Título: Oferta maior derruba as cotações do complexo carnes
Autor: Alda do Amaral Rocha e Vanessa Jurgenfeld
Fonte: Valor Econômico, 24/05/2005, Agronegócios, p. B14
Pressionado por uma oferta crescente e por um consumo que resiste em deslanchar, o complexo carnes enfrenta forte queda de preços desde o início do ano. No Sul, as agroindústrias pagam R$ 2,00 aos criadores pelo quilo do suíno vivo, 20% a menos do que no começo de janeiro, segundo a Associação Catarinense dos Criadores de Suínos (ACCS). No caso do boi, o recuo foi de 11,3% no período, para R$ 55/arroba em São Paulo, apurou a Scot, e no frango vivo, de 13,3%, para 1,30/quilo, segundo a Jox Assessoria Agropecuária. O boi, que historicamente influencia a cotação de outras carnes, está arrastando consigo o suíno e o frango - segmentos em que a pressão já existe por conta da maior produção. "Desde dezembro, as ofertas de boi gordo começaram a crescer após a crise do frigorífico Margen. Depois, veio a seca que fez as ofertas de gado aumentarem", observa Nelson Batista Martin, do Instituto de Economia Agrícola (IEA). Mas a oferta não é o único fator de pressão. Analistas vêem uma concorrência entre bens duráveis e alimentos, o que estaria afetando a demanda. "É o efeito Casas Bahia", afirma José Carlos Godoy, da Associação Brasileira de Pintos de Corte - Apinco. Ele observa que a possibilidade de comprar um celular, por exemplo, em várias prestações, gera uma concorrência com bens não-duráveis, como alimentos. O crédito facilitado para aposentados também é considerado um "concorrente" para os não-duráveis. "O aposentado fica com dívidas de médio a longo prazo e deixa de comprar [bens não-duráveis] para pagar", afirma Godoy, que acredita em queda do poder de compra do consumidor. Além de oferta e demanda, o câmbio também pressiona. Alcides Torres, da Scot, lembra que o mercado de boi gordo usa o dólar como referência para o preço da arroba. Assim, se o dólar cai ante o real, o preço da arroba acompanha. Paulo Molinari, da Safras & Mercado, observa que o dólar acaba influenciando todas as commodities, mas destaca que a produção de suínos vive uma recuperação. O resultado é a queda de preços que agora se vê. Em Santa Catarina, já se especula que agroindústrias estariam tentando derrubar a cotação para perto de R$ 1,80. Mas a ACCS aposta em alta de preços em junho, com a chegada do inverno. Por enquanto, contudo, o cenário é apertado para suinocultores como o independente Gervásio Zanella, de Águas Frias (SC). Ele afirma que já entregou suíno, semana passada, para Sadia e Perdigão por R$ 1,80 o quilo. "Não tinha mais como segurar porque os animais estavam passando da idade d3 abate". Segundo ele, as indústrias justificam o preço mais baixo do suíno dizendo que outras carnes também caíram. Além disso, o clima vinha inibindo o consumo. O presidente da ACCS, Wolmir de Souza, acredita que a estiagem no Sul também provocou a desova de suínos. Dados da ACCS mostram que foram abatidos 571 mil suínos em março enquanto a média é de cerca de 520 mil cabeças. Martin avalia que a pressão sobre as carnes se deve mais à oferta que à queda do poder aquisitivo. "A renda não cresce na mesma velocidade que a oferta". Diante disso, diz, nem mesmo as exportações conseguem enxugar os excedentes. Por conta do excedente, os preços já recuam no atacado. O corte de traseiro bovino saiu de R$ 4,70 o quilo no início do ano em São Paulo para R$ 3,70 ontem, segundo a Scot. O frango resfriado no médio atacado paulista saiu de R$ 2,10 o quilo para R$ 1,80 no período informa a Jox.