Título: Derrotados nas disputas municipais trarão problemas ao governo federal
Autor: César Felício
Fonte: Valor Econômico, 19/10/2004, Política, p. A-6

As semanas seguintes às eleições municipais poderão ser marcadas por uma série de crises internas que correm o risco de paralisar o governo federal. No centro do problema, estão a reeleição da prefeita de São Paulo, Marta Suplicy e a emenda constitucional que permite a reeleição das mesas diretoras da Câmara e do Senado. Ambas, no cenário de hoje, são possibilidades remotas. Um dos obstáculos para a retomada de iniciativa política do governo será a redefinição do espaço do PT paulista dentro do governo federal, caso Marta Suplicy não se reeleja para a prefeitura de São Paulo e o presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT), não possa se reeleger. É grande a pressão para que ambos assumam ministérios. O grande aliado de Cunha neste projeto, mais uma vez, é o ministro da Casa Civil, José Dirceu. Ele teria avalizado a presença dele num ministério. De acordo com parlamentares, se o projeto for levado adiante, o cargo do ministro da Coordenação Política Aldo Rebelo estaria comprometido. Qualquer troca de cadeiras no ministério é imprevisível, pois as mudanças dependem unicamente da concordância do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Segundo a avaliação de Lula, Aldo Rebelo executa com competência suas funções. Marta Suplicy, mesmo se derrotada nesta eleição, permanece, segundo avaliação do meio político, como sendo um nome forte também ao governo de São Paulo, ao lado do líder do governo no Senado e candidato já declarado em 2006, Aloizio Mercadante. Tanto um como outro aparecem como aspirantes a um dos ministérios da área social , especialmente Desenvolvimento Social, Saúde e Cidades, ocupados respectivamente pelo mineiro Patrus Ananias, o pernambucano Humberto Costa e o gaúcho Olívio Dutra, todos petistas e apoiados por críticos do predomínio de políticos paulistas no partido e no governo, como o prefeito de Belo Horizonte, Fernando Pimentel. Esta poderá não ser a única guerra interna do PT . Se a emenda da reeleição for rejeitada, o partido terá que se preocupar também com a sucessão na Câmara. Pelo menos três parlamentares são citados: Paulo Bernardo (PR), Paulo Rocha (PA) e Arlindo Chinaglia (SP). Bernardo é ligado ao ministro da Fazenda, Antonio Palocci , o que pode desagradar a cúpula política do Palácio do Planalto. Rocha tem destaque nas articulações de bastidores do Congresso e é da confiança de Dirceu. Chinaglia é um parlamentar que se coloca como independente dentro do PT, apesar de boas relações com todas as correntes partidárias. No Senado, o enterro da reeleição aumenta as chances de Renan Calheiros (PMDB-AL) se eleger presidente. Na semana passada, após um almoço com o ministro José Dirceu, o presidente da Casa, José Sarney, disse que a reeleição das mesas era tema superado. Sarney descartou inclusive a votação da PEC durante uma eventual convocação extraordinária. Pemedebistas acreditam que o futuro político de Sarney pode ser o retorno ao Maranhão, para pacificar seu clã, que está em pé de guerra depois que o governador José Reinaldo Tavares rompeu com a filha do patriarca, a senadora Roseana Sarney (PFL-MA). Uma possibilidade seria o ex-presidente da República se candidatar ao governo do Estado, conseguindo a unanimidade dos correligionários. O resultado das urnas também deve fazer desaparecer do cenário do governo a vinda para o grupo situacionista de lideranças expressivas hoje filiadas em partidos de oposição, como o senador Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA). Segundo a avaliação de um assessor direto do presidente, ACM considera que o crescimento súbito de Nelson Pellegrino, o candidato do PT derrotado no primeiro turno em Salvador, fragilizou o pefelista César Borges para disputar o segundo turno. E a decisão de Pellegrino de apoiar João Henrique (PDT), sem que o governo federal tenha tentado impedir, torna a vitória do pedetista praticamente garantida. Com isto, ACM começou a dar sinais claros de distanciamento do governo federal e pode buscar uma reaproximação com a direção pefelista, que se fortalece na oposição caso Serra vença a eleição paulistana. Outra frente de divisões é o debate sobre o vice de Lula na reeleição em 2006. "Não vamos tocar nisso em 2005", disse um ministro ao Valor. A avaliação da equipe política do governo é que o tema é explosivo. A vaga de Alencar (PL) é cobiçada pelo PMDB e pelo PTB e decidir agora pode inviabilizar qualquer votação no Congresso, dizem os governistas. Além de tornar extremamente incerta a participação do PMDB na coligação de Lula em 2006, de acordo com um assessor direto do presidente.