Título: Fim da verticalização ajuda mais a governadores do que a Lula
Autor: César Felício
Fonte: Valor Econômico, 16/05/2005, Política, p. A8

Serão os governadores com direito à reeleição, e não o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, os principais beneficiários com o fim da verticalização, a norma legal criada pela Justiça eleitoral em fevereiro de 2002 que proibiu alianças regionais entre partidos que pertençam a coligações diferentes no plano nacional. A medida deverá ser derrubada nas próximas semanas, com a aprovação de uma emenda constitucional. A aprovação da desverticalização é dada como certa depois da decisão da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara a favor da admissibilidade da emenda, com apenas um voto contrário. Embora a matéria ainda precise ser votada por uma Comissão Especial na Câmara e pelo plenário em dois turnos até setembro para valer para a eleição no próximo ano, o fim da obstrução do PT faz com que se preveja um andamento rápido e tranqüilo para o tema. A meta das lideranças partidárias é votar pelo menos em primeiro turno antes do recesso de julho. Conseguir o apoio formal do PMDB e do PP para a reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi o principal motivo para levar o PT a recuar da oposição à emenda constitucional, mas os próprios líderes da ala governista do PMDB, como o presidente do Senado Renan Calheiros (AL) usam de prudência em relação ao tema: se a verticalização for mantida, a chance de aliança é zero. Se cair, a coligação é provável, mas não é certa. "O fim da verticalização não promove a aliança porque a direção nacional pemedebista vai continuar trabalhando pela candidatura própria e isto complica tudo. A emenda vai ajudar os nossos candidatos a governador, mas o principal desafio nosso é resolver o problema interno", disse o senador Hélio Costa (PMDB-MG), vice-líder do partido e do governo. Em 1998, quando Fernando Henrique Cardoso foi candidato à reeleição e não havia regra de verticalização, tudo que os governistas de então conseguiram foi impedir que o PMDB lançasse candidatura própria. Não tiveram na convenção nacional votos suficientes para aprovar o apoio ao tucano. Já para os governadores, o ganho com o fim da regra é claro. "Os governadores perderam poder econômico, mas agora vão recuperar o comando da organização das forças políticas em seus Estados", comentou o professor de Ciência Política do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj), Jairo Nicolau. Segundo o acadêmico, "a desverticalização é a percepção clara de que o presidente precisa da política regional e de um alinhamento de baixo para cima". Nicolau lembra que, com exceção de São Paulo, e, em menor grau, de Minas Gerais, em nenhum Estado do Brasil existe a polarização do plano nacional, entre o PT e o PSDB. Na região Sul do país, o PMDB quebra esta regra nos três Estados e o bloco PP/PFL ainda é forte em Santa Catarina. No Rio, PMDB e PFL são mais fortes do que o PSDB e o PT. Na Bahia, o PFL é a principal força. Em Pernambuco, o PSB, o PFL e o PMDB se equiparam aos tucanos e petistas. "São Paulo tornou-se a grande exceção porque forneceu os candidatos a presidente da polarização nacional nas três últimas eleições, o que fez com que a disputa regional ficasse atrelada à sucessão presidencial, com o declínio acentuado do malufismo e do PMDB", disse Nicolau. O fim da verticalização fortalece os governadores a tal ponto que cinco deles só aguardavam o fim da queda de braço para definirem seu destino partidário: o capixaba Paulo Hartung e o tocantinense Marcelo Miranda, que estão sem partido, o paraibano Cássio Cunha Lima, do PSDB e o amazonense Eduardo Braga, do PPS, devem migrar para siglas da base de apoio do governo federal para montarem coligações que reúnam tanto partidos governistas quanto oposicionistas em favor da reeleição de Lula à Presidência e de si mesmos como governadores. Já o governador do Mato Grosso, Blairo Maggi (PPS), que se preparava para sair do partido, agora deve ficar: concluiu que pode conseguir ter no seu palanque Lula e o PFL, ao mesmo tempo, com o fim da verticalização. A desverticalização foi bem vinda no Palácio da Liberdade. "A vida do governador Aécio Neves (PSDB) foi muito facilitada", afirmou o deputado federal Júlio Delgado (PPS), que deverá acompanhar o ministro da Integração nacional, Ciro Gomes, no processo de migração partidária. Aécio pode concorrer à Presidência, mas se fortaleceu muito como candidato a um novo mandato em Minas. As bases de apoio de Aécio Neves e de Lula se justapõem e o término da regra permite ao governador mineiro ter o apoio em uma candidatura à reeleição do PTB, PSB e PP, além de dissidentes do PPS como o próprio deputado. Se a verticalização continuasse, estes partidos iriam se aglutinar em torno do candidato de Lula em Minas Gerais, que poderá ser o vice-presidente José Alencar (PL), ou os ministros do Desenvolvimento Social, Patrus Ananias e de Direitos Humanos, Nilmário Miranda, ambos do PT. O fim do engessamento das coligações beneficia também o prefeito do Rio, o pefelista Cesar Maia, que ganha mais margem de manobra no próximo ano: poderá ser candidato a governador ou a presidente da República, deixando a Prefeitura do Rio para o PSDB e amarrando um acordo com os tucanos em torno de um candidato único ao governo. "A verticalização era muito ruim para o Cesar Maia, porque ele não teria nem alianças, nem nome forte próprio para o governo, além de deixar a prefeitura em nossas mãos", afirmou o deputado federal tucano Eduardo Paes (RJ). Situação semelhante é a do governador Geraldo Alckmin (PSDB) em São Paulo. Embora o PSDB paulista tenha defendido a manutenção da regra, o seu fim não chega a prejudicar o governador, caso ele se torne candidato a presidente, desde que consiga pactuar uma aliança local com o PFL, caso Cesar Maia também seja candidato. O substituto de Alckmin é o pefelista Cláudio Lembo.