Título: Fixação de tarifa ainda gera dúvidas nas regras do setor de saneamento
Autor: Mônica Izaguirre
Fonte: Valor Econômico, 16/05/2005, Brasil, p. A5

Ainda que suas principais preocupações tenham sido contempladas, a Associação Brasileira das Indústrias de Base (Abdib) ainda vê problemas na proposta do governo federal para o marco regulatório do setor de saneamento. "Não posso dizer que está bom", afirma o vice-presidente da entidade, Newton Lima Azevedo, referindo-se ao projeto de lei que será enviado ao Congresso, possivelmente, no próximo dia 20. Diferente do que informou o Valor em sua edição da última sexta-feira, não foi a Abdib e sim a Abcon, associação que representa as concessionárias privadas de saneamento, a entidade que enviou ao ministro Olívio Dutra, das Cidades, correspondência manifestando apoio ao projeto. Uma das principais preocupações da Abdib sempre foi a regulação, o que envolve, por exemplo, a revisão de tarifas (pelo projeto, a cada quatro anos) e a fiscalização dos reajustes automáticos e do cumprimento dos contratos entre concessionários e poder concedente. O governo chegou a pensar em atribuir a regulação a conselhos municipais. Depois de muito debate, mudou de idéia e aceitou a tese da Abdib de que os reajustes e revisões de tarifa devem ficar a cargo de órgãos reguladores com autonomia administrativa, técnica e financeira em relação ao município ou Estado titular , sempre que a prestação do serviço for delegada a uma empresa. Ainda assim, a Abdib não está tranqüila quanto à regulação. Azevedo destaca que não leu a versão oficial definitiva do projeto do governo, até porque o texto ainda não está disponível. Mas "pelo que foi depreendido da exposição oral " feita pelo Ministério das Cidades, diz ele, "os conselhos ainda vão interferir em tarifas". Não foi isso, porém, que o Valor ouviu do secretário de Saneamento do ministério. Abelardo de Oliveira Filho assegura que "os conselhos serão apenas consultivos e não deliberativos", portanto, sem nenhum poder de fixar tarifa. O vice-presidente da Abdib vê problema também em relação à titularidade dos serviços nas regiões metropolitanas e aglomerados urbanos - uma velha briga entre Estados e municípios que abandonaram ou querem abandonar companhias estaduais de água e esgoto, para licitar ou prestar eles próprios os serviços. Azevedo avalia que, nesse aspecto, o texto do projeto "pode estar em desacordo" com o novo discurso do governo, agora favorável a deixar para as assembléias legislativas dos Estados a tarefa de definir, por lei complementar estadual, como e por quem devem ser prestados os serviços nas regiões metropolitanas. Azevedo elogia a mudança de posição do governo. Mas teme que, por causa de "sutilezas" do texto, isso na prática não possa ser implementado. "Nas sutilezas é que mora o perigo. O que nos foi explicado nos leva a supor que, na prática, o poder concedente será sempre o município", afirma. O problema, na sua opinião, é que o projeto adota o conceito de serviços integrados quando deveria falar em serviços de "interesse comum", expressão usada no dispositivo constitucional que permite aos Estados formar regiões metropolitanas para integrar funções públicas de interesse de vários municípios próximos. O secretário do Ministério das Cidades diz que esse é "outro entendimento equivocado" da Abdib a respeito do projeto. Segundo Abelardo, ao definir o que são serviços integrados, o projeto não quer excluir os Estados da organização e prestação dos serviços de água e esgoto e sim induzir a formação de consórcios entre aqueles municípios não abrangidos por regiões metropolitanas. Hoje, explica Abelardo, o fato de estarem fora do alcance das leis complementares que instituem essas regiões permite, em tese, que esses municípios decidam sair de sistemas integrados de abastecimento, prejudicando outros municípios.