Título: Governo brasileiro recebe mal a nova legislação
Autor: Cláudia Schüffner
Fonte: Valor Econômico, 19/05/2005, Internacional, p. A7

O governo brasileiro reagiu mal à nova legislação promulgada anteontem na Bolívia, que prevê aumento de impostos para a produção de gás e petróleo feita por empresas estrangeiras. A porta-voz das críticas foi a ministra brasileira de Minas e Energia, Dilma Rousseff, que adotou um tom diplomático, mas duro, ao comentar a lei boliviana. Segundo a ministra, a Petrobras está fazendo uma avaliação "extremamente cuidadosa" das implicações das novas regras. Dilma, no entanto, repetiu várias vezes que o cenário não é favorável. "Seguramente a promulgação da lei vai produzir alterações nas estratégicas de investimentos da Petrobras, no sentido de que ela diminuirá a expansão", afirmou a ministra. Dilma mencionou três projetos que serão afetados: a ampliação do gasoduto Brasil-Bolívia (Gasbol), o pólo gás-químico na fronteira entre os dois países (em parceria com a Braskem) e a construção de um gasoduto que chegaria à Argentina e ao sul do Brasil, viabilizando a termelétrica de Uruguaiana (RS). "Não foram abandonados, mas estão todos sob revisão", advertiu. "A empresa vai reescalonar ou defasar projetos, fará um reestudo diante de um fato que muda qualitativamente [a sua atuação], ao ser tributada em 50%", completou. Dilma referia-se à taxação total incidente sobre a produção de gás na Bolívia, que aumentará de 18% para 50%, entre impostos e royalties. Somando-se outros custos da cadeia produtiva, a tributação chega a 70%. O Itamaraty não comentou a questão. Alegando ter chegado há pouco de uma viagem ao Caribe, o chanceler Celso Amorim disse que ainda não havia analisado a nova lei. Dilma afirmou que a Petrobras avaliará projeto por projeto, e não tem interesse em retirar-se "em definitivo" da Bolívia. Preferiu, ao final, transmitir diplomaticamente uma mensagem de cauteloso apoio: "Nós todos queremos que a Bolívia seja um país mais estável". De acordo com a ministra, a estatal participa de investimentos em gás superiores a US$ 2 bilhões - uma parte em parceria com empresas estrangeiras, como a Repsol. Para ela, a Argentina sofrerá mais que o Brasil com a Lei de Hidrocarbonetos porque consome e importa mais gás. Segundo dados citados por ela, o país vizinho consome 120 milhões de metros cúbicos por dia. No Brasil, o consumo alcança apenas um terço disso - cerca de 42 milhões de metros cúbicos por dia. "Nosso mercado de gás ainda está passando da infância para a adolescência", avaliou. Na Argentina, mais de 50% da matriz energética tem o gás como matéria-prima e 1,3 milhão de veículos o usam como combustível. Dilma afirmou que o governo "fará um grande esforço para internalizar a produção de gás". A Petrobras anunciou em fevereiro que deverá iniciar a exploração de gás na bacia de Santos a partir de 2008, dois anos antes do prazo previsto pelos técnicos. Existe a possibilidade de que a produção comece ainda em 2007.