Título: CMN estuda desamarrar conta-salário
Autor: Alex Ribeiro
Fonte: Valor Econômico, 06/06/2005, Finanças, p. C8

Livre Escolha Trabalhador pode elevar concorrência se decidir em qual banco quer receber

O governo estuda permitir, por meio de resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN), que os trabalhadores escolham o banco em que querem receber seus salários. A medida teria o propósito de estimular uma maior concorrência entre instituições financeiras e de cortar custos desnecessários impostos pelo sistema atual. A idéia de dar a liberdade ao trabalhador para escolher o banco de sua preferência não é nova - já é objeto de dois projetos de lei, um apresentado na Câmara e outro no Senado. Mas o governo decidiu pedir estudos jurídicos mais aprofundados para checar se não é possível implementar a medida de forma mais rápida, por resolução do CMN. A princípio, essa é uma atribuição do órgão, estabelecida pela Lei 4.595, que regulamenta o sistema financeiro. Para o governo, a decisão sobre o tema depende apenas de aspectos legais. A divisão criada no BC para estudar aspectos concorrenciais do sistema financeiro - que, entre outras medidas, ajudou a formatar a portabilidade dos dados cadastrais e a conta investimento - examinou o assunto e concluiu que a iniciativa traria benefícios sem fragilizar os bancos. A exemplo do que aconteceu com a conta-investimento, os técnicos não esperam que a medida vá provocar grandes migrações de clientes de um banco para outro. A aposta é que a simples faculdade de os clientes trocarem de banco vai induzir as instituições a oferecerem maiores vantagens para os insatisfeitos. Isso já vem sendo observado entre os clientes que, no ambiente das contas-investimento, ameaçam transferir suas economias de uma instituição para outra - e são convencidos a ficar por solícitos gerentes de bancos, que apresentam propostas vantajosas, como a redução das taxas de administração. No segmento de cartões de crédito, onde a concorrência é bastante acirrada, esse tipo de situação é quase corriqueira. Quem telefona para os serviços de atendimento aos clientes das administradoras tentando cancelar cartões de crédito acaba sendo convencido do contrário com propostas de descontos e até de isenção de anuidades. Evidência de que não haverá migrações maciças de clientes de um banco para outro é que, onde a mudança já é possível, não houve grandes alterações. Os funcionários do BC, que recebem salários pelo Banco do Brasil, têm a faculdade de apontar outros bancos para receber seus salários - mas raros a usam. Outra preocupação do governo é reduzir custos criados pelo sistema atual, que são transferidos para os clientes. Neste ano, por exemplo, o governo de Pernambuco realizou uma licitação para definir onde iria manter a conta única e o pagamento de salários de funcionários. Numa disputa acirrada com outros bancos, o Bandepe, controlado pelo ABN AMRO, pagou R$ 240,2 milhões para manter o direito de, entre outros, fazer o pagamento do funcionalismo por cinco anos. O governo do Ceará exigiu, recentemente, o pagamento de cerca de R$ 100 milhões para manter suas contas no Banco do Estado do Ceará (BEC), que será privatizado. Há casos em que órgãos públicos exigiram dos bancos a renovação de suas frotas de veículos. Entre as empresas do setor privado, a negociação de vantagens para a manutenção das folhas de pagamento também se tornou uma das principais formas de - como é dito no jargão do sistema - aquisição de clientes. A reciprocidade ocorre por meio de tarifas menores e juros mais vantajosos para a empresa. Na visão do governo, é exatamente isso o que ocorre: os trabalhadores são "adquiridos" pelos bancos que, para recuperar o investimento, cobram tarifas e taxas de juros mais altas. O sistema, da forma como está, não agrada nem mesmo os bancos. Instituições financeiras privadas já comunicaram ao governo que apóiam a mudança - e vêem a proposta como uma oportunidade para avançar em segmentos bastante rentáveis que hoje são dominados pelos bancos públicos federais, como o pagamento de salários do funcionalismo da União.