Título: Tensões diminuem, mas divergências continuam
Autor: Sergio Leo e Taciana Collet
Fonte: Valor Econômico, 11/05/2005, Brasil, p. A4

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente da Argentina, Néstor Kirchner, reduziram o grau de tensão das relações diplomáticas entre os dois países com uma reunião bilateral segunda-feira à noite na Granja do Torto, seguida por um jantar entre os dois e o presidente da Venezuela, Hugo Chávez. Mas a solução para as principais pendências entre Brasil e Argentina foi deixada para reuniões nas próximas semanas entre ministros dos dois países. Segundo informou ao Valor o assessor internacional da presidência, Marco Aurélio Garcia, os dois governos estudam uma forma de incentivar o aumento de investimentos na Argentina para atender à principal queixa do vizinho, de fuga de fábricas para o Brasil. Essas formas poderão incluir financiamentos do BNDES para empresas argentinas, talvez sob a forma de "joint ventures". A confirmação de que o presidente argentino voltaria ontem mesmo para Buenos Aires, um dia antes do término da Cúpula América do Sul-Países Árabes, desencadeou rumores de que o presidente argentino teria mais uma vez se irritado com as autoridades brasileiras. O fato obrigou o embaixador da Argentina no Brasil, Pablo Lohle, a dar entrevista para explicar a aversão de Kirchner a reuniões internacionais extensas. "Não foi nenhuma indelicadeza. Isso é normal. O presidente do Chile, Ricardo Lagos, também está indo mais cedo e isso não causou nenhuma polêmica", afirmou Garcia. Tanto Lohle, como o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, fizeram questão de lembrar que ministros brasileiros e argentinos se reuniram em Brasília, numa demonstração de entendimento entre os dois governos. Com o presidente argentino, vieram seis ministros. O ministro da Fazenda, Antonio Palocci, teve longa conversa ontem com o ministro da Economia da Argentina, Roberto Lavagna. Novas reuniões já foram agendadas. Ficou acertado que Palocci e Lavagna voltam a se encontrar em junho. "As relações comerciais e econômicas e comerciais com a Argentina estão muito equilibradas e são positivas", afirmou Palocci. No dia 20, Amorim se encontra com o chanceler argentino Rafael Bielsa. Na próxima semana, em Buenos Aires, o secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento, Márcio Fortes, ouvirá queixas de empresários brasileiros e argentinos. Integrantes da delegação argentina ressaltaram que Kirchner ficou agradecido com a hospitalidade recebida. Em ato de cortesia, Lula delegou a palavra ao presidente argentino como primeiro orador na na reunião plenária da cúpula. Mas Kirchner não se mostrou tão empolgado com os discursos de Lula durante o evento. Em vários momentos, quando o presidente brasileiro foi aplaudido, Kirchner não seguiu a platéia, e chegou a se levantar. "Problemas comerciais sempre existem. São países com relação muito próximas", salientou Amorim. O subsecretário de Integração Econômica da Argentina, Eduardo Sigal, foi na mesma linha. "As discussões entre Brasil e Argentina são discussões entre países-sócios, amigos e irmãos, e isso enriquece o processo de integração." O principal ponto de atrito entre os dois governos é a queixa argentina de que as condições de financiamento e facilidades fiscais do Brasil provocam migração de indústrias e desestimulam a instalação de empresas na Argentina. Lavagna tenta obter compromisso brasileiro com salvaguardas automáticas, que levantariam barreiras em caso de súbito aumento de importações vindas do Brasil. O presidente eleito da União Industrial Argentina (UIA), Héctor Mendez, criticou duramente o ministro do Desenvolvimento Luiz Fernando Furlan. "Furlan é sempre mais duro e traz preocupação para o futuro. Os outros ministros, como Palocci, entendem que não é possível pensar no futuro, se hoje não há equilíbrio", afirmou. Mendez acabava de sair do Ministério da Fazenda, onde disse que teve reunião "fantástica, positiva e construtiva" com Palocci. O assunto, segundo o presidente da UIA, foram as assimetrias entre empresas argentinas e brasileiras, que têm de ser corrigidas. (colaborou Arnaldo Galvão)