Título: Instável como uma nuvem
Autor: Tahan, Lilian; Mader, Helena
Fonte: Correio Braziliense, 04/04/2010, Cidades, p. 25

eleições 2010

Crise política muda a cada dia o cenário para a escolha do governador em outubro. Partidos estão na fase de construção das alianças

¿Política é como nuvem. Você olha, ela está de um jeito. Olha de novo, ela já mudou¿

A festejada comparação de Tancredo Neves entre política e nuvens se aplica como nunca ao caso do Distrito Federal. Desde o início do escândalo político em novembro, tornou-se impossível prever com precisão como será a sucessão de poder na capital da República. Os cenários políticos se desmancham a cada novo desdobramento da crise. A despeito das incertezas sobre as próximas repercussões da Caixa de Pandora, o calendário eleitoral impõe a partidos e candidatos definições para as eleições de outubro. Uma fotografia do quadro atual revelará as duas forças que hoje se colocam para a disputa. Uma delas capitaneada pelo ex-governador Joaquim Roriz (PSC) e a outra representada pelo PT. É cedo, no entanto, para apostar numa polarização entre os dois grupos. A consolidação desse quadro depende ainda do grau de associação entre Roriz e os escândalos de corrupção que derrubaram José Roberto Arruda e Paulo Octávio. A instabilidade, no entanto, não é problema só de Roriz. Escolhido como candidato do PT ao Palácio do Buriti, Agnelo Queiroz tornou-se alvo de desgaste nas últimas semanas. Primeiro vieram as críticas porque ele teve acesso antecipado aos vídeos de Durval Barbosa, depois as acusações de patrimônio incompatível com a renda e mais recentemente o início da Operação Shaolin, que investiga irregularidades em convênios com ONGs, na época em que Agnelo era ministro do Esporte. A depender da repercussão dos ataques, lideranças do partido já pensam na hipótese de substituir Agnelo por Arlete Sampaio, que se desencompatibilizou na semana passada do cargo de secretária executiva do Ministério do Desenvolvimento Social para concorrer em outubro. Cada brecha aberta pelo PT aumenta o cacife do PDT, que pode inclusive liderar os partidos de esquerda em torno do nome do senador Cristovam Buarque. Ele é ainda muito lembrado pelos brasilienses como um ícone de oposição a Roriz e tem sido incentivado por seus eleitores a entrar na briga pelo mandato de governador. Começou a se movimentar ensaiando aliança com PRB, PSB, PV, PPS, PcdoB e até o PMDB, enxergado nas composições como partido curinga (leia quadro ao lado). Por enquanto, Cristovam afirma que uma de suas metas é se juntar ao PT para o embate de outubro. ¿Estamos conversando para fazer uma chapa que reúna todos os partidos interessados em uma grande mudança. Queremos que o PT participe dessa aliança e, nesse caso, é natural que indique o cabeça de chapa porque é o maior partido do grupo¿, reconhece Cristovam. E faz a ressalva: ¿Mas o PT teria que ceder as três outras vagas (de vice-governador e as duas para senador) e, assim, me sentiria à vontade para concorrer à reeleição¿.

Duelo

Enquanto Roriz e PT preveem duelo em outubro, o DEM, despedaçado com as consequências da Caixa de Pandora, tenta se levantar do tombo e reconquistar espaço na arena política antes do início da campanha. Na semana passada, o novo diretório regional foi formado e está agora sob o comando do senador Adelmir Santana. ¿Apesar das recentes e das baixas no partido, o Democratas ainda tem um patrimônio eleitoral representativo e vamos lutar pelo nosso espaço¿, diz Adelmir. Ex-secretário de Transportes no governo Arruda, o deputado federal Alberto Fraga concorre com a distrital Eliana Pedrosa à indicação para disputar o Buriti em outubro. Entre os partidos que ascenderam com a queda do DEM está o PR, fortalecido com a condução de Wilson Lima ao Governo do DF. Mas a legenda ainda avalia como usará a influência granjeada no contexto da crise. Uma das lideranças do PR, o deputado federal Jofran Frejat adiantou apoio a Roriz, podendo inclusive tornar-se vice na chapa do ex-governador. Mas esse não é um movimento do partido, que vai aguardar o desfecho das eleições indiretas, marcadas para o próximo dia 17. Pelo menos nessa etapa da sucessão, Wilson Lima é candidatíssimo. Quem também pisou no freio para ver no que vai dar é o senador Gim Argello (PTB). Tem evitado falar abertamente sobre sua eventual participação no debate político para as eleições de outubro. Antes da crise, no entanto, dava como certa sua candidatura ao governo. Ele ganhou força nos últimos dois anos depois que se aproximou da ex-ministra da Casa Civil Dilma Rousseff. Mas seu direcionamento no DF ainda é uma incógnita. ¿Converso com todo mundo, da ponta direita à ponta esquerda, mas ainda não é o momento de discutir as eleições de outubro, estou analisando o quadro¿, despista Gim, que assumiu o Senado na vaga aberta pela renúncia de Joaquim Roriz, em 2007.

Deputada na UTI

A deputada Érika Kokay, que sofreu um infarto na manhã da última sexta-feira, continua internada no Hospital Santa Lúcia e seu quadro de saúde é estável. Ela está na UTI e não tem previsão de alta. A distrital sentiu forte dores no peito quando seguia para compromissos políticos, em Sobradinho. Um motorista levou a distrital ao Hospital Prontonorte, onde Kokay passou por um cateterismo. Lá, os médicos identificaram o infarto na artéria coronária direita. Na tarde de sexta, a deputada foi transferida para o Hospital Santa Lúcia, na Asa Sul, local em que fez uma angioplastia ¿ procedimento para desobstruir a artéria.

Castigo aos políticos

A palavra Judas é sinônimo de traição. E todo sábado de aleluia é hora de castigar aquele que teria sido o delator do esconderijo de Jesus Cristo aos soldados romanos em troca de moedas. Neste ano, o alvo foi o suposto esquema de corrupção no Distrito Federal, deflagrado pela Operação Caixa de Pandora, da Polícia Federal. Ontem, em Taguatinga Sul, CSB 7, os moradores escolheram políticos como Joaquim Roriz, Maria Abadia, Gim Argello e o ex-governador José Roberto Arruda para representar Judas. O boneco ¿ vestido de terno e com cabeça de tampa de privada ¿ tinha a foto de todos eles e estava amarrado em um poste. Em Planaltina, na Praça Zé Ramalho, cerca de 30 crianças se divertiram enquanto batiam no boneco que também representava a figura de um político. Uma queima de fogos de artifício deu início à brincadeira que existe desde 1965 na Vila Planalto, onde as crianças jogaram o Judas em uma caixa, a de Pandora (foto). (Leilane Menezes e Thais Paranhos)

A situação dos partidos

Confira como as legendas estão se preparando para a eleição de outubro:

PSDB Enfraquecido com a crise que dispersou algumas lideranças recentes do partido, o foco do PSDB será o apoio à candidatura de José Serra à Presidência da República. A missão tucana no DF será confiada a Maria de Lourdes Abadia, que como esteve afastada do cenário político nos últimos três anos, conseguiu se descolar dos atuais escândalos de corrupção. Como a prioridade será abrir um palanque para Serra, Abadia só não se coligará ao PT. Mas pode se aproximar de dois grupos, o do DEM ou até mesmo o de Roriz. Os assédios já começaram. Roriz ofereceu a vaga ao Senado para a antiga aliada. Ela não descarta a possibilidade.

PR Ganhou visibilidade com a condução de Wilson Lima ao governo, mas ainda não há um consenso entre as lideranças do PR sobre em que direção vai aplicar a incipiente influência. Um dos expoentes da legenda no DF, o deputado federal Jofran Frejat já anunciou que aceita ser o vice na chapa de Roriz. Mas terá antes de se acertar com o partido, que aguardará o desfecho das eleições indiretas antes de se posicionar sobre o pleito de outubro.

PSC Virou abrigo para o grupo de Roriz que pretende disputar as eleições em outubro. Foi a solução do ex-governador após o rompimento com o PMDB, que até o início da crise planejava uma dobradinha com o ex-governador Arruda em outubro. Quase sem representatividade, o PSC vai criar dificuldades do ponto de vista prático para Roriz, que terá menos tempo de televisão e será forçado a compor com um leque expressivo de legendas para viabilizar sua chapa.

PMDB É uma legenda curinga para outubro. Apesar de no momento do escândalo estar colado ao governo Arruda, o partido tem tamanho e lideranças que serão cortejados independentemente de sua história recente. Do PT ao PSC, passando pelo PSDB e o DEM, todos fazem planos de puxar o PMDB. Seguindo os princípios da lei da oferta e da procura, o deputado federal Tadeu Filippelli espera o melhor momento para negociar o passe do partido, que pode valer, vaga ao Senado Federal ou até a vice-governadoria. As conversas com o grupo de esquerda estão bem encaminhadas.

PDT Pode roubar a cena nas eleições de outubro. Vai depender de que papel o senador Cristovam Buarque vai desempenhar. Pode ser candidato ao governo, o que significa vencer resistências dentro da executiva nacional da legenda, que seguirá as orientações do presidente Lula. Mas não descarta abraçar o PT para uma grande aliança com os partidos de esquerda. Uma prévia dessa composição inclui PRB, PSB, PV, PPS, PCdoB e até o PMDB. Com a cabeça de chapa, o grupo exigiria do PT a indicação das três outras vagas, a de vice-governador e os dois nomes que concorrerão ao Senado.

PT Tentará chegar até outubro como o contraponto dos escândalos de corrupção que enfraqueceram as legendas favoritas na disputa até o início da crise da Caixa de Pandora, em novembro do ano passado. Agnelo Queiroz é a escolha do partido para o Buriti, referendada pelas prévias, para ser o principal contraponto a Roriz. Ataques recentes ao candidato já mobilizam dirigentes petistas a pensar num plano B, que já têm nome e sobrenome: Arlete Sampaio. Na semana passada, ela se desencompatibilizou do cargo de secretária executiva do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome.

DEM Esfacelado com as revelações de Pandora, que derrubaram governador, vice e presidente da Câmara Legislativa ¿ todos filiados ao Democratas ¿, o partido ainda tenta se reerguer. Alguns de seus representantes no DF não abrem mão de participar da disputa ao Buriri em outubro e negociam com o diretório nacional suas candidaturas. O deputado federal Alberto Fraga e a distrital Eliana Pedrosa querem entrar na briga para representar o partido em cargo majoritário nas eleições.