Título: Eficiência cresce na Saúde, mas o controle é precário
Autor: César Felício e Cristiane Agostine
Fonte: Valor Econômico, 09/05/2005, Especial, p. A12

A área da saúde foi a pioneira nos contratos de gestão entre o governo estadual e instituições privadas. As organizações sociais estão em funcionamento desde 1998 e são responsáveis pela administração de 16 hospitais. Sob a gestão direta do Estado estão outros 44. "É uma modalidade na relação público-privado para fazer a gestão de equipamentos", resume o professor de medicina da Universidade de São Paulo (USP), Paulo Elias. Presidente do Centro de Estudos de Cultura Contemporânea (Cedec), Elias vê bons resultados no modelo e analisa a estrutura do contrato de gestão: "É uma transferência parcial que dá autonomia administrativa, mas que, ao mesmo tempo, não transfere a formulação de políticas públicas." No governo paulista, o pontapé inicial para os contratos de gestão foram 15 esqueletos de hospitais herdados pelo ex-governador Mario Covas, em 1998. Diferentemente dos hospitais comuns, aqueles administrados por uma organização social não fazem concurso público para escolher os funcionários, não têm conselhos gestores, nem realizam licitação para a compra de materiais e execução de serviços. O governo repassa todo mês recursos para pagar os serviços prestados e os funcionários. Mas no balanço orçamentário, os servidores não estão incluídos no item de pagamento de pessoal, que é controlado pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Os hospitais com contratos de gestão têm que cumprir metas de prestação de serviço, mas a fiscalização do Estado sofre críticas. "O sistema de controle ainda é um problema. O governo tem dificuldade de controlar o preço, a qualidade", relata o especialista em administração pública, Valeriano Costa. O relatório do Tribunal de Contas do Estado de 2003 traz ressalvas na gestão realizada pelas organizações e destacou o volume de endividamento das entidades e a falta de controle para remédios de alto custo. Os conselhos gestores, uma das formas de fiscalização direta da população, não foram instalados nesses hospitais. Professor do Departamento de Ciência Política da Unicamp, Costa alerta que os contratos feitos pelas entidades podem ter custos mais altos. Os recursos são repassados diretamente às organizações sociais, que decidem livremente como gastá-los. Com a liberalização dos serviços, o governo corre o risco de perder, a longo prazo, a capacidade de organização e controle dos serviços, que passa a terceiros. "As empresas vão controlar o planejamento, vão ter mais conhecimento que o próprio Estado sobre essas áreas. Isso pode gerar uma inversão no controle. O Estado vai ter menos informações sobre a gestão do que as organizações e estas podem aumentar seu poder. Em vez de qualificar a administração direta, fazem uma qualificação por fora, como se criassem grupos paralelos de funcionários públicos." O governo garante que ao transferir parte da responsabilidade sobre a gestão obtém melhores serviços de saúde e maior autonomia gerencial. O coordenador dos serviços de saúde da Secretaria da Saúde, Marcio Cidade Gomes, ressalta o êxito da experiência no Estado. "Com os mesmos recursos, esses hospitais têm produtividade maior. São grupos privados que conseguem ter a agilidade que o setor público não tem". Gomes não afasta a hipótese de que os novos hospitais construídos passem por esse modelo de gestão, mas ressalva que "nem tudo se resolverá por meio das organizações sociais". Cada hospital é administrado por um grupo, sem fins lucrativos. A escolha dos grupos é feita pela Secretaria, após convocação pública. Para se inscrever, as instituições têm de ter no mínimo cinco anos de experiência na área. Mas a presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Saúde (Sindisaúde), Célia Regina Costa, reclama de favorecimento nas escolhas. "Com esse modelo, o governo entrega a administração para parceiros". As entidades atuantes têm tradição na área de saúde pública, como a Associação Congregação de Santa Catarina e a Casa de Saúde de Santa Marcelina. Outras são ligadas a faculdades, como a Fundação do ABC e a USP. Há também a entidade do Serviço Social da Indústria da Construção e do Mobiliário do Estado de São Paulo (Seconci). Os defensores do modelo o diferenciam do problemático de repasse dos serviços de saúde a terceiros que ocorreu durante a administração de Paulo Maluf na Prefeitura de São Paulo. O projeto do Plano de Atendimento à Saúde (PAS) previa a autogestão e transferiu, por meio de convênios, o controle dos hospitais a cooperativas de médicos, que assumiram a direção, execução e prestação de serviços públicos de saúde à população. "No caso do PAS, o governo municipal não dava formalmente o comando às cooperativas, mas o que acabou acontecendo é que cada grupo passou a controlar o hospital onde estava", lembra Elias.(C.A.)