Título: Indicadores trazem sinais contraditórios
Autor: Denise Neumann
Fonte: Valor Econômico, 12/05/2005, Brasil, p. A2

A economia brasileira está em um ponto de inflexão. Esses momentos são marcados por indicadores contraditórios. Nem todos os dados (produção industrial, vendas da indústria, resultado do varejo, emprego, salários, exportações etc.) apontam para uma mesma direção. A dificuldade é justamente entender para onde eles apontam ou identificar qual dado está permitindo a leitura mais correta do lugar aonde a economia está. E para onde vai. Em março, a ambigüidade dos indicadores chegou ao auge. Enquanto o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostrou um crescimento de 1,5% na produção industrial em relação a fevereiro (já com ajuste sazonal), a Confederação Nacional da Indústria (CNI) registrou queda de 1,1% nas vendas industriais na mesma comparação. Enquanto a produção industrial arrefece (alta de 3,9% no trimestre em relação ao mesmo período do ano passado), o comércio tem indicado boas vendas. Em São Paulo, o faturamento do varejo nos primeiros três meses cresceu 6,6% reais em relação ao mesmo período do ano passado. Os dados nacionais de março serão divulgados hoje pelo IBGE. Enquanto a produção dá sinais de acomodação (e muito precipitadamente alguns empresários começam a falar em risco de recessão), o emprego continua crescendo e a indústria está criando novas vagas. A mesma CNI que registrou queda nas vendas, identificou aumento de 0,2% no pessoal empregado em março em relação a fevereiro. Olhar setorialmente a economia ajuda pouco, porque também aí os sinais são dúbios. No primeiro trimestre deste ano, a Gerdau e a Belgo Mineira revelaram, ao divulgar seus balanços, quedas de 5,5% e 9,2%, respectivamente, no volume de aço entregue no mercado interno. Já a CSN, na mesma comparação, aumentou suas vendas domésticas em 12%, em quantidade. Qual mercado interno cada uma dessas empresas atende? As duas primeiras têm foco na construção civil, a terceira destina às montadoras parcela expressiva da sua produção. Construção pressupõe investimento, enquanto o consumo de automóveis é movido a crédito. Monitorar indicadores e entender de fato para onde anda a economia - como fará o Comitê de Política Monetária (Copom) na próxima semana - fica mais difícil nesses momentos. Não sabemos exatamente que força econômica está prevalecendo (ou vai prevalecer). Tanto o consumo interno pode crescer de forma mais expressiva (em maio começa a ser pago o aumento real de 8% no salário mínimo, capaz de injetar entre R$ 13 bilhões e R$ 18 bilhões na economia), como o câmbio pode começar a impactar mais negativamente as exportações (os embarques de manufaturados registraram, em abril, a primeira queda em 19 meses em uma série trimestral com ajuste sazonal calculada pela LCA Consultores). Um movimento age para impulsionar a produção, outro para contê-la.

Ações do BC têm efeitos de curto e longo prazo

De qualquer forma, o Banco Central não deve olhar apenas para o curto prazo (como ficará a demanda este ano e, conseqüentemente, em que ponto acima dos 5,1% da meta será possível segurar o IPCA do ano). Os atos de hoje do BC têm e terão impacto no médio e longo prazos. Aqui cresce o perigo. A expressiva puxada da taxa Selic (3,5 pontos em oito meses) também parece ter impactado os investimentos e, nesse sentido, o BC não está impondo, apenas, um ritmo menor de crescimento para 2005, mas também contratando um PIB menor para 2006, 2007... Muitos já acham que 3% pode ser um ponto máximo para a evolução do PIB deste ano. Para o próximo, as previsões do mercado estão em 3,5%. Apesar da produção de bens de capital ter crescido 4,5% em março na comparação com fevereiro, os sinais que se avolumam indicam retração no investimento em máquinas, equipamentos e na construção civil. Nos primeiros três meses, os números do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) mostraram queda de 20% nas consultas, indicador da intenção de investir das empresas. Pelos dados do IBGE, a produção de bens de capital para fins industriais no primeiro trimestre deste ano foi 3,1% menor do que no mesmo período do ano passado. Enquanto os sinais de que a alta na taxa básica de juros afetou o investimento estão presentes (tomara que os próximos meses mostrem uma reversão dessa tendência), o mesmo não acontece em relação à demanda, especialmente a parcela ancorada no crédito. O efeito dos juros sobre a inflação são bem menos visíveis. Até abril, o IPCA já alcançou 2,68%, mais da metade da meta estabelecida para o ano. Desse total, 0,91 ponto percentual é relativo aos preços administrados (cuja alta acumulada chega a 3,08%) e 1,77 ponto é relativo a preços livres. Ou seja, tem gente achando espaço para aumentar preços, apesar do câmbio em R$ 2,50. Para qual caminho o BC vai olhar? E com peso em qual horizonte? Tentar consertar a economia em 12 meses parece, cada vez mais, irrealista.