Título: Planos tradicionais na berlinda
Autor: Flavia Lima
Fonte: Valor Econômico, 24/05/2005, EU &, p. D1

Antigas carteiras de previdência privada aberta, que representam mais de R$ 26 bilhões em reservas, podem ficar de fora da nova tributação do setor

Entre os investidores de planos de previdência mais antigos - conhecidos como planos tradicionais -, ainda restam dúvidas se será possível optar pelo novo regime de tributação. A questão é importante para um grupo que representa nada menos do que 41% do total de R$ 64,1 bilhões em reservas reunidas pelo setor (ou R$ 26,2 bilhões), segundo dados de março da Associação Nacional da Previdência Privada (Anapp). Desde janeiro, o participante de todo plano de contribuição definida ou variável - onde não há uma garantia de quanto vai ser o benefício futuro - pode escolher entre os dois sistemas de tributação: o progressivo (de acordo com a tabela atual de Imposto de Renda) e o regressivo (com alíquotas que vão de 35% para aplicações de até dois anos, a 10% para aquelas acima de dez anos). Todos os investidores desse tipo de fundo, portanto, podem optar pela nova tributação, explica Andrea Nogueira, advogada especialista em previdência do escritório Velloza, Girotto e Lindenbojm. Porém, se o plano foi desenhado na modalidade de benefício definido (BD) - onde há garantia do valor do benefício no final -, a regra não permite a troca de tributação. Para isso, o aplicador teria de mudar de plano. Até a primeira metade da década de 90, os planos de aposentadoria existentes no mercado eram todos de benefício definido - as reservas de cada plano eram compartilhadas entre os investidores e geravam uma renda pré-determinada, garantida pela seguradora. Esses planos deixaram de ser vendidos e muitos deles estão entrando agora na fase de pagar as aposentadorias. Em 94, uma mudança permitiu a criação de planos de contribuição definida ou variável, nos quais os benefícios dependem exclusivamente do que foi acumulado nas contas de cada investidor. Esses planos, também chamados de tradicionais, deixaram de ser vendidos com o surgimento dos PGBLs, em 1998. Sua principal característica é o fato de serem corrigidos por um fator de remuneração, geralmente o IGP-M mais uma taxa prefixada. São esses planos de contribuição definida que compõem a maior parte das reservas dos planos tradicionais e, portanto, podem optar pelo regime decrescente de tributação, diz Osvaldo do Nascimento, presidente da Anapp e principal executivo da Itaú Vida, Previdência e Capitalização. "São planos de contribuição definida com garantia de performance, que não podem ser confundidos com planos BD." Nos planos de benefício definido, foi justamente a falta de uma conta individual para cada aplicador na composição das reservas que impediu que eles fossem incluídos na regra que trata da nova tributação, explica Patrícia Linhares, especialista em previdência do Mattos Filho e Advogados. "Como não dá para identificar o que é de cada investidor, é impossível fazer a contagem individualizada do prazo de aplicação, como exige o regime decrescente de tributação." Segundo Patrícia, o investidor que não sabe que tipo de plano é o seu deve entrar em contato com a seguradora. Se for de benefício definido, a empresa não pode oferecer a opção pelo regime regressivo. "Está na regulamentação", diz, em referência à Lei 11.053, de 29 de dezembro de 2004. A saída seria a migração de um plano antigo de tipo benefício definido para um PGBL ou VGBL de contribuição definida. Segundo Patrícia, não existe nada na legislação da Superintendência de Seguros Privados (Susep) impedindo a migração, mas alerta que, na prática, algumas restrições podem ser aplicadas. Toda a reserva constituída antes da migração não seria incluída no regime decrescente de tributação, o que tornaria a mudança pouco atrativa para quem está prestes a se aposentar. No Itaú, diz Nascimento, existe um plano tradicional de benefício definido que prevê em contrato a possibilidade de migração para um de contribuição definida. Segundo ele, há o caso também de empresas que pensam em alterar seus planos de benefício definido em função da nova tributação. Na Icatu Hartford, 70% dos fundos são de tipo PGBL e VGBL. Os outros 30% são planos antigos - da família 'Invida Aposentadoria' - todos de tipo benefício definido, diz Lourdes Guedes, diretora da área de "compliance". Dessa forma, o investidor que quiser optar pela tabela regressiva terá de migrar para um PGBL. Segundo Lourdes, a migração para um VGBL não é possível porque os planos antigos prevêem o desconto de até 12% das contribuições na declaração anual de ajuste, como nos PGBLs. Lourdes afirma que, na migração, o investidor levaria os recursos que acumulou para o novo plano, diferente do que afirma a advogada, que entende que os recursos acumulados no plano BD não seriam transferidos. Na movimentação, adverte Lourdes, o prazo de contagem para definição da alíquota não incluiria o tempo de acumulação do plano anterior, e o investidor perderia também as garantias que tinha no plano antigo. "Ele abdicaria da possibilidade de se aposentar com um benefício definido, mas em compensação abriria espaço para investir em um plano mais flexível." Ela lembra que os investidores que deixam de fazer três contribuições em um plano BD perdem o direito, o que não ocorre nos planos de contribuição. Mas independente do tipo de plano escolhido, as dúvidas com relação à escolha da nova tributação continuam. Na Icatu Hartford, apenas 4% da carteira de previdência migrou para a nova tabela. No Itaú, o percentual de migração entre os investidores que já tinham um plano é ínfimo. Nas vendas novas, porém, 25% dos aplicadores optam pela tabela regressiva. Segundo Nascimento, o banco busca reverter o quadro com o contato direto, por telefone, com todo o aplicador com mais de R$ 10 mil em reservas. A expectativa, diz ele, é que isso possa ser feito com mais calma a partir da aprovação - esperada para esta semana - de emenda que estende em seis meses o prazo para a opção pelo novo regime. Por enquanto, o investidor tem até 1º de julho para decidir.