Título: Câmara aprova projeto que permite quebra de patente de droga anti-aids
Autor: Henrique Gomes Batista e André Vieira
Fonte: Valor Econômico, 02/06/2005, Brasil, p. A2

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara aprovou ontem o projeto de lei, de autoria o deputado Roberto Gouveia (PT-SP), que altera a lei de patentes, permitindo sua quebra nos casos de medicamentos utilizados no tratamento da aids. Gouveia calcula que a proposta deve permitir uma economia imediata de R$ 200 milhões ao sistema de saúde público. A indústria critica a proposta e avalia que as consequências a longo prazo são piores. O projeto de lei teve apoio de técnicos do Ministério da Saúde e de diversas ONGs que pressionaram os parlamentares. Como tem caráter terminativo na CCJ, o projeto segue direto ao Senado. Para entrar em vigor, exige-se a sanção presidencial. "O Legislativo deu um grande exemplo, liberando da Lei de Patentes os anti-retrovirais", afirmou o diretor do Programa Nacional de DST/Aids do Ministério de Saúde, Pedro Chequer. "Com a economia que a produção dos remédios vai gerar, vamos ter dinheiro sobrando para investir em pesquisa" Desde a gestão de José Serra no Ministério da Saúde, o governo federal ameaça a quebra de patentes como forma de obter descontos nas compras dos laboratórios farmacêuticos. Alguns acreditam que a intenção dos técnicos da Saúde é continuar com essa política uma vez que o governo teria pouca condição para fabricar os remédios. O deputado petista entende de outra forma. "Esse mecanismo de negociação está esgotado, pois sempre há novas drogas entrando no coquetel e até mesmo o Organização Mundial do Comércio (OMC) decidiu, em sua reunião de Doha, que os atuais mecanismos do Tratado Internacional sobre Direitos da Propriedade Intelectual (Trips) para o licenciamento de patentes de remédios anti-aids não são totalmente eficientes", disse Gouveia. Atualmente, o Brasil produz oito dos 16 medicamentos do coquetel para a aids. Dados do Ministério da Saúde dão conta que três laboratórios - Merck, Abbott e Gilead - que fornecem drogas ao governo são responsáveis por 67% dos gastos do orçamento da pasta com aids. O orçamento da Saúde aumentou de R$ 650 milhões em 2004 para R$ 900 milhões neste ano, embora o tratamento não atinja toda a população infectada. Há 155 mil pacientes recebendo tratamento gratuito dos cerca de 600 mil infectados. A indústria avalia que a aprovação final do projeto poderá trazer danos à imagem do país. "É uma sinalização forte e negativa do Congresso", disse o diretor de comunicação da Merck Sharp & Dohme, João Sanches. "Se o Brasil decidir por esse caminho, ao quebrar um contrato, os investimentos em inovação vão recuar." Por meio de sua assessoria de imprensa, a Abbott disse que é cedo para fazer uma avaliação da proposta aprovada ontem, mas disse que "a proteção de propriedade intelectual, como patentes, é importante para o futuro de novas pesquisas, de doenças de todas as áreas. No final, quem pode perder é o próprio paciente." Em nota, a Federação Brasileira da Indústria Farmacêutica (Febrafarma) disse que o projeto é desnecessário porque a Lei de Patentes já prevê a licença compulsória em casos excepcionais.