Título: Torrefadoras tentam seduzir o Mercosul
Autor: Mônica Scaramuzzo
Fonte: Valor Econômico, 12/05/2005, Agronegócios, p. B14

Os países do Mercosul são um desafio para os exportadores brasileiros de café. O avanço do produto brasileiro na região esbarra numa barreira sutil: apesar da proximidade geográfica entre os países, os hábitos de consumo são muito diferentes. Para entender um pouco melhor o consumo dos países vizinhos e seus consumidores, a empresa Fazenda Muzambinho, localizada na cidade de Muzambinho, no sul de Minas, decidiu estudar esse mercado. "Os concorrentes do café brasileiro nos países do Mercosul são o mate, com produção local, e as bebidas quentes, como o chocolate", diz Nathan Herszkowicz, diretor da Associação Brasileira da Indústria de Café (Abic). "Como os países sul-americanos produzem pouco café [com exceção da Colômbia], o produto tem de ser importado." O foco do empresário Eduardo Campedelli Galante, presidente da Fazenda Muzambinho, é a exportação de café torrado expresso para ser consumido em cafeterias, hotéis e restaurantes. "Temos representantes nos países do Mercosul, nos EUA e na Europa, que estudam esses mercados para que possamos exportar nosso produto com uma estratégia consistente." Maior exportador mundial de café em grão, o Brasil também quer expandir os embarques de café torrado e moído. Em 2004, o Brasil exportou US$ 8,341 milhões em café torrado e moído. A Argentina respondeu por 4,7% do total. O Uruguai e Chile representaram, cada um, menos de 1% dessas vendas, de acordo com a Abic. No mesmo período, as exportações de café em grão somaram US$ 2 bilhões, com volumes de 26,45 milhões de sacas. A Argentina respondeu por 2% do total e, o Uruguai, por 0,08% do total, segundo o Cecafé (reúne os exportadores). Apesar do baixo consumo nesses países, a Fazenda Muzambinho quer disputar uma parcela desse mercado. "O consumo de café expresso no Uruguai é recente, mas na Argentina já é um hábito mais comum", diz Beatriz Rodriguez, do departamento de exportação da Muzambinho e responsável pelo Mercosul. No próximo mês, a empresa deve mandar seus primeiros embarques para esses dois países. Dedicado aos agronegócios desde o início da década de 90, quando começou a comprar as fazendas com cafezais que pertenciam ao seu avô, Lauro Campedelli, e que foram deixadas de herança aos filhos, Galante resolveu investir também em uma pequena torrefadora na própria fazenda para atuar nas pontas da produção e da indústria. Nos últimos anos, Galante investiu US$ 2 milhões em infra-estrutura agrícola, com uma área total de 900 hectares, e industrial, o que inclui também canaviais para a produção de cachaça. "Foi como resgatar um sonho de infância", afirma o empresário, que costumava passar as férias na fazenda do seu avô. Com uma produção média de 10 mil sacas por safra, ou 500 toneladas de café industrializado, Galante quer ampliar suas exportações. Em abril, embarcou dois contêineres de café (40 toneladas) para os EUA e outros dois contêineres para Portugal. Parte do volume embarcado para Portugal irá para Angola. Para Carlos Brando, diretor da consultoria P&A, estudar o hábito de consumo dos países antes de fechar negócio é uma maneira eficiente para entender os mercados. "O que pode ser apenas um nicho de mercado para uma empresa de grande porte, pode significar uma boa oportunidade de negócio para uma pequena ou média empresa." A consultoria P&A foi contratada em 2004 pela Organização Internacional do Café (OIC) para estudar os hábitos de consumo dos países produtores de café. A P&A visitou sete países: Vietnã, Quênia, Uganda, Colômbia, Índia, México e Guatemala. O objetivo da OIC é estimular o consumo de café nos países produtores, numa tentativa de colaborar para o equilíbrio entre oferta e demanda global. O caso da Colômbia é clássico. O consumo neste país, que produz cerca de 10 milhões de sacas, é pequeno. É que lá o café concorre com o chocolate.