Título: Câmbio põe exportação de software em xeque
Autor: Ricardo Cesar
Fonte: Valor Econômico, 09/05/2005, Empresas &, p. B3

O coro de empresas lamentando a valorização do real frente ao dólar ganhou mais um integrante: a área de software. O setor, que historicamente foi voltado a atender a demanda doméstica - de 1984 a 1992 o Brasil viveu uma reserva de mercado de produtos de informática que limitou a competição de multinacionais -, passou a olhar com interesse para a exportação nos últimos anos. A tendência ganhou fôlego extra em 2004, quando o software foi incluído na política industrial do governo Lula e o ministro Luiz Fernando Furlan, do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, fixou a meta de exportar US$ 2 bilhões em programas de computador em 2007. Mas a maioria dos empresários do setor que recentemente criaram ou ampliaram seus planos de exportação calculou um dólar médio entre R$ 2,70 e R$ 3. Nos últimos dias, com a moeda americana cotada abaixo de R$ 2,50, o segmento ficou em alerta. A valorização cambial cria duas situações delicadas. Nos contratos em vigência, que tipicamente são pagos mensalmente em dólares, as margens ficam comprometidas e já há casos em que as desenvolvedoras de sistemas estão trabalhando no vermelho. Na disputa por novos negócios, as companhias brasileiras perdem competitividade contra rivais de países como Índia e China. "Já estou no limiar de trabalhar de graça em alguns projetos internacionais", afirma Marco Antonio Stefanini, presidente da Stefanini IT Solutions, que no ano passado obteve 15% de sua receita de R$ 210 milhões no exterior. "Ao manter os investimentos para crescer fora do país com o real neste patamar estou, na verdade, comprando participação no mercado externo", diz Mauricio Minas, vice-presidente sênior da integradora CPM, que investe para vender software nos Estados Unidos. "Conseguimos suportar só até o segundo semestre." O executivo afirma que houve uma inversão: com o dólar perto de R$ 3, vender no exterior era mais vantajoso. Se o atual patamar se sustentar, o mercado interno volta a ser mais atraente. A principal preocupação dos empresários é a manutenção do real abaixo de R$ 2,50 por um período prolongado. A maioria dos contratos para desenvolvimento de software é de longo prazo e as companhias nacionais enfrentam dificuldade de renegociação, já que o cliente externo não aceita um indexador cambial. Stefanini afirma que as empresas que desenvolvem software no Brasil para venda no exterior operam com margens baixas, em torno de 10%, na média. Pagar os programadores é o principal custo da atividade e a remuneração é fixada em reais. Para o coordenador adjunto da Associação para a Promoção da Excelência do Software Brasileiro (Softex), Djalma Petit, a apreciação do câmbio é ruim pois ocorre exatamente quando as empresas brasileiras do setor iniciam um grande esforço de inserção internacional. Apesar do sinal de alerta, as companhias ainda mantêm o cronograma de investimentos para atingir o mercado externo. "O dólar a R$ 2,50 significa uma redução de margem que incomoda, mas não nos tira do mercado internacional. Apenas teremos que apertar mais os custos para nos tornarmos competitivos", afirma Edson Pagano, diretor executivo da subsidiária brasileira da T-Systems. O presidente da subsidiária nacional da EDS, Chu Tung, também afirma que não está revendo seus planos por acreditar que o real deve se desvalorizar em breve. "Não vamos alterar um projeto de investimento de longo prazo no país por uma situação momentânea", diz. A EDS possui quatro fábricas de software no Brasil - a última foi aberta no início do ano, em Araraquara, interior de São Paulo. Há alguns exemplos de fornecedores que foram blindados por firmar contratos em reais - caso da BRQ, que está desenvolvendo um sistema de internet banking para uma instituição financeira de Nova York. O presidente da empresa, Benjamin Quadros, afirma que seus contratos internacionais renderam US$ 1 milhão no ano passado e devem chegar a US$ 2 milhões em 2005. A tendência de exportar programas de computador ganhou corpo nos últimos anos, quando grandes corporações dos EUA e Europa perceberam que podiam terceirizar o desenvolvimento de seus sistemas de informática para empresas que operam em países com menor custo de mão-de-obra, câmbio favorável e incentivos fiscais. A Índia saiu na frente para se aproveitar dessa tendência e hoje é referência mundial no chamado desenvolvimento offshore, exportando mais de US$ 8 bilhões por ano. O mercado nacional movimenta um volume próximo ao indiano, acima de US$ 7 bilhões, mas quase tudo é comercializado internamente. Embora os números de exportação no Brasil sejam díspares, mesmo os dados mais otimistas colocam as exportações em 2004 abaixo de US$ 300 milhões.