Título: Juro alto e balança recorde derrubam dólar para R$ 2,427
Autor: Cristiane Perini Lucchesi
Fonte: Valor Econômico, 24/05/2005, Finanças, p. C1

Cotação é a menor desde 6 de maio de 2002; tendência é de continuidade na valorização do real

O saldo comercial da terceira semana de maio surpreendeu o mercado financeiro e contribuiu para derrubar o dólar para R$ 2,4270, seu menor valor desde 6 de maio de 2002. Os especialistas são unânimes em apontar que, se não houver uma atuação do Banco Central, a tendência é de a moeda americana romper a barreira dos R$ 2,40 no curto prazo. "A balança comercial teve uma recuperação forte e ficou US$ 200 milhões acima do que havíamos projetado na terceira semana de maio", disse Alexandre Lintz, estrategista-chefe do BNP Paribas. O saldo comercial apurado no período foi de US$ 943 milhões, maior do que os US$ 665 milhões da semana anterior. "Os produtos brasileiros continuam bem competitivos", continuou ele. "São quase US$ 500 milhões entrando no país por dia só por conta das exportações", comentou João Medeiros, sócio da Pioneer Corretora de Câmbio. "O dólar não tem fundo se as exportações continuarem desse jeito", completou ele. Como o dólar fraco ainda não impactou os superávits comerciais, os participantes do mercado de câmbio passaram a apostar com mais força que a valorização do real vai continuar e saíram vendendo dólares. "Foi um dia de forte liquidez no mercado de câmbio", comentou Rodrigo Trotta, gerente de tesouraria do Banif. A moeda americana teve desvalorização de 0,57% e registrou sua quarta queda consecutiva. O volume de negócios chegou a quase US$ 2 bilhões. No ano, a desvalorização do dólar é de 8,55% e no mês, de 4,03%. "Nossos clientes importadores até entraram comprando, mas em volume insuficiente para segurar a queda nas cotações", afirmou Medeiros. O juros altos tornam os investimentos em reais atrativos para os investidores internacionais, nacionais e também para os exportadores, que antecipam sua contratação de câmbio. Segundo os especialistas, parte da desvalorização do câmbio de ontem se deveu à elevação de mais 0,25 ponto percentual nos juros básicos Selic, para 19,75% ao ano, promovida pelo Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central na semana passada. "Com esses juros altos em reais, os bancos não têm razão para desfazer suas posições vendidas em dólar", disse Medeiros. Mas não foi só no Brasil que o dólar se desvalorizou ontem -a moeda americana perdeu valor no mundo todo, inclusive contra o euro e o iene. A maior tranqüilidade nos mercados internacionais contribuiu para a calmaria no mercado cambial brasileiro. O risco-Brasil continuou seu movimento de queda, as Bolsas americanas fecharam em alta -o Dow Jones, das ações mais negociadas em Nova York, subiu 0,49%- e os títulos do Tesouro dos Estados Unidos continuaram a registrar redução de juros no mercado secundário. A Bolsa de Valores de São Paulo não acompanhou o otimismo e caiu 1,25%, mas por causa do cenário político interno, segundo analistas. Os preços do petróleo subiram, mas não preocuparam os investidores ontem, depois da queda de quase US$ 10 o barril em sete dias no West Texas Intermediate de Nova York, de US$ 57 o barril para US$ 47,6. A queda foi considerada "surpreendente" pelo Departamento de Pesquisas Econômicas do Bradesco. Relatório da consultoria GRC Visão nota que as importações estão crescendo em um ritmo mais rápido do que as exportações no país. Enquanto a média das exportações está em US$ 456,7 milhões (neste mês, até a terceira semana), na comparação com US$ 378,1 milhões em maio de 2004, alta de 20,8%, a média das importações está em US$ 301,0 milhões em relação a US$ 230,0 milhões no ano passado, incremento de 30,9%, comenta a empresa de consultoria. Mas, continua a GRC Visão, "apesar da recente valorização do real frente ao dólar, e da constatação da perda de fôlego das exportações, acreditamos que o desempenho da balança comercial deste mês será superior ao observado no mesmo mês do ano passado (US$ 3,112 bilhões) e deverá ficar em torno de US$ 3,250 bilhões." Grande parte dos analistas já chega a apostar em superávit comercial de US$ 35 bilhões neste ano. "O superávit em transações correntes, que todos esperavam que caísse, está em nada menos do que 2,2% do PIB", completou Lintz.