de secretarias. Na semana passada, segundo informou ontem ao Correio, Amaral comunicou ao governador em exercício, Wilson Lima (PR), que pretende deixar o governo. Fábio de Carvalho não foi localizado pela reportagem. De acordo com Adriano Amaral, Carvalho deixou o governo no ano passado para participar da disputa pela presidência da Federação do Comércio do Distrito Federal (Fecomércio).

1 - Propina A Operação Tellus apurava suposta cobrança de propina por parte de empresários que pretendiam adquirir terrenos com desconto, um dos principais incentivos oferecidos pelo Pró-DF, a integrantes do governo responsáveis pelo programa. Houve denúncias de que empresários eram obrigados a pagar suborno para ter o pedido de incentivo liberado pela Secretaria de Desenvolvimento Econômico, mesmo quando atendiam a todos os critérios exigidos pelo GDF.

Encontramos muitas distorções, como, por exemplo, acabar com a liberação de terrenos no Plano Piloto, onde pode haver mais valorização imobiliária. Na verdade, moralizamos o Pró-DF¿

Adriano Amaral, secretário de Desenvolvimento Econômico

Efeitos do diabetes

Noelle Oliveira

Viola Júnior/Esp. CB/D.A Press Bouza esteve ontem na prisão com Arruda, que reclamou de inchaço em um dos pés: efeitos do diabetes

Após 25 dias de prisão, o governador afastado e preso, José Roberto Arruda (sem partido), apresenta complicações em seu estado de saúde. De acordo com informações do advogado Thiago Bouza, que visitou Arruda no fim da tarde de ontem na Superintendência Regional da Polícia Federal, um dos pés de seu cliente estaria bastante inchado devido ao quadro de diabetes apresentado pelo governador. Bouza afirmou que Arruda reclamou do incômodo, mas não informou se estava sentindo dores.

De acordo com o advogado, a única informação que a defesa tem a respeito dos cuidados de saúde que Arruda estaria recebendo, diz respeito ao atendimento de um cardiologista. Anteriormente, a Polícia Federal já havia informado que o governador é examinado diariamente por médicos, que medem a pressão e verificam se ele necessita de algum cuidado especial. Na última terça-feira, após visitar Arruda na condição de amigo pessoal, o deputado distrital Raimundo Ribeiro (PSDB) informou que o governador sentiu por tonturas por três vezes, mas que não teria sido autorizada a consulta do médico pessoal. No final do mês passado, Arruda também teria sofrido uma queda de pressão.

Além do advogado, Arruda recebeu, como de costume, a visita da mulher, Flávia, que chegou à PF para levar o almoço do marido às 12h36. A primeira-dama estava em um Fox vermelho, acompanhada por duas mulheres. Flávia Arruda permaneceu no local até as 13h34 e saiu sem falar com a imprensa.

Enquanto isso, no gramado da PF, um manifestante mantinha um protesto solitário, que começou no sábado, em apoio ao governador afastado. O aposentado José Lopes Vieira, 72 anos, retornou por volta das 10h de ontem ao local e estendeu faixas com dizeres de apoio à Arruda e tecidos verdes. Morador de Santa Maria, ele passou os dias do fim de semana acampado ao lado de cartazes com os dizeres ¿Fica Arruda¿ e de uma bandeira do Brasil. ¿O tempo vai mostrar como é errado o que estão fazendo com ele, é uma situação muito injusta¿, afirmou.

O número 25 dias Período em que o governador afastado, José Roberto Arruda, está detido na Polícia Federal

Pedido de reunião

O deputado distrital Batista das Cooperativas (PRP) não quer assumir sozinho a responsabilidade pela notificação do governador afastado e preso, José Roberto Arruda (sem partido), na Superintendência da Polícia Federal sobre a abertura de processo de impeachment. Primeiro-secretário da Mesa Diretora, Batista pediu uma reunião com os demais colegas que fazem parte do comando da Câmara Legislativa ¿ Cabo Patrício (PT), Raimundo Ribeiro (PSDB) e Milton Barbosa (PSDB) ¿ para sair de lá com a deliberação sobre qual procedimento será adotado.

Na última sexta-feira, Batista esteve com Arruda para entregar a notificação. Mas o governador afastado se recusou a receber. Sem a intimação da abertura do processo, o prazo de tramitação para a apresentação da defesa não começa a correr. Arruda ainda reagiu à orientação dada pelo procurador-geral da Câmara Legislativa, Fernando Nazaré, segundo o qual a assinatura de duas testemunhas, por exemplo, dois policiais federais, bastariam para dar o governador como intimado. Arruda não gostou e chegou a se exaltar com o procurador, que é servidor concursado da Câmara, chamando-o de ¿capacho do PT¿. Arruda alega que não pode apresentar defesa prévia sem o conteúdo integral do inquérito nº 650, em curso no Superior Tribunal de Justiça (STJ), a base de todas as denúncias contra ele por corrupção.

Crime O presidente em exercício da Câmara Legislativa, Cabo Patrício (PT), confirma que a Mesa Diretora vai se reunir hoje, mas garante que a questão da notificação não será tratada. Ele afirma que não há dúvidas porque a lei que trata do crime de responsabilidade estabelece que o primeiro-secretário atue como oficial de Justiça nesse caso. ¿É um direito dele (Arruda) não receber, mas Batista das Cooperativas tem de cumprir a lei. Se ele não recebe, chame duas testemunhas e pronto. Ao não notificar o governador na sexta, Batista humilhou o Poder Legislativo¿, disse Patrício.

Integrante da Comissão Especial que trata do impeachment, o deputado Chico Leite (PT) explica que a notificação tem como objetivo avisar ao investigado de que ele deverá apresentar defesa. Mas segundo o petista a lei não trata como essencial a análise de uma defesa prévia. Apenas na segunda etapa do processo, quando é formado um tribunal especial para julgar o caso, a defesa é obrigatória. Caso o investigado não a apresente no prazo, é nomeado um advogado ad hoc para defendê-lo no processo. (AMC)