Título: STF autoriza inquérito contra Meirelles
Autor: Juliano Basile
Fonte: Valor Econômico, 13/05/2005, Política, p. A9

O ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), autorizou, ontem, a abertura de inquérito contra o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. Ele também determinou a quebra do sigilo fiscal de Meirelles desde 1996. O objetivo do inquérito é apurar a ocorrência de três crimes supostamente atribuídos a Meirelles: evasão fiscal, crime contra o sistema financeiro e crime eleitoral. O pedido de abertura de investigações contra o presidente do BC foi feito pelo procurador geral da República, Claudio Fonteles, no início de abril. Agora, o processo volta para Fonteles que decidirá pelo arquivamento ou pelo oferecimento de denúncia ao STF contra Meirelles. Marco Aurélio Mello convenceu-se de que existem indícios de crimes e resolveu dar ao MP a possibilidade de ampliar as investigações. "Há de se viabilizar a atuação do Ministério Público, até mesmo para que não pairem dúvidas sobre o perfil de quem dirige autarquia da envergadura do Banco Central", disse o ministro, no despacho de quatro páginas. O Valor perguntou ao ministro do Supremo se ele não considerou os efeitos que a sua decisão terá no mercado financeiro. "Eu não poderia privilegiar a estabilidade do mercado financeiro a ponto de prejudicar um bem maior que é a elucidação dos fatos", respondeu Marco Aurélio. Em seguida, o ministro ressaltou que o presidente do BC não é culpado de nada e terá a possibilidade de provar a sua inocência durante as investigações. Ele explicou que o caso poderá ser arquivado no futuro. O ministro também esquivou-se de responsabilidades futuras caso Meirelles se candidate nas eleições do ano que vem e seja prejudicado pelo efeito político das investigações. O presidente do BC foi o mais votado entre os candidatos a deputado federal pelo estado de Goiás em 2002. "Claro que o povo não pode colocá-lo no banco dos réus e condená-lo. Milita a favor dele o princípio da não culpabilidade", reiterou Marco Aurélio. Para preservar as investigações, o ministro do STF determinou o sigilo dos documentos que serão obtidos pelo MP. "Atente-se para o acesso reservado, ou seja, do MP e do interessado Henrique Meirelles, devendo os documentos permanecerem, por isso, envelopados, com a tarja relativa à preservação do sigilo", escreveu em seu despacho. A Receita e o BC deverão encaminhar uma série de documentos, segundo a determinação de Marco Aurélio. A Receita terá de encaminhar cópia de auditorias fiscais e das declarações de imposto de renda de Meirelles desde 1996. O BC terá de repassar duas investigações envolvendo o BankBoston. A primeira trata de remessas de R$ 1,37 bilhão, feitas quando Meirelles presidiu o banco. A segunda investigação envolve as empresas "off shore" Silvânia One e Silvânia Two, de propriedade do presidente do BC. Ele teria feito remessas de US$ 2,6 milhões a essas empresas. O MP quer saber a origem do dinheiro nessas operações. As duas investigações já foram concluídas pelo BC, durante a gestão de Armínio Fraga, e foram arquivadas. O ministro do STF requisitou também cópia de processo envolvendo o BankBoston no Conselho de Contribuintes. Os advogados de Meirelles alegaram que não havia a necessidade de analisar esse processo apenas pelo fato de ele ter presidido o banco, mas Marco Aurélio não se convenceu. "Mais uma vez, nota-se, de início, entrelaçamento capaz de sugerir a necessidade de se contar com dados maiores acerca das práticas que são imputadas a Henrique Meirelles", justificou o ministro. Fonteles pediu cópia de todos esses documentos para investigar se Meirelles abriu empresas em paraísos fiscais quando foi presidente do BankBoston, enviou dinheiro ao exterior após a desvalorização do real, em janeiro de 1999, sem a devida autorização do BC, e declarou um domicílio à Receita e outro à Justiça Eleitoral, em 2002, quando foi candidato a deputado pelo PSDB de Goiás. Meirelles telefonou ontem para o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, para dizer que está muito tranqüilo com a decisão do STF. Na análise de Meirelles, a decisão vai permitir esclarecer que não há nada contra ele. Palocci transmitiu o recado ao presidente Lula. O presidente teria reiterado que a decisão do governo é a de não prejulgar.