Título: Cúpula vai condenar o terrorismo, diz Amorim
Autor: Daniel Rittner e Taciana Collet
Fonte: Valor Econômico, 10/05/2005, Brasil, p. A6

Os países árabes e sul-americanos praticamente fecharam a declaração de Brasília, documento que será assinado amanhã por chefes de Estado e governo das duas regiões, com duras críticas à ocupação de territórios palestinos pelo exército israelense. A declaração também condenará "todas as formas de terrorismo", mas recorrerá ao direito internacional para reconhecer o direito de resistência a invasões estrangeiras, segundo o chanceler Celso Amorim. "Cada um interprete como quiser", afirmou o ministro brasileiro, ao ser questionado se os trechos referem-se ao conflito Israel-Palestina. O secretário-geral da Liga Árabe, Amre Moussa, saiu triunfante da reunião de chanceleres da cúpula, ao ver garantido o trecho que pede o retorno às fronteiras anteriores à Guerra dos Seis Dias, em 1967, que incorporaram ao Estado israelense áreas como a Cisjordânia, Faixa de Gaza e Jerusalém Oriental. Moussa rejeitou a interpretação de que a menção a Israel pode atrapalhar a retomada de negociações de paz com o governo de Ariel Sharon. "Que negociações?", esbravejou. "A declaração não é contra Israel, é contra a ocupação israelense", disse o secretário-geral ao Valor. O encontro de chanceleres definiu a data para uma próxima reunião de cúpula entre as duas regiões: será em 2008, em um país árabe. Uma reunião ministerial ficou agendada para Buenos Aires, em 2007. "Aquilo que a cúpula queria provocar, já provocou: criar uma massa de interesse muito grande", afirmou o chanceler brasileiro. Para o chanceler, os países sul-americanos e árabes "estão dando um exemplo de que, através do diálogo e do compromisso, poderemos evoluir para um mundo mais justo e democrático". Segundo ele, a declaração de Brasília expressará posições comuns entre os governos que participam da cúpula. Negociadores que trabalharam na versão final do documento dizem que a idéia foi amparar e limitar as referências ao terrorismo e ao conflito no Oriente Médio em resoluções já aprovadas pelas Nações Unidas, mas com linguagem "própria" e "independente". O presidente da Autoridade Nacional Palestina, Mahmoud Abbas, manifestou ontem ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, sua preocupação com a libertação de 400 prisioneiros palestinos por parte de Israel. "O presidente Abbas disse ao presidente Lula que gostaria que o Estado de Israel fosse mais cumpridor daquilo que foi acordado em Sharm el-Sheik (Egito)", contou o assessor especial para Assuntos Internacionais da Presidência, Marco Aurélio Garcia, que acompanhou o encontro entre os dois presidentes, realizado em programação paralela da Cúpula América do Sul-Países Árabes. A libertação dos prisioneiros palestinos é considerada por Abbas um ponto crucial para convencer os militantes de grupos extremistas a aderirem ao cessar-fogo com Israel. O presidente da Autoridade Palestina mencionou os esforços que estão sendo realizados para obter, o mais rápido possível, uma solução de paz para a região. O presidente Lula reiterou a posição brasileira de continuar a apoiar a negociação de paz dentro da linha tradicional diplomática da necessidade da exigência de dois Estados na região (Israel e Palestina) "livres, seguros e economicamente viáveis". Na conversa, Lula relatou sua experiência pessoal de 13 anos para chegar à Presidência e fez um elogio da paciência. "O presidente Lula disse que as experiências de suas sucessivas derrotas como candidato a presidente provocaram nele uma reflexão e, portanto, ele apreciava o fato de os palestinos, a partir das dificuldades, refletirem sobre sua luta", contou Marco Aurélio Garcia. Na agenda de ontem, Lula abriu espaço para receber outras cinco autoridades que vieram a Brasília participar da cúpula: o primeiro-ministro da Síria, Mohammad Naji Otri, o secretário-geral da Liga Árabe, Amre Moussa, o primeiro-ministro da Mauritânia, Sghair Ould M ? Barek, o primeiro-ministro do Líbano, Mohammad Najib Mikati, e o chanceler da Líbia, Abdelrahman Shalqem. À noite, ele teve um jantar, na Granja do Torto, com o presidente da Argentina, Néstor Kirchner, e com o presidente venezuelano Hugo Chávez. Sobre o documento final que será divulgado pela cúpula, Garcia ressaltou que o presidente Lula observou que a resolução que será assinada por todos os chefes de Estado e de delegação não tem "nenhuma provocação indevida e reflete a maturidade dos países árabes e da América do Sul". O ministro de Comércio da Argélia e representante do Conselho Econômico e Social da Liga Árabe, Hacheni Djaaboub, disse, durante o seminário empresarial que acontece paralelamente à reunião de cúpula, que os países árabes pretendem adotar políticas para estabilizar o preço do petróleo, atualmente em cerca de US$ 51 o barril. A maior empresa de produção de petróleo da Arábia Saudita, a Saudi Aranco, que produz 10,5 milhões de barris/dia, pretende aumentar a produção para 12 milhões de barris em dois anos para garantir a estabilidade dos preços. (Com agências noticiosas)