Título: De maneira caótica, manifestantes ocupam e bloqueiam empresas
Autor: Cláudia Schüffner
Fonte: Valor Econômico, 09/06/2005, Internacional, p. A11

Manifestantes indígenas estão ocupando instalações de empresas de petróleo e gás na Bolívia. Ao menos sete campos foram invadidos nos últimos dias. A discrepância entre as ações indica que não há coordenação entre elas. Antes da renúncia do presidente Carlos Mesa, o principal líder da oposição, Evo Morales, já havia proposto a ocupação "por decreto" da indústria de gás e petróleo. Com o vácuo de poder, aparentemente os manifestantes resolveram tomar para essa tarefa. As invasões derrubaram ontem as ações da Repsol. Segundo Ramiro Vásquez, um dos organizadores dos protestos em Cochabamba, a ocupação da estação de bombeamento de gás e petróleo da cidade de Tapacarí levou à paralisação da atividade. O oleoduto de Tapacarí vai para La Paz e, a partir de Sica Sica, abastece também o Chile. Nesse caso, o discurso dos sindicalistas indica que a ocupação se dá para atingir o abastecimento do Chile, país contra o qual a população boliviana nutre enorme ressentimento por causa da perda territorial num conflito no final do século XIX, que deixou a Bolívia sem saída para o mar. Já em Patujusal, no norte do Departamento de Santa Cruz, um poço, gasodutos e oleodutos da empresa Transredes, controlada pela Enron- também foram ocupados. As ocupações em Santa Cruz se dão num ambiente de confrontação entre indígenas e estudantes, de um lado, e grupos que pregam a autonomia regional, de outro. Esses grupos, como a União Jovem Cruzenha, são acusados pelos movimentos indígenas e sindicais de serem braços armados dos autonomistas de Santa Cruz. Por isso, os manifestantes dizem que ocuparam as instalações para se "vingar" das violências cometidas contra indígenas nos últimos protestos. Na região próxima ao Brasil, três campos da Repsol-YPF foram ocupados, impedindo a produção diária de 3 mil barris de petróleo. Três campos da British Petroleum também estão sob o controle dos sindicatos camponeses em Santa Cruz desde a última sexta. A companhia está deixando de produzir até 1.700 mil barris diários. Com a paralisação de parte das atividades da BP e da Repsol, cerca de 10% da produção diária de petróleo do país fica comprometida. Quanto ao gás, a produção continua estável, mas teme-se que a companhia Andina, controlada pela Repsol-YPF e que detém 25% das jazidas de gás da Bolívia, seja alvo de tentativas de ocupação. As ações da espanhola Repsol na Bolsa de Madri caíram ontem 1%. O índice de empresas de energia feito pela Bloomberg coloca a Repsol como a pior performance nos últimos cinco dias, com uma queda de 2,3%. Manifestantes do leste apóiam os protestos em La Paz já há quase um mês. Ontem, a Federação de Associações de Moradores de El Alto negou autorização para que caminhões-tanque com gasolina abasteçam a capital, onde os transportes públicos estão paralisados. Os sindicalistas dizem que há uma campanha difamatória chamada de "Plano Santa Cruz". O plano seria, segundo eles, uma maneira de incutir o medo na população por meio da "manipulação das informações", para promover conflitos entre "raças e cidades, semeando o caos, a violência e o pânico". Essa conspiração, dizem os manifestantes pró-reestatização do setor energéticos, estaria sendo urdida por empresários de Santa Cruz.