Título: Vítimas da turbulência
Autor: Angelo Pavini e Catherine Vieira
Fonte: Valor Econômico, 17/05/2005, EU &, p. D1

As indefinições dos mercados estão reduzindo a lucratividade e as aplicações nos multimercados este ano. Usando como referencial o índice de fundos multimercados do Banco Pactual, pode-se conferir que as principais carteiras do mercado registram rentabilidade média no ano de 5,51% até dia 12 de maio, para 6,32% do CDI. Segundo dados do site Fortuna, o retorno geral desses fundos no ano está em 5,18% no ano. Como reflexo dos baixos ganhos, o mercado assiste à redução do interesse dos investidores e à redistribuição de recursos, especialmente entre os gestores independentes. Em uma mostra de 92 multimercados agressivos, com patrimônio de R$ 15 bilhões, a perda no ano até o dia 12 está em R$ 640 milhões, ou 4,2%, diz Marcelo D'Agosto, do Fortuna. Muitos que não conseguiram rentabilidades expressivas apresentam grandes saques, em alguns casos de mais de 80% da carteira que tinham há um ano. O movimento tem levado alguns bancos de varejo a repensar a área de carteiras que aplicam nessas gestores. Um dos maiores gestores do país, diante das perdas, abortou recentemente a criação de um segmento de fundos de fundos. As perdas - de retorno e de patrimônio - dos fundos hedge são reflexos de dois cenários, um macro e um micro, explica diz Luis Fernando Lopes, estrategista da Pátria Hedge Funds. No macro, há a concorrência de um juro real em torno de 12% ao ano com baixíssimo risco nos fundos DI. Para ganhar mais que isso, os fundos hedge têm de correr muito mais risco e podem não ter um ganho tão bom. Foi o caso de quem se arriscou na bolsa de valores e acabou se dando mal mesmo aplicando em empresas com bons fundamentos. No quadro micro, há a política do gestor, que nem sempre traz os resultados desejados no curto prazo. No caso do Pátria, a aposta da carteira é num cenário positivo tanto localmente quanto nos mercados internacionais. Mas nos últimos meses, esses fundamentos positivos não têm se refletido nos mercados. "Há vários papéis interessantes na bolsa prejudicados por um processo de venda desenfreada", diz. Por trás dessa venda, estaria um investidor estrangeiro que "comprou a tese errada de que as commodities vão desabar ou precisa de liquidez e vende os papéis mais fáceis, que são os nossos", diz. Hoje o Pátria Hedge tem R$ 40 milhões depois de ter chegado a mais de R$ 500 milhões no ano passado. Mas Lopes diz que não haverá mudanças. "O banco tem interesse estratégico na área e vamos continuar, mesmo com patrimônio menor", diz ele. "Em algum momento voltaremos a crescer." O rearranjo dos multimercados vai continuar, com os investidores que não suportam períodos de resultados ruins procurando fundos mais conservadores, acredita Marcos Duarte, da Pólo Capital, um dos gestores que têm se saído bem no ano. Ao mesmo tempo, deve haver mais carência para resgates, obrigando o aplicador a aplicar mirando o longo prazo. Nessa linha, o fundo mais antigo da gestora, o Pólo Multimercado, só permite movimentações semestralmente. A outra carteira, mais conservador, a Pólo Norte, passa a ter saques mensais a partir de junho e caminha também para se tornar semestral quando atingir patrimônio de R$ 150 milhões. Os dois fundos da Pólo são long/shorts, ou seja, ganham na arbitragem entre preços de ações. Segundo Duarte, neste início de ano, os fundos foram beneficiados pelo efeito da queda das commodities em algumas ações. O mesmo ocorreu com os papéis de telefonia, beneficiadas por reestruturações de algumas empresas. No total, o fundo tem entre 30 e 40 apostas, para desconcentrar o risco, e evita arbitragens entre setores. No Credit Suisse First Boston (CSFB), o fundo Long Short Equities ganhou com a arbitragem entre papéis de telefonia, bancos e siderurgia até fevereiro. Em abril, a carteira perdeu com papéis de mineração, mas manteve o bom desempenho no ano, explica Mauro Bergstein, gestor do CSFB. Já o Absolute, que une análise macro com uma parcela em arbitragem, ganhou ao iniciar o ano sem grandes apostas, o que permitiu aos gestores aproveitar as oportunidades que surgiram em bolsa e câmbio com o nervosismo em torno dos juros americanos. O mesmo ocorreu em fevereiro, quando o fundo ganhou com a queda da bolsa e do dólar. O Absolute deve fechar para captação em 1º de junho. Para o fundo com maior perda no ano, o Orbix, vale um adendo: além de ser um fundo global, com atuação em vários mercado - desde moedas, commodities, até taxas de juros -, ele é um fundo de tendências. A carteira não tenta descobrir para onde vai o mercado, apenas aplica quando detecta uma tendência de alta ou baixa. Alexandre Bourgeois, gestor e sócio da Orbix Capital, diz que a aplicação teve um início de ano difícil, especialmente em fevereiro com a valorização do dólar diante do euro e do iene. O fundo perdeu também com a queda das commodities em março. "Mas passamos a ganhar já no mês passado", diz Bourgeois. Segundo José Alberto Tovar, sócio da Arx Capital, o que aconteceu no caso da gestora foi uma realocação entre os fundos da casa. Tovar admite, no entanto, que uma parte dos resgates ocorre em função da fase ruim generalizada para os fundos multimercados. Na avaliação de alguns gestores, a classificação geral de multimercados acaba também levando a comparações entre produtos muito diferentes. Segundo Eduardo Coutinho, sócio da Plenus, o fundo Plenus Hedge tem perfil extremamente agressivo e muito mais volátil que a maioria do mercado. "Ele pode cair 2% num mês e subir 5% em outro", diz. O sócio da Fidúcia, Marcelo Serfaty, também considera impossível comparar o Fidúcia Equity Hedge com os demais multimercados. "O fundo só pode atuar no mercado de ações", explica. Segundo ele, sua carteira Diamond seria sim um multimercado, que sofreu menos justamente por usar instrumentos de proteção em outros mercados. Os resgates foram mais notados no Diamond em função do "efeito-distribuidor", diz Serfaty. Ou seja, como o fundo é distribuído por vários terceiros, quando um faz o saque, os outros ajustam seus percentuais em função dos limites de participação em cada fundo. Outra que sofreu o o efeito do distribuidor foi a Gap Asset Management. O sócio Francisco Costa avalia, no entanto, que apesar da má fase, a Gap saiu-se bem porque apresentou perda relativa pequena. "O volume representa cerca de 30% do nosso patrimônio", diz. "Temos 1,3 mil clientes pessoas físicas que não resgataram."