Título: Só o juro alto não explica dólar barato
Autor: Alex Ribeiro
Fonte: Valor Econômico, 03/06/2005, Finanças, p. C

Tese em Cheque Balanço de pagamentos mostra que maior parte do fluxo é de investimento de longo prazo

Os dados do balanço de pagamentos não sustentam a tese, defendida anteontem por empresários do setor siderúrgico, de que a valorização recente da taxa de câmbio se explica pelo ingresso de capitais de curto prazo, que teriam sido atraídos pelos altos juros vigentes no país. Por essa linha de argumentação, o país irá assistir em breve a uma fuga de capitais, tão logo o Banco Central acene com um relaxamento na sua política monetária. Sem negar a influência dos juros na atração de capitais estrangeiros, o que as estatísticas oficiais mostram, entretanto, é que a maior parte do fluxo ingressou no país no primeiro quadrimestre é de longo prazo, principalmente investimentos diretos. E que a abundância de dólares no mercado de câmbio se deve, preponderantemente, ao persistente saldo em conta corrente, sustentado pelas exportações. No primeiro quadrimestre, a principal fonte de dólares que abasteceu o mercado de câmbio - ajudando a puxar as cotações para baixo - foi o superávit nas contas correntes do setor privado, que somou US$ 5,4 bilhões. Da conta financeira e de capitais, tiveram origem US$ 5 bilhões (sempre no primeiro quadrimestre). O grosso desses capitais está longe de ser de curto prazo. O maior fluxo é de investimentos diretos, com US$ 6,5 bilhões. O número é mais que o dobro dos US$ 3,1 bilhões observados no mesmo período de 2004. Bem atrás, o fluxo de capitais que se mostrou mais intenso é o de investimentos em carteira, com US$ 2,3 bilhões. Sob essa rubrica são incluídos tanto a compra de papéis de renda variável, como ações a American Depositary Receipts (ADRs), como a de títulos de renda fixa. Em renda variável, entraram US$ 2,1 bilhões. Esse é um tipo de aplicação que, embora de prazo mais curto que o investimento direto, não se explica pelas altas taxas de juros. Pelo contrário: juros elevados deveriam desestimular investimentos em ações, pois reduzem a rentabilidade das empresas. Obviamente, o fluxo de dólares não ficou imune aos juros altos. Mas, para surpresa, os números são bem menores do que episódios na história recente em que houve oportunidades de arbitragens internacionais. Os investimentos em carteira de renda fixa somaram apenas US$ 227 milhões. E os bancos, que são sempre atentos a oportunidades de ganhos como com o diferencial de juros interno e externo, têm sido comedidos em suas captações. Os títulos de curto prazo colocados no exterior por instituições financeiras somaram US$ 309 milhões, e os de longo prazo - US$ 1,112 bilhão - foram suficientes para rolar apenas 88% dos vencimentos. As empresas estão pagando dívidas. Pode estar havendo ingresso significativo de capitais de curto prazo pelas linhas interbancárias. As estatísticas do BC informam pouco sobre esse movimento. Os dados dos empréstimos interbancários podem apenas ser depreendidos a partir da variação dos ativos brasileiros no exterior, que registraram uma queda de US$ 1,5 bilhão. Embora preponderantemente de curto prazo, nesse tipo de operação o país está pouco exposto a eventuais fugas de capitais. As linhas interbancárias são sacadas basicamente para serem usadas como "funding" para operações de ACCs e ACEs, que estão lastreadas por contratos de exportações.