Título: Lula defende uma conferência nas Nações Unidas contra terrorismo
Autor: Sergio Leo e Taciana Collet
Fonte: Valor Econômico, 12/05/2005, Brasil, p. A4

Até o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deixou de lado os temas econômicos e encerrou a Cúpula América do Sul - Países Árabes com um discurso político, de defesa dos povos palestino e iraquiano e de atuação conjunta dos países árabes e sul-americanos em defesa da paz e da democracia. Ao ver que os temas políticos despertaram mais atenção dos meios de comunicação que os temas comerciais durante a cúpula, na entrevista coletiva que se seguiu ao encerramento, Lula defendeu uma conferência das Nações Unidas sobre terrorismo, e teve de explicar a ausência de referências à defesa da democracia na declaração final da reunião. Lula e os dirigentes árabes rejeitaram a comparação entre a cúpula e o movimento dos países não-alinhados, que reuniu países do chamado terceiro mundo nos anos 50 e 60. "Cada época tem seus próprios marcos", disse o secretário--geral da Liga Árabe, Amre Moussa. "Nos anos 50, o mundo era bipolar e havia a luta de descolonização; hoje queremos uma globalização em condições mais favoráveis." Embora, desde o início, o governo brasileiro tenha decidido dar à cúpula um caráter comercial e de investimentos, principalmente, Lula chegou a minimizar o peso das realizações comerciais resultantes do encontro que reuniu 34 países, 11 chefes de Estado e governo da América do Sul e sete chefes de governo árabes. "Muito mais que as perspectivas comerciais imediatas, o mais importante foi que nos conhecemos, pudemos perceber o quanto somos parecidos, quanto temos interesses comuns e podemos construir juntos", comentou o presidente. Os contatos pessoais entre os presidentes valem "muito mais do que um negócio feito no imediatismo das conquistas comerciais." Lula não deixou de enfatizar que espera de sua política internacional resultados comerciais, como aconteceu com a formação do G-20, grupo de países em desenvolvimento reunido pelo Brasil para defender propostas comuns na discussão sobre agricultura na Organização Mundial do Comércio (OMC). Mas fez questão de lembrar que a defesa da causa palestina faz parte da história do PT, e ressalvou que defende também o direito à existência do Estado de Israel, e que os participantes da reunião de cúpula teriam muito a aprender com a população brasileira de ascendência árabe, que "dá uma demonstração da convivência pacífica com o povo judeu." Um dos pontos mais polêmicos na declaração final da cúpula foi a defesa - já rejeitada por israelenses e americanos em outras discussões na ONU -do direito dos Estados e povos de resistir à ocupação estrangeira (o que os críticos vêem como uma aprovação às ações armadas de grupos como o Hammas, palestino, e o Hezbollah, libanês, considerados terroristas pelos Estados Unidos). O texto negociado pelos sul-americanos, porém, estabelece que esse direito à resistência deve ser exercido "de acordo com os princípios da legalidade internacional e em conformidade com o Direito Humanitário Internacional". Além disso, o texto tem uma condenação formal às ações terroristas e defesa do combate ao terrorismo, desde que feito por meio de "cooperação internacional" e segundo os princípios das Nações Unidas. O documento defende a realização de uma conferência para discutir e definir o terrorismo e as formas de combatê-lo (proposta já rejeitada na ONU pelos Estados Unidos e Israel). "Nossa declaração seria antidemocrática se cada um de nós tivesse uma definição própria de terrorismo e agíssemos contra ele em função do que pensamos", disse Lula, como argumento ao defender a "democratização" das Nações Unidas, "para que a decisão sobre terrorismo e outros temas seja democratizada, não uma decisão unilateral". Os participantes árabes da conferência asseguraram a inclusão, nos debates e no documento final da cúpula, de críticas à atuação de Israel e dos Estados Unidos, embora tenham garantido o respeito às determinações da Organização das Nações Unidas. "Esse documento poderia ser um documento das Nações Unidas", disse Lula.