Título: Intenções trilionárias
Autor: Otoni, Luciana
Fonte: Correio Braziliense, 30/03/2010, Política, p. 6

eleições

Embora se limite, por ora, a um conjunto de discursos, o PAC 2 mexe com cifras estratosféricas, principalmente de estatais e do FGTS

Mais do que uma jogada eleitoral para vitaminar a campanha presidencial da ministra Dilma Rousseff, o lançamento do PAC 2 simboliza uma gigantesca carta de intenções de investimentos. Mais precisamente, de R$ 1,5 trilhão. Desse bolo, R$ 958,9 bilhões têm previsão de implementação entre 2011 e 2014. O restante seria aplicado nos anos seguintes. Composto de 10 mil projetos, o PAC 2 é o aceno de Luiz Inácio Lula da Silva a eleitores, governadores, prefeitos, parlamentares e investidores da destinação provável dos recursos, prioritariamente em obras sociais e de infraestrutura. Não falta dinheiro. Falta viabilizar os projetos, afirmou o presidente.

De concreto, porém, há apenas os discursos de Lula e da ministra Dilma, além de uma publicação de 94 páginas sem detalhes sobre as ações. A partir de agora, uma equipe de técnicos do governo se reunirá entre abril e junho para reunir os 10 mil projetos. Até o momento, não há especificação de obras, detalhes sobre a desburocratização na área ambiental e medidas para agilizar a execução. As informações existentes sobre as obras do PAC 2 constituem parte dos projetos do PAC 1 que não foram concluídos.

O balanço do PAC original, lançado em janeiro de 2007, mostra que o governo levou três anos para investir R$ 403 bilhões (63% do valor previsto entre 2007 e 2010 e recursos que incluem reservas da Petrobras e da Eletrobras), dos quais R$ 256,9 bilhões estão em iniciativas efetivamente finalizadas. Alguns projetos lançados em 2007, como o da modernização dos portos, sequer saíram do papel.

O PAC 2 é mais ambicioso que o PAC 1 e prevê atividades subdivididas em seis tipos de ações (veja quadro): PAC Cidade Melhor (R$ 57,1 bilhões); PAC Comunidade Cidadã (R$ 23 bilhões); PAC Minha Casa, Minha Vida (R$ 278,2 bilhões); PAC Água e Luz para Todos (R$ 30,6 bilhões); PAC Transportes (R$ 104,5 bilhões); e PAC Energia (1)(R$ 465,5 bilhões). O governo também projeta três novos ramais do trem de alta velocidade (São Paulo a Curitiba / Campinas ao Triângulo Mineiro / Campinas a Belo Horizonte), mas, por ora, há apenas estudos de viabilidade, sem ações de implementação.

Maldito x bendito

A despeito da garantia do presidente Lula de que não faltará dinheiro para investimento, a verba do Orçamento da União representa menos de um quarto dos R$ 958,0 bilhões do PAC 2 entre 2011 e 2014. São R$ 220 bilhões, subdivididos nos Orçamentos de 2011, 2012, 2013 e 2014. A maior parte vem das estatais federais, principalmente da Petrobras e da Eletrobras, da Caixa Econômica e dos recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).

Os empresários convidados para o lançamento do PAC 2 aplaudiram a carta de intenções do governo, mas alertaram para as deficiências que marcaram o PAC 1. É preciso melhorar o sistema de garantias e as instituições públicas responsáveis pela regulação precisam ser mais eficientes, para não sermos obrigados a, no futuro, transformamos a infraestrutura como o vilão do crescimento, comentou Paulo Godoy, presidente da Associação Brasileira de Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib).

Candidata do PT à Presidência da República, a ministra Dilma Rousseff apresentou o conteúdo do programa de investimento de quase R$ 1 trilhão dizendo que, durante a implementação do PAC 1, governadores e prefeitos receberam tratamento igualitário. O presidente Lula estabeleceu uma relação harmônica com os estados e os municípios, que esteve condicionada aos projetos, e não a inclinações políticas ou partidárias, frisou. Ao apresentar o novo plano de investimento, a ministra candidata disse que seu desejo é deixar um legado positivo: O objetivo do PAC 2 é deixar uma herança bendita a quem suceder nosso governo, com projetos, obras e recursos.

1 - Crescimento ordenado A fatia mais significativa dos investimentos está na área de petróleo e gás natural: R$ 879,2 bilhões. O PAC 2 terá ênfase especial às chamadas usinas hidrelétricas de plataformas, que preveem isolamento das estruturas após serem construídas, de modo a evitar crescimento populacional desordenado. Estão no plano dez hidrelétricas nesse sistema. O programa prevê ainda 44 usinas hidrelétricas convencionais.

Bolsos atentos ao social

Diferentemente do PAC 1, concentrado em obras de infraestrutura, uma das ênfases do PAC 2 é em programas sociais. No total, R$ 358,2 bilhões em verbas do Orçamento da União, da Caixa Econômica Federal e de outras fontes, como o FGTS, serão destinados à construção de moradias, saneamento básico, obras para fornecimento de água e energia.

A maior fatia dos investimentos, R$ 600 bilhões, é destinada a obras de infraestrutura, mas grande parte disso se deve ao caixa da Petrobras e da Eletrobras para a extração, produção e refino de petróleo e construção de usinas hidréletricas e não abarcam os recursos do Orçamento da União.

No lado social, as metas são ambiciosas. Os planos apresentados ontem são de encher os olhos do eleitor e de enraivecer a oposição. Na área habitacional, a intenção é construir 2 milhões de moradias (60% destinadas a famílias com renda de até R$ 1.395) e tornar disponível R$ 176 bilhões para o financiamento da casa própria. Para compensar deficiências na área da saúde e a falta de segurança públicas nas cidades brasileiras, que não foram contempladas com os recursos do PAC 1, o PAC 2 planeja construir 9.194 unidades de atendimento à saúde, 6 mil creches, 10 mil praças esportivas e 2.883 postos de política comunitária.

Embora grandiosas, as intenções estão vinculadas ao programa do PT para a Presidência e dependentes da real intenção do sucessor de Lula no Palácio do Planalto. São, antes de tudo, uma demarcação de posição da ministra candidata, Dilma Rousseff. Nosso modelo de Estado possui três expressões: planejamento, investimento e desenvolvimento social, afirmou a ministra. Com senso de oportunidade eleitoral, ela também vinculou as obras de infraestrutura à Copa do Mundo e às Olimpíadas, quando nossa capacidade será testada no limite.

Pobres

No segmento dos transportes, são previstos R$ 104,5 bilhões. Desse montante, R$ 50,4 bilhões para obras em rodovias, R$ 46 bilhões em ferrovias, R$ 3 bilhões em aeroportos e R$ 5 bilhões em portos. Ao abordar a mobilidade social, Lula disse, durante sua apresentação do novo plano de investimentos, que quer ver mais pessoas das classes de menor poder aquisitivo viajando pelo país. Temos que investir na infraestrutura aérea, porque os poucos pobres que passaram a viajar de avião já estão congestionando os aeroportos, disse o presidente. (LO)

EMPRÉSTIMOS MAIS SALGADOS O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) será capitalizado em R$ 80 bilhões, montante restrito a este ano e insuficiente para sustar o plano ambicioso do PAC 2. Esses recursos serão usados para financiar projetos de exploração do pré-sal, hidrelétricas e grandes obras do sistema viário. Em contrapartida, o Ministério da Fazenda informou que a partir de julho os empréstimos contratados junto ao BNDES ficarão mais caros. Os juros passarão de 4,5% ao ano para 5,5% ao ano em algumas linhas. Em outras, o percentual passa de 7,5% para 8,5%.