Título: Produtores de ferro gusa já sentem retração do setor
Autor: Francisco Góes
Fonte: Valor Econômico, 23/05/2005, Empresas &, p. B8

Os produtores independentes de ferro-gusa, matéria-prima usada na produção de aço, estão passando por uma fase de retração depois de terem expandido a oferta do insumo em quase 50% desde 2002, no rastro do ciclo de alta dos preços da siderurgia. O cenário atual do gusa, marcado por queda nas cotações e pela parada de altos-fornos em Minas Gerais, onde se concentra 60% da produção no país, decorre do próprio ajuste na siderurgia mundial, que deverá crescer menos este ano em relação a 2004. A valorização do real frente ao dólar também está contribuindo para reduzir as margens de lucro dos produtores. Em Minas Gerais muitos deles redirecionaram volumes de exportação para o mercado interno, criando uma sobre-oferta não absorvida pelos clientes, sobretudo as usinas siderúrgicas semi-integradas, que produzem aço em fornos elétricos a partir de sucata e gusa. "A valorização do real está inviabilizando exportações", diz Bruno Melo Lima, presidente do Sindicato da Indústria do Ferro de Minas Gerais (Sindifer). Ele avaliou que a persistir a situação atual, de queda de demanda e câmbio apreciado, a produção de ferro-gusa poderá cair 20% nos próximos três meses no Estado. A previsão indica que a produção em Minas Gerais deve ser menor este ano do que foi em 2004, quando os produtores independentes produziram 6,4 milhões de toneladas, destinando 3,1 milhões de toneladas para o mercado interno e 3,2 milhões para a exportação. Outras cerca de quatro milhões de toneladas de ferro-gusa são produzidas por ano na região Norte do país. Segundo Lima, empresas do setor nas cidades mineiras de Sete Lagoas e Divinópolis reduziram a produção, colocando funcionários em férias coletivas. O grupo Itaminas, maior produtor de gusa da região com produção de 800 mil toneladas/ano em cinco unidades, parou quatro de seus sete altos-fornos dando licença remunerada aos empregados, mas já voltou a normalidade. O grupo destina 30% da produção para o mercado interno e 70% para a exportação. "O mercado externo está com negócios fracos porque os Estados Unidos, nosso principal consumidor, formou grandes estoques de gusa e sucata", analisou Rodrigo Damasio, presidente da Itaminas. Ele avaliou que a valorização do real provocou defasagens nas receitas em relação aos custos de produção. "As oscilações do mercado (em termos de oferta e demanda) são normais, o que não é normal é um dólar a R$ 2,40." André Câncio, presidente da Associação das Siderúrgicas de Carajás (Asica), que reúne 15 produtoras de ferro-gusa instaladas no Norte do país, salientou que as empresas estão fechando contratos de exportação em patamares menores de preço, além de tentarem diversificar as vendas para outros destinos, como a Europa. Câncio previu que as exportações de gusa da região Norte devem totalizar 3,6 milhões de toneladas em 2005. Ele acrescentou que a China, um tradicional importador, fez exportações de cerca de 1,2 milhão de toneladas nos últimos três meses, o que ajudou a derrubar os preços do insumo. No Brasil, o ferro-gusa para aciária caiu de R$ 680 para R$ 600 por tonelada nos últimos 60 dias. Os contratos para a exportação também tiveram queda. A Itaminas, por exemplo, fechou em janeiro uma venda a US$ 270 por tonelada FOB (posto Vitória) para embarque em junho-julho. Em outubro de 2004, a empresa vendia a US$ 310 por tonelada. Em relação ao mercado interno, o presidente da Itaminas salientou que não há previsão de demanda por parte das usinas semi-integradas em maio e junho. Empresas como Companhia Belgo-Mineira e Gerdau não estão fechando novas compras pois teriam grandes estoques do insumo. A Gerdau informou, por meio de sua assessoria, que houve um aumento da capacidade de produção própria de ferro-gusa, o que reduziu a necessidade de compra da matéria-prima de terceiros. Recentemente, o grupo colocou em operação o novo alto-forno da Gerdau Divinópolis, com capacidade de produzir de 200 mil toneladas de gusa por ano, num investimento de R$ 40 milhões. Com seus três altos-fornos, a usina poderá produzir até 440 mil toneladas de gusa/ano. A Belgo já havia indicado, ao comentar o desempenho da empresa até março, que "as elevadas taxas de juros (da economia) contribuíram para a retração na demanda interna por produtos para a construção civil no primeiro trimestre". É um sinal de que a empresa vem operando com estoques elevados. Dados do Instituto Brasileiro de Siderurgia (IBS), divulgados na última semana, mostraram que as vendas de produtos longos, usados pela construção civil, caíram 19% em abril em relação ao mesmo mês de 2004. No acumulado janeiro-abril, a redução foi menor, de 8,1%.