Título: Finalmente, telefonia IP alça vôo
Autor: Talita Moreira, Ricardo Cesar e João Luiz Rosa
Fonte: Valor Econômico, 18/05/2005, Empresas &, p. B3

Quando um executivo do banco Itaú liga de São Paulo para os escritórios da organização em Nova York, Luxemburgo, Lisboa ou mesmo Tóquio, a pessoa do outro lado da linha não percebe nenhuma diferença, mas a voz está trafegando pela internet, como se fosse um e-mail. Está em ação a telefonia IP (protocolo de internet, em inglês) , um sistema do qual se fala há quase uma década, mas que desde então rendeu poucos resultados práticos. Agora, porém, esse cenário está mudando. E rapidamente. O principal atrativo da telefonia IP é o preço do serviço, mais baixo que o do modelo tradicional. Pelo sistema, a voz transita na rede como um pacote de dados, cujo custo é menor. O Itaú começou a usar a tecnologia em 2002 e desde então não parou de expandir sua utilização. "Estamos economizando R$ 1 milhão por ano e isso ainda é pouco perto do potencial", diz João Antonio Dantas Bezerra Leite, diretor de operação de computadores e telecomunicações da instituição. Como o Itaú, muitas outras empresas engrossam a lista de adeptos da telefonia IP. Uma pesquisa realizada pela consultoria Yankee Group com 200 grandes empresas mostra que a maioria já conhece a tecnologia. Entre as companhias com mais de 5 mil funcionários, 100% dos entrevistados já ouviram falar do sistema. Na faixa entre mil e 5 mil, o índice é de 93%, e nas empresas com 500 a mil contratados, de 77%. A taxa de adoção é mais modesta. Mesmo assim, 26% das corporações com mais de 5 mil funcionários já têm um sistema IP. Na faixa entre 500 e mil funcionários, o número é bem menor: 9%. A Aracruz Celulose, que usa a telefonia IP para interligar suas filiais, está economizando R$ 40 mil por mês com o sistema, uma redução de custo de 25%, diz Marcelo Mendonça, gerente de tecnologia da informação (TI) da companhia. Já a siderúrgica Belgo-Mineira planeja colocar em funcionamento este mês um projeto IP para integrar cinco unidades no país além dos escritórios em Belo Horizonte e São Paulo. O objetivo é reduzir em pelo menos 30% os gastos com as ligações, afirma Newton de Lima, gerente de TI da empresa. Companhias que têm muitos pontos a ligar estão entre as pioneiras do IP. No Sistema de Crédito Cooperativo (Sicredi), instituição financeira que reúne 127 cooperativas de crédito e mais de 800 mil associados em vários estados, o projeto nasceu quando a empresa decidiu construir um novo centro administrativo em Porto Alegre (RS), concluído em maio de 2004. O Sicredi atua com 950 unidades de atendimento - o equivalente a agências bancárias - e percebeu que, interligando todas com tecnologia IP, teria uma grande economia na comunicação entre elas e com a central. O centro administrativo já opera seus 600 ramais em rede IP. Há três meses, a instituição começou o projeto-piloto de implantação nas unidades de atendimento. O objetivo é implementar a telefonia IP em todas elas até o final do ano, diz Márcio Lermen, gerente de TI. A idéia é instalar um telefone IP em cada agência, que ficará ligado à central telefônica no centro administrativo de Porto Alegre. "A economia total ainda não foi calculada, mas sabemos que há unidades que gastam mais de R$ 5 mil em conta telefônica por mês", afirma Lermen. "O investimento vai se pagar em menos de quatro meses na maioria das unidades". Apesar do movimento crescente, a telefonia IP ainda tem muitos desafios a superar, como o desconhecimento entre as empresas de pequeno porte. Em uma pesquisa com 350 companhias pequenas (20 a 99 funcionários) e médias (100 a 499), o Yankee Group constatou que 84% das empresas do primeiro grupo não usam IP e 51% delas sequer ouviram falar do sistema. Nas de médio porte, 24% desconhecem completamente a tecnologia e 82% não a utilizam. Mesmo entre as grandes empresas, pouca gente pensa em adotar exclusivamente a telefonia IP. Em geral, os projetos são departamentais, diz Márcio Mattos, presidente da Avaya, fornecedora americana de infra-estrutura. "É o 'test drive' das companhias", compara ele. A mensagem, compartilhada pelo mercado, é clara: não há nenhuma revolução à vista. E isso por um motivo simples. As companhias não podem jogar fora toda a infra-estrutura de que já dispõem. O que se espera é uma mudança forte, porém gradual, à medida que a infra-estrutura envelhece e precisa ser renovada. "Voz sobre IP é uma evolução", diz Mendonça, da Aracruz. "Já usávamos o recurso de fazer ligações entre filiais por canais dedicados desde 1989. A tecnologia evoluiu de canais de voz analógicos, passou por voz e dados no mesmo canal e chegou à voz sobre IP". No Itaú, onde a tecnologia foi ganhando novas funções, a próxima fronteira é explorar a mobilidade. Trata-se de uma das principais vantagens do sistema, dizem os especialistas. A meta, este ano, é implantar ramais remotos. O projeto está em fase de teste. Na prática, o sistema transforma o notebook em uma extensão do telefone, o que pode render episódios curiosos. Na Avaya, recentemente um executivo discou o ramal de um subordinado e começou a conversar sobre um negócio. Depois de alguns minutos, pediu que o outro "desse um pulinho" à sua sala. O subordinado respondeu que isso era impossível e justificou: "Eu estou em Tóquio".