Título: Crédito alternativo ganha espaço
Autor: Janes Rocha
Fonte: Valor Econômico, 19/10/2004, Finanças, p. C-1

O crédito para empresas está crescendo, tanto dentro como fora dos bancos. Porém, instrumentos alternativos de financiamento do capital de giro fora dos bancos ganham mais velocidade à medida que as empresas - principalmente as pequenas e médias - esbarram em dificuldades de acesso ao crédito tradicional. O chamado fomento mercantil, mais conhecido como factoring, um dos mais usados pelas pequenas e médias empresas, deve fechar o ano com um movimento de R$ 40 bilhões, em comparação a R$ 37 bilhões em 2003, segundo a Associação Nacional das Sociedades de Fomento Mercantil (Anfac). A securitização de recebíveis via fundos de investimentos (FIDC) - um instrumento relativamente novo, regulamentado em 2001 - ajudou empresas pequenas e médias (e algumas grandes) a levantar perto de R$ 5,5 bilhões do início de 2003 até agora, segundo dados que serão divulgados hoje pela agência de classificação de risco de crédito Moody's. O FIDC não é só uma captação de recursos mas representa também uma porta para o mercado de capitais, diz Brigitte Posch, analista sênior da Moody's. Em outra frente, a antecipação de receitas com desconto dos recebíveis de cartões de crédito já representa 25% do volume de transações com cartões MasterCard que este ano vão atingir R$ 54 bilhões - ou seja cerca de R$ 13,5 bilhões. A informação é da Redecard, empresa que captura e liquida as transações com cartões MasterCard junto à rede de estabelecimentos comerciais. O presidente da Redecard, Rubén Osta, afirma que o dinheiro para a antecipação de recebíveis vem do próprio caixa da Redecard, não dos bancos que a controlam. Outra administradora de cartões, a American Express (Amex) utiliza seu próprio caixa para descontar recebíveis dos cartões antecipadamente, junto aos lojistas. A operação faz parte do pacote de soluções corporativas da Amex, que no primeiro semestre elevou em 34% o volume financeiro de suas operações com empresas. "Esse mercado é fortemente concentrado em grandes empresas, mas está avançando cada vez mais em pequenas e médias empresas e cada vez mais fora do eixo Rio-São Paulo", diz Francisco Rocha Campos, vice-presidente da área de cartões corporativos da Amex. Só com esses exemplos, de operações que passam fora dos bancos, já são quase R$ 60 bilhões em operações conhecidas e divulgadas, o que significa perto de 39% do volume de crédito a pessoas jurídicas com recursos livres dos bancos, tomando por base as contas oficiais do Banco Central (veja tabela acima). A comparação só leva em conta os empréstimos com recursos livres (não direcionados) porque é onde todas as empresas podem concorrer. Não leva em conta, portanto, o crédito do BNDES, que vem de recursos direcionados de acordo com a política de desenvolvimento do governo e apresenta restrições de acesso, especialmente por pequenos. O economista Carlos Eduardo Carvalho, professor do Departamento de Economia e do Programa de Pós Graduação em Economia Política da Pontifícia Universidade Católica (PUC/SP), pondera que, embora antigas, as operações de desconto e securitização de títulos fora dos bancos explicam como a economia brasileira cresce sem apoio do sistema financeiro. Mas trata-se de um crescimento limitado, diz Carvalho, porque é baseado em duplicatas e faturas de vendas já realizadas. Não há recursos novos, não tem capital de risco para alavancar investimentos. Além disso, o custo não é baixo. "As factoring tomam dinheiro nos bancos porque não podem captar dinheiro do público", lembra o economista. E o custo de capital para as administradoras de cartões é o mesmo que para qualquer outra empresa no país. Portanto, instrumentos alternativos de crédito não substituem a necessidade de ampliação do crédito dos bancos, afirma Carvalho. Segundo os dados do BC, a soma dos empréstimos com recursos livres, direcionados, para pessoas físicas e jurídicas, considerando todas as linhas em vigor, não chega a 27% do Produto Interno Bruto (PIB). Mas o volume de crédito efetivo no Brasil é completamente subdimensionado, diz Rubén Osta, porque não leva em conta o financiamento das empresas via cheques pré-datados e pagamento de fornecedores a prazo. "Ninguém sabe o volume de crédito em cheque pré-datado que circula no país", diz Osta. Em um trabalho recente - intitulado "Sistema Financeiro e as Micro e Pequenas Empresas: Diagnóstico e Perspectivas" -, coordenado pelo economista Carlos Eduardo Carvalho, o Sebrae detectou que 66% das pequenas e médias empresas se financiam com pagamento a prazo a fornecedores e 45% usam cheque pré-datado. Pelo menos 80% delas não tomam empréstimo bancário, constatou o Sebrae.