Título: Crise política chega aos mercados
Autor: Luiz Sérgio Guimarães e Janes Rocha
Fonte: Valor Econômico, 07/06/2005, Finanças, p. C1

Denúncias Bovespa fecha com queda de 3,07%, dólar sobe 0,94% e risco-país avança 3,37%

A crise política chegou ao mercado financeiro. As denúncias anteriores à revelação do deputado Roberto Jefferson - Correios, IRB, Receita Federal, Ibama, Banco Central - foram ignoradas quase por completo pelos mercados. O suposto esquema político do "mensalão", por tentar envolver o presidente Lula e o ministro da Fazenda Antonio Palocci, teve imediata e aguda reação no mercado. Os investidores desmancharam posições otimistas, temendo os desdobramentos das denúncias, e o comportamento dos pregões azedou. A Bovespa fechou em queda de 3,07%, a maior baixa desde 28 de abril. O dólar comercial avançou 0,94%, cotado a R$ 2,45. O risco-país subiu 3,37%, para 430 pontos-base. Mesmo assim, não houve pânico. "Os mercados mantiveram o sangue-frio", diz o economista-chefe do Banco Pátria, Luis Fernando Lopes. Os investidores vinham ignorando os vários escândalos noticiados nas últimas semanas e concentrando as análises no ambiente externo e nos fundamentos da economia brasileira. Ambos emitiam sinais otimistas. E as posições carregadas pelos bancos, investidores locais e estrangeiros refletiam esses viés positivo. A surpresa com a reportagem da "Folha de S. Paulo" foi grande. E, no susto, as posições - "compradas" em bolsa, em juros prefixados longos e em títulos da dívida externa brasileira; e "vendidas" em dólar - foram revistas. Os investidores não sabem a dimensão que as denúncias de Jefferson podem tomar. Mas, em princípio, destacam-se os cenários mais extremos, como mudanças de política econômica ou impeachment de Lula. Para os analistas, não adianta mudar a política econômica para desviar o foco das atenções. O caso é típico de incompetência política. E é nessa esfera que a crise tem de ser resolvida. O economista-chefe do ABM Amro Real, Mário Mesquita, acredita que a crise não será longa, mas pode provocar períodos de volatilidade mais intensa nos mercados. O risco maior é de paralisia das votações no Congresso. Para o analista, é baixa a probabilidade de mudanças na política econômica. As conseqüências podem ser de mais longo prazo, sobretudo em relação às eleições de 2006. Conforme explicou um analista que não quis se identificar, os investidores não acreditam, no momento, em um impeachment do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e sua sucessão pelo vice, José de Alencar. Isso seria contrário os interesses da oposição "mais sólida" como PSDB e PMDB, pela coincidência de "bandeiras" políticas. O que se dizia ontem era que a continuidade da política econômica poderia estar ameaçada para as próximas eleições. "O mercado teme que essas denúncias fortaleçam a posição de um candidato populista (à presidência em 2006) como o (Anthony) Garotinho (secretário de governo do Rio e presidente regional do PMDB)", afirmou esse analista. Newton Rosa, economista-chefe da Sul América Investimentos, disse que os investidores com quem ele conversou ontem estavam "perplexos" e "desanimados". "É um filme que nós já vimos antes e, pior, você não sabe a amplitude que pode ter", avaliava o economista, explicando a reação dos investidores. "Tudo isso" lembra, "em um ambiente no qual a economia se desacelera" - referindo-se à divulgação, semana passada, de um crescimento de apenas 0,3% do PIB no primeiro trimestre. Alex Agostini, economista da consultoria GRC Visão, relatou que muitos investidores estrangeiros resolveram abandonar parte de suas posições em ativos brasileiros. "Ninguém quer pagar pra ver" (o resultado da crise política), disse Agostini. Porém tanto Rosa quanto Agostini não viam motivo para pânico. "Não há motivo algum para desespero", disse Newton Rosa, lembrando que os fundamentos da economia não se alteraram. "Na nossa avaliação, muita coisa ainda pode acontecer, mas não dá para fazer uma previsão apenas a partir das denúncias apresentadas", completou Agostini. Para o economista da GRC Visão, a imagem do governo ficou arranhada e uma consequência prática das denúncias poderá ser a demissão de algum membro importante do governo. "A situação ainda é de fumaça e de fogo controlado. Até o desfecho dessa história vai haver muita volatilidade no mercado", aposta Agostini.