Título: Demanda em alta eleva em 20% frete de cabotagem no AM
Autor: Francisco Góes
Fonte: Valor Econômico, 14/10/2004, Especial, p. E-2

Com proximidade do Natal, indústrias de Manaus disputam espaço em navios para escoar produtos

A proximidade do fim de ano deixa gerentes de logística das empresas do Pólo Industrial de Manaus (PIM) à beira de um ataque de nervos. De outubro a dezembro, a oferta de fretes rodoviários escasseia na capital do Amazonas por força da demanda do Natal e Ano Novo. Na cabotagem - o transporte de cargas entre os portos -, a situação não é diferente. Os navios lotam e as empresas de navegação são obrigadas a dividir o espaço nas embarcações entre os clientes, limitando o número de contêineres por fabricante. Este ano, o aumento do preço do frete da cabotagem para as empresas do pólo já chega a 20%. "E é preciso ficar atento senão vira o último da fila", observa Vitor Gatto, gerente de logística da Panasonic da Amazônia, fabricante de eletroeletrônicos. A Panasonic usa a cabotagem para escoar 30% de suas vendas destinadas ao mercado doméstico. Para os outros 70%, a empresa utiliza o rodo-fluvial, meio de transporte que é uma alternativa ao fato de Manaus não ter estradas que façam a ligação direta com os grandes centros, como São Paulo e Rio. O sistema rodo-fluvial consiste em colocar carretas em cima de barcaças que saem de Manaus e navegam pelo rio Amazonas até Belém, no Pará, em trajeto de cerca de 1,6 mil quilômetros. De Belém, a carga segue por rodovia até São Paulo. A viagem toda leva, em média, onze dias. Mas pode durar nove se a empresa optar pelo serviço rodo-rápido, em que dois caminhoneiros se revezam ao volante. Na cabotagem, a mesma viagem dura cerca de duas semanas. Para as empresas do pólo de Manaus, sobretudo as do segmento eletroeletrônico, a logística tem papel fundamental na competitividade. A economia com transporte, assim como os incentivos fiscais, são os grandes diferenciais da concorrência, já que nas outras etapas do processo de produção as condições de competitividade são parecidas (os fornecedores de insumos e matérias primas, por exemplo, costumam ser os mesmos para os fabricantes do pólo). O uso de navios de contêineres para transportar eletroeletrônicos, bicicletas, motocicletas e garrafas PET, entre outros produtos, vem se consolidando como alternativa logística entre as empresas do PIM. "A idéia da empresa é crescer na cabotagem", diz Gatto, da Panasonic. Apesar de mais indústrias aderirem à cabotagem comparativamente há cinco anos, quando o sistema voltou a ganhar força no país, ainda existem dificuldades. O limite de espaço nas embarcações e os preços dos fretes marítimos ascendentes podem criar conflitos entre os clientes e as empresas de navegação quando estas tentam impor aumentos nos fretes sem negociação, reclamam os usuários da cabotagem. O uso de navios para o transporte de mercadorias depende de fatores como a capacidade de estocagem do fabricante, das características do produto e da pressa do cliente em receber a carga. A cabotagem oferece maior segurança e baixos índices de avaria da carga em relação ao transporte rodoviário. Em compensação, é um sistema mais demorado e muitas vezes o cliente não está disposto a esperar. Também há consenso que a cabotagem só é válida para distâncias marítimas superiores a 1,5 mil quilômetros e, em terra, de até 400 quilômetros entre o porto e o cliente. Em Manaus, as empresas do pólo contam com um serviço de cabotagem semanal, oferecido pela Aliança Navegação e Logística, e outro quinzenal, prestado pela Mercosul Line. A P&O Nedlyoyd, controladora da Mercosul Line, também escala Manaus com o navio que faz a rota para a Ásia, passando pelo Caribe. Esse serviço é importante para atender às necessidades de importação das empresas do pólo. Além disso, há em Manaus apenas meia dúzia de grandes empresas que fazem o serviço rodo-fluvial. A baixa concorrência deixa as empresas do pólo com poucas escolhas diante da pressão por reajustes no frete. Apesar do aumento nos fretes marítimos, a estimativa é que os fretes da cabotagem ainda são, em média, entre 15% e 20% mais baratos do que o transporte rodoviário, mas essa diferença já foi de até 40%. Há dois argumentos básicos usados pelas empresas de navegação para aumentar os preços dos fretes: as disparadas do bunker (o óleo pesado usado na navegação) e do hire (o aluguel dos navios) no mercado internacional. O bunker, ofertado hoje em Santos, situa-se na faixa de US$ 213 por tonelada, com alta de cerca de 25% em dólar em relação a um ano atrás. Já o hire para um navio de contêineres de 1.600 TEUs (contêiner equivalente a 20 pés) subiu 155% desde o início do ano passado, alcançando US$ 23 mil por dia. Outro fator apontado pelos armadores é o aumento dos custos portuários, diz Mathias Stäubli, gerente de marketing da Aliança Navegação. Stäubli diz que os grandes clientes da cabotagem têm contratos de longo prazo e condições de negociar os preços dos fretes. O diretor-geral da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), Carlos Alberto Wanderley Nóbrega, avalia que o Brasil passa hoje por período de aquecimento dos fretes, resultante da conjuntura internacional. "Não temos registros de abusos", pondera Nóbrega. "A cabotagem cresce mais rápido do que o ritmo de incorporação de novos navios à frota", acrescenta João Francisco Fernandes, gerente de logística da Rigesa do Nordeste. O resultado é que os navios que operam na cabotagem navegam quase sempre lotados, sobretudo no trajeto Sul-Norte, o que contribui para manter os fretes elevados. A Rigesa embarca cerca de 100 contêineres por mês em São Francisco do Sul (SC) com papel liner, usado em embalagens de papelão. Ele segue até Fortaleza (CE), onde a Rigesa tem fábrica para abastecer as regiões Norte e Nordeste. O gerente da Aliança em Manaus, Jorge Nassar, diz que a estratégia da empresa, para aumentar a oferta da cabotagem, é escalar navios de maior capacidade e oferecer a clientes do Sul e Sudeste a possibilidade de embarcar cargas fracionadas para Manaus. Este serviço consiste em encher um contêiner com cargas de diferentes clientes que, sozinhos, não teriam condições de preencher um TEU. Controlada pela alemã Hamburg Süd, a Aliança tem cerca de 600 clientes de cabotagem, dos quais mais de 100 em Manaus. A Innova, fabricante de resinas do pólo petroquímico de Triunfo (RS), embarca entre 50 e 100 contêineres por mês com poliestireno em Rio Grande (RS) para Manaus. "Estamos analisando voltar a usar navios para o Nordeste, o que depende de viabilizar armazenagem naquela região", diz Marcelo Calil Bianchi, diretor comercial da Innova.