Título: Produtores agrícolas comemoram resultado
Autor: Raquel Landim
Fonte: Valor Econômico, 05/05/2005, Especial, p. A16

O agronegócio brasileiro festejou ontem os resultados obtidos pelo país na reunião mini-ministerial da Organização Mundial de Comércio, que ocorreu em Paris. Para especialistas e representantes do setor, a negociação agrícola está atrasada, mas ainda é possível obter um resultado satisfatório na próxima reunião que reunirá os 143 países-membros da OMC em Hong Kong, de 13 a 18 de dezembro. "Conseguimos chegar perto do representa a realidade de preços do mercado internacional", afirma André Nassar, diretor-executivo do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Icone), entidade financiada por associações agrícolas do Brasil, que assessorou o Itamaraty na elaboração de estudos técnicos. Os países fecharam um acordo ontem sobre uma questão técnica que estava travando toda a negociação agrícola: a conversão das tarifas específicas, estabelecidas em dólar ou em euro, em tarifas "ad valorem", expressas em porcentagem. Os países ricos utilizam várias tarifas específicas, que mascaram o protecionismo. A solução desse problema é importante. Os países já acertaram que haverá faixas diferentes para os cortes das tarifas de importação, uma tentativa de reduzir exorbitantes tarifas cobradas para alguns produtos. Por isso, quanto mais alta a tarifa de importação estabelecida nessa fase de conversão de valores em porcentagem, mais profundo será o corte no final da Rodada Doha. Simulações do Icone demonstram que a balança pendeu para o lado do Brasil. O instituto analisou as tarifas da União Européia para as importações de carne de frango, carne bovina e açúcar - três produtos que interessam aos exportadores brasileiros. A UE é o maior importador de produtos agrícolas do Brasil e resistiu a um acordo até o último momento. Os europeus aplicam tarifa específica de 1.024 euros por tonelada para a importação de cortes desossados congelados de frango. Se a conversão fosse realizada com base nos preços de importação da UE, a tarifa "ad valorem" seria de 46%. Baseada nos preços internacionais, chegaria a 116%. Já o acordo fechado ontem permite uma tarifa de 91%. O acordo prevê que o preço utilizado no cálculo será uma ponderação de 82,5% do preço internacional e 17,5% do preço do importador. Na carne bovina, os exportadores também levaram vantagem. A UE aplica taxa de importação de 12,8% mais uma tarifa específica de 3.040 euros por tonelada para o corte desossado congelado de carne bovina. Os preços da UE permitiriam tarifa total de 101%, os preços internacionais apontariam para 156%, e o acordo estabelece 142%. A maior vitória do Brasil foi obtida no açúcar. A UE impõe uma tarifa específica de 419 euros por tonelada para o produto. Com base nos preços praticados no bloco, a taxa seria de 65%. Mas, no açúcar, os exportadores conseguiram que fosse utilizado somente o preço internacional, o que eleva a tarifa para 186%, deixando claro o tamanho da proteção européia. Nassar explica que só foi possível este acerto porque a UE estabelece um preço mínimo para a importação de açúcar de suas ex-colônias, ou seja, totalmente distorcido do mercado externo. Desde o início da negociação, Brasil e Austrália afirmaram que não abririam mão do açúcar. "Não é o acordo ideal, nós queríamos 100% de preço internacional, mas foi importante para destravar a negociação", afirma Antônio Donizeti Beraldo, chefe do departamento de comércio exterior da Confederação Nacional de Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). Para o setor privado, os países perderam muito tempo, cerca de dois meses, nessa questão técnica. Na próxima semana de discussões agrícolas em Genebra no início de julho, começará a discussão de que fórmula será utilizada para cortar as tarifas agrícolas. - outro assunto extremamente complexo. Para Nassar, outra briga dos países em desenvolvimento será a definição dos produtos sensíveis, que ficarão de fora da negociação. A UE tentará incluir entre os sensíveis açúcar, carne bovina e carne de frango, anulando os ganhos do Brasil nessa fase do jogo. O país, por sua vez, tentará reduzir o número de produtos considerados sensíveis, obrigando os europeus a escolher quais setores querem proteger.