Título: Porto Digital prepara nova fase de expansão
Autor: Ricardo Cesar e Paulo Emílio
Fonte: Valor Econômico, 23/05/2005, Empresas &, p. B4

Quem se depara com um grupo de pessoas conversando em alguma esquina na ensolarada zona portuária do bairro do Recife Antigo, em Pernambuco, dificilmente imaginaria que está presenciando uma reunião de empresários do setor de software. Mas a chance de o encontro à sombra de casarões históricos ser exatamente isso é bastante alta. Trata-se de um sintoma da efervescência do Porto Digital, projeto instalado na região em 2001 com a proposta de oferecer isenção tributária e facilidades de financiamento para atrair empresas de tecnologia. Deu tão certo que Recife Antigo converteu-se de um bairro decadente em um cenário que junta o passado e o futuro, abrigando empresas high-tech em construções e ruas que datam da segunda invasão holandesa, em 1630. As 83 companhias atualmente instaladas na área geram dois mil empregos - quase todos de nível superior - e colocam vis-à-vis investidores e jovens empreendedores esperançosos em criar a próxima Microsoft. Mas o Porto não é só sonho: lá também estão gigantes internacionais de software e empresas brasileiras de maior porte. Concentre tudo isso em 32 mil metros quadrados e fica fácil entender porque as "reuniões de esquina", como define Valério Veloso, novo diretor-presidente da organização, são uma prática freqüente. Com o entusiasmo que reflete o espírito inovador do Porto, Veloso despeja números que comprovam o sucesso da empreitada. De lá sai 85% da receita anual de R$ 480 milhões movimentado pelo setor de tecnologia da informação em Pernambuco. Desde a sua concepção, a iniciativa recebeu investimentos de R$ 45 milhões dos governos federal, estadual e municipal e de fontes privadas. Para 2005 foram assegurados mais R$ 10 milhões e há outros R$ 8 milhões em estudo. Com isso, Veloso acredita que estabeleceu bases sólidas para os próximos passos: ampliar as exportações, reforçar as vendas para São Paulo e Brasília e, finalmente, conquistar a auto-suficiência, o que deve ocorrer em 2007. "Já seria possível sobreviver sem financiamento, mas não teríamos musculatura para manter os novos investimentos", diz. "Em cerca de dois anos esperamos ter condições de custear o projeto e de investir com caixa próprio." Para o executivo, os resultados credenciam o Porto Digital como modelo para projetos de revitalização de áreas degradadas e constituição de pólos de tecnologia. Veloso afirma que é procurado por prefeitos e governadores interessados em conhecer detalhes da iniciativa. Se tudo correr conforme o planejado, o grande salto em 2005 virá das exportações, que atualmente respondem por 2% do faturamento das empresas do Porto. A meta é elevar esse número para 3,8%, chegando a um volume de vendas para o mercado externo de R$ 25 milhões até dezembro. Uma recente parceria com a Agência de Promoção de Exportações (Apex), que resultou em financiamento de R$ 3 milhões para ampliar os negócios nos EUA e União Européia, ajudará no processo. Outro empurrão vem da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) que, segundo Veloso, selecionou o Porto Digital como um dos agentes do programa juro zero, que oferecerá recursos em condições especiais. Com isso, o Porto terá R$ 20 milhões à disposição para avaliar e liberar financiamento a pequenos projetos até o final de 2006. O dinheiro começa a ser liberado em junho e a idéia é aprovar aproximadamente cem planos de negócios. Se a meta for atingida, Veloso afirma que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) se dispõe a entrar com uma contrapartida de mais R$ 30 milhões. Outra novidade é a tentativa de atrair empresas de biotecnologia. Também estão na mira as desenvolvedoras de software para comunicação móvel. Para garantir mão-de-obra qualificada para tudo isso - hoje a escassez de profissionais qualificados é o principal gargalo para sustentar o crescimento do Porto -, a organização está fechando uma parceria com uma universidade local para oferecer cursos de desenvolvimento de sistemas. O "ecossistema" do Porto abriga empresas de todos os tamanhos, mas o grande volume é mesmo de companhias menores, que encontram ali condições propícias para crescer. É o caso da Meantime e da Jynx Playware, que desenvolvem softwares e jogos para celulares. A visibilidade que essas companhias ganham é evidenciado por exemplos como a recente aquisição da pequena Icapture, que atua no gerenciamento de soluções para transações eletrônicas, pelo Unibanco. Muitas empresas do Porto crescem a taxas de dois dígitos. Exemplo disso é a Capital Login, especializada nas áreas de suporte e 'help desk', que registrou faturamento de R$ 3,2 milhões no ano passado, 27% a mais que em 2003. Ives Nogueira, diretor da empresa, diz que este ano o salto deve chegar a 35%. Já a Neurotech, que atua na área de avaliação de risco de crédito, fraudes cadastrais e sistemas de cobrança, espera ampliar o faturamento, que em 2004 foi de R$ 1 milhão, em 50% neste exercício. Com tantos exemplos de crescimento acelerado, Veloso afirma que o Porto é, além de um projeto para revitalizar uma área antes degradada, um bom negócio. "Geralmente as organizações que recebem recursos do governo destroem riqueza. Conosco ocorre o contrário", diz. Até o final do ano, a organização espera recuperar mais 8,5 mil metros quadrados e chegar a cem empresas associadas. Mesmo assim, Veloso afirma que há demanda reprimida de 12,5 mil metros quadrados que seriam ocupados imediatamente se fossem recuperados. A julgar pelo entusiasmo do executivo, as reuniões de esquina do Porto Digital se tornarão cada vez mais comuns.