Título: No centro da disputa, os inocentes
Autor: Rizzo, Alana
Fonte: Correio Braziliense, 02/04/2010, Brasil, p. 7

Caso de Sean Goldman inspira fundação nos Estados Unidos. Entidade tenta repatriar crianças que não voltaram após serem levadas para fora do país por algum parente.

A crise diplomática entre Brasil e Estados Unidos desencadeada com a disputa pela guarda do menino Sean Goldman está longe do fim e abriu precedentes para batalhas que podem afetar até mesmo as exportações brasileiras. Se depender da Fundação Bring Sean Home (traga Sean para casa), o caso do garoto com dupla nacionalidade que retornou para os Estados Unidos em dezembro com o pai biológico (veja memória) foi só o primeiro. A instituição criou uma rede internacional na tentativa de solucionar casos como o de Sean. Pelo menos sete crianças que estão no Brasil vêm sendo monitoradas pela fundação. Segundo a fundação, o epísodio envolvendo Sean serviu de aprendizado, e a entidade diz que o trabalho não acabou com o retorno do menino aos Estados Unidos. ¿É só o começo de uma luta por outras 2,8 mil crianças americanas e canadenses que foram sequestradas contra sua vontade e levadas para países estrangeiros¿, afirma a fundação. Entre as ferramentas adotadas pelo grupo, estão a mobilização social, inclusive por meio de doações, e a pressão sobre as autoridades. ¿Nunca imaginamos que poderíamos alcançar o presidente do Brasil e dos Estados Unidos¿, diz o texto de apresentação do site. A fundação pede mudanças na legislação e a aprovação de uma proposta no Congresso restringindo o acesso brasileiro ao Sistema Geral de Preferências (SGP). Esse modelo é usado para exportar cerca de 10% dos produtos que o país vende aos Estados Unidos anualmente. Em 2008, o Brasil teria recebido mais de US$ 2,75 bilhões por meio do SGP. A restrição seria adotada enquanto o Brasil não cumprisse as obrigações(1) previstas na Convenção de Haia. Na justificativa do projeto, são utilizados dados da Autoridade Central da Presidência da República segundo os quais pelo menos 64 crianças que moravam nos Estados Unidos foram trazidas para o Brasil. No site da fundação há o convite para ¿participar da rede e ajudar a conseguir que uma nova legislação passe no Congresso, dando ao governo norte-americano mais ferramentas para forçar a repatriação de crianças americanas¿. Segundo a entidade, Sean seria a primeira criança a voltar do Brasil. No Japão, diz a fundação, nenhum menor de idade teria retornado aos Estados Unidos nos últimos 50 anos. O país oriental, como o Brasil, está na mira da associação. Advogado de David Goldman, Ricardo Zamariola afirma que o site, assim como a fundação, não foi criado pelo pai de Sean, apesar das citações de seu nome. ¿São amigos da família.¿ Com relação às críticas ao Brasil, Zamariola afirma que a maioria das opiniões publicadas no site é desqualificada. Atualmente, o advogado é responsável por 10 processos envolvendo a guarda internacional de crianças. Inclusive no caso de Sean, cujo processo ainda não terminou. A família brasileira entrou com dois recursos nos tribunais superiores na tentativa de reverter a decisão.

Outros casos

David Goldman virou herói para os estrangeiros em situação semelhante. Um holandês, pai de um menino de 6 anos, aguarda o julgamento do caso em Manaus e ficou mais esperançoso. O garoto veio para o Brasil com a mãe passar férias e não voltou. O pai alega que não consegue visitar o filho e pede que a criança volte para casa. O caso de três irmãos que viviam na França e agora estão em Fortaleza também é acompanhado pela rede internacional. Segundo o pai das crianças, desde 2006 a Autoridade Central francesa negocia com o governo brasileiro, que afirma não ter localizado as crianças.

1 - Cooperação Em 1995, o Brasil se tornou signatário da Convenção de Haia, um tratado de cooperação internacional criado em 1993 que define, entre outras ações, medidas para a proteção de crianças, como a prevenção do sequestro, da venda ou do tráfico de menores de idade. Os estados que firmaram o documento reconhecem que, ¿para o desenvolvimento harmonioso de sua personalidade, a criança deve crescer em meio familiar, em clima de felicidade, de amor e de compreensão. Recordando que cada país deveria tomar medidas adequadas para permitir a manutenção da criança em sua família de origem¿.