Título: Governo usa Exército para iniciar transposição
Autor: Daniel Rittner
Fonte: Valor Econômico, 06/06/2005, Brasil, p. A3

Infra-estrutura Batalhão de Engenharia começará em julho a construir dois canais no Rio São Francisco

O governo pretende usar o Exército para iniciar as obras de transposição do Rio São Francisco, projeto de infra-estrutura no valor de R$ 4,5 bilhões com o qual o presidente Lula quer marcar sua administração. A estratégia definida para dar início às obras é recorrer a um convênio permanente do Ministério da Integração Nacional, responsável pelo projeto, com o Exército para colocar em ação o Batalhão de Engenharia da força militar e começar a construção do empreendimento no fim de julho, assim que sair a licença do Ibama. A utilização do convênio com o Exército para obras públicas, mesmo em projeto de grande porte como a transposição do São Francisco, dispensa procedimentos burocráticos. Com isso, as máquinas poderão iniciar os trabalhos antes mesmo de encerrado o processo de licitação para a escolha das construtoras que se encarregarão do serviço principal. Esse processo começou em maio, com a publicação dos editais de licitação, logo após o licenciamento prévio do Ibama - que atesta a viabilidade ambiental da transposição do rio. O Batalhão de Engenharia do Exército, que funciona como uma pequena empreiteira, fará dois "canais de aproximação" nos pontos de captação das águas. O primeiro, no eixo leste do projeto, terá 5,5 quilômetros de extensão, a partir das margens do São Francisco no município de Floresta (PE). O segundo percorrerá 2,5 quilômetros a partir de Cabrobó (PE). Eles são necessários para "chupar" a água do rio, no volume definido pela Agência Nacional de Águas (ANA), e transportá-la para duas barragens, de onde serão bombeadas para toda a rede de canais. As duas barragens, tecnicamente chamadas de reservatórios de passagem, também serão construídas pelo Exército. O custo total é estimado em R$ 85 milhões, e as obras têm duração prevista de um ano e dois meses. Segundo o coordenador-geral do projeto da transposição, Pedro Brito, a utilização do convênio com os militares não prejudicará a qualidade das obras, porque o Exército possui experiência na construção de empreendimentos como estradas e açudes para o governo. Ele lembra que o Instituto Militar de Engenharia é considerado centro de excelência. "É uma forma de assegurarmos o início das obras em julho", afirma Brito, que prefere adotar o termo "projeto de integração das bacias hidrográficas do Nordeste" para designar a transposição. A execução do cronograma planejado depende, entretanto, de três autorizações: uma certificação de sustentabilidade hídrica e a outorga definitiva das águas pela ANA , além da licença do Ibama. O órgão ambiental concedeu o licenciamento prévio na última semana de abril, mas impôs 31 "condicionantes" - entre elas, a necessidade de construir túneis para a passagem de animais sob os canais, a inclusão de programas de desenvolvimento das comunidades indígenas impactadas pelo projeto e a instalação de sirenes para avisar à população sobre mudanças abruptas na vazão de água pelos canais, como forma de prevenir acidentes. Brito informa que o Ministério da Integração atenderá às exigências da ANA até o fim de junho e concluirá até o dia 12 de julho as adaptações pedidas pelo Ibama. A expectativa é obter autorização para o início das obras duas ou três semanas depois, com a colocação das máquinas do Exército em campo de trabalho. A apresentação de propostas de empreiteiras - individuais ou reunidas em consórcios - deverá ocorrer até 14 de julho. O governo divulgará os vencedores em 15 de agosto. No final do mês, as construtoras poderão estar trabalhando. Até a semana passada, o ministério havia vendido 89 editais de licitação. "Isso é sinal de forte interesse por parte do setor privado", avalia Brito. Para aumentar a concorrência, o empreendimento foi dividido em 14 lotes de gerenciamento e fiscalização, no valor de R$ 60 milhões, e outros 14 lotes de obras e equipamentos, que totalizam R$ 3,5 bilhões. A perspectiva de negócios agita as empreiteiras. O presidente do Sindicato da Indústria de Construção Pesada (Sinicon), Luiz Fernando Santos Reis, afirma que as construtoras de obras públicas vivem um período de desaquecimento, e a transposição chega em boa hora para o setor, que tem se voltado recentemente para projetos privados. "O cronograma de de obras na área de transportes está todo atrasado e as concessões de rodovias federais não deverão sair antes de outubro", observa Santos Reis. "As empreiteiras estão com elevado grau de ociosidade em sua capacidade produtiva. É por isso que estamos extremamente interessados e ansiosos", diz o executivo, confirmando o ânimo das companhias com o projeto. Na avaliação dele, a divisão da obra em 14 lotes permitirá que mais de 40 empresas se envolvam no empreendimento.