Título: Kirchner destaca comércio, Chávez ataca os EUA
Autor: Sergio Leo e Taciana Collet
Fonte: Valor Econômico, 11/05/2005, Brasil, p. A4

Os dois parceiros mais voluntariosos do Brasil na América do Sul adotaram discursos diferentes durante a Cúpula América do Sul-Países Árabes. Enquanto o presidente da Argentina, Néstor Kirchner, concentrou-se na questão econômica, enfatizando a importância do comércio com os árabes, o presidente da Venezuela, Hugo Chávez aproveitou o evento para fazer duras críticas aos Estados Unidos. Ontem, durante a primeira reunião plenária, Chávez fugiu do tom das negociações comerciais e acusou os norte-americanos de tentarem derrubá-lo com um golpe de Estado. "A Venezuela está sendo ameaçada pelo imperialismo americano", destacou Chávez. "Os países árabes e os da América do Sul têm os dois maiores reservatórios de petróleo do mundo e isso aguça a voracidade imperialista." Já o presidente da Argentina, Néstor Kirchner, se concentrou na necessidade de ampliação e fortalecimento das relações entre os dois blocos e endossou a posição brasileira, ressaltando as oportunidades de negócios. "Em anos recentes, os países da América do Sul e os países árabes puderam perceber, com base em experiência própria, as falências que afetaram nossas regiões e os riscos que nascem do isolacionismo", salientou. "Essa aproximação não responde a um interesse conjuntural ou a uma crise de turbulência circunstancial, mas se encontra vinculada à necessidade de promover e executar novas e frutíferas atividades entre nossas regiões." Kirchner fez questão de dizer que a evolução das negociações só será viável se houver uma ação coordenada e conjunta. Ele apresentou propostas concretas para facilitar o acesso do setor exportador sul-americano ao mercado árabe, como estabelecer bases de operação junto ao setor privado nos portos mais importantes dos países árabes. Destacou ainda a importância de utilização de ferramentas de inteligência comercial, com o intercâmbio de informações qualificadas sobre as necessidades do mercado árabe. O presidente argentino, no entanto, não deixou de fazer uma crítica velada ao Brasil na organização da cúpula: "Não está em nosso interesse limitar um encontro dessa natureza a uma simples reunião formal, com monólogos sem resposta." O presidente venezuelano declarou que os Estados Unidos se projetaram como modelo para o mundo, "cantando vitória", e sugeriu que os países subdesenvolvidos reajam a essa situação. "Por que não o nosso modelo?" Entre as propostas de integração das duas regiões apresentadas por Chávez, está uma parceria entre a TV árabe Al Jazira e a rede de televisão da América do Sul. O presidente venezuelano ainda propõe a criação do Banco de Desenvolvimento e um fundo com recursos dos dois blocos para combater a fome e desenvolver programas de saúde. Em entrevista no fim do dia de discursos na cúpula, Chávez disse que o encontro " não é uma reunião anti-americana", mas, em seguida, entrou em contradição. "Por outro lado, digo que sim porque, quando falamos de um mundo multipolar, estamos indo de encontro ao que Mr. Bush pensa. Quando falamos da soberania das nações, da não-intervenção (nos assuntos de outros países), estamos nos chocando com as diretrizes da guerra preventiva de Mr. Bush."(Colaborou Cristiano Romero).